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Eu pensei que poderia ter tudo quando tive você em meus braços pela primeira vez.
Cansado de um mundo onde tudo muda tão rápido e ainda assim permanece o mesmo andei pela noite mais uma vez até te encontrar pela primeira vez. As vezes eu me pergunto se deveria ser assim ou se eu merecia esse final de alguma forma, pagando com minha própria felicidade pelos pecados que cometi, descobrindo o que é o paraíso apenas para ser barrado na porta.
Criar coragem para me apresentar foi fácil, deixar meu número foi mais fácil ainda porque eu não achei que você iria ligar.
Mas você ligou.
Uma das coisas sobre se transformar em um vampiro é que certas coisas perdem o que deveriam ser, tudo vira mais do mesmo, por isso me surpreendi em sentir aquele calor na barriga e, hoje eu sei, se meu coração batesse ele provavelmente estaria tentando pular para fora do meu peito quando saí do Dumort para a pequena livraria no centro da cidade que vende o “melhor café da cidade, sério, você precisa tentar isso”.
Cheguei 15 minutos adiantado e, de alguma forma, você já estava lá, sentado em um canto com uma caneca na mão e uma pilha de livros que eu nunca tinha ouvido falar sobre.
Nos sentamos e então você começou a falar.
E falou. Mais de uma vez naquela noite me perguntei como você poderia falar tanto sem parar para respirar e não desmaiar bem ali na minha frente, mais de uma vez me perguntei porque eu decidi aparecer, prometendo que seria apenas essa vez, que seria apenas porque eu precisava de uma desculpa para não comparecer a uma das muitas festas do Magnus e se eu mentisse ele saberia.
Por isso eu menti para mim mesmo.
Uma vez virou duas, três. As festas do Magnus se tornaram reuniões do conselho ou simplesmente fugir de Camille e, de alguma forma, me vi aparecendo naquela livraria pelo menos uma vez por semana, precisando sentir um pouco menos do peso dos meus ombros e sabendo que ali, sentado naquela livraria ou andando pelo Central Park ou simplesmente sentando num balanço antigo e te vendo encher a cara de sorvete eu poderia ser mais eu.
Não o segundo no comando do Clã de Nova York, não um vampiro de quase 100 anos, não um assassino. Te ouvindo divagar sobre Star Wars e todas as coisas que você aprontou com sua amiga eu poderia fechar os olhos e fingir que tinha 15 anos mais uma vez, poderia ver um futuro juntos, festas da escola e reuniões com os amigos, banhos de piscina e caminhadas na praia, uma pequena casa e algumas crianças para nos dar trabalho.
Estando com você eu poderia me apegar as nossas pequenas diferenças como você preferir perfumes doces e HQs e eu ter uma estante repletas de clássicos, você gostar de laranja e minha cor favorita ser cinza ou mesmo eu ser o mais velho da família e você ter sido o mais novo. Focar em todas essas pequenas coisas que, muitas vezes, me fizeram rir tiravam minha mente das diferenças grandes demais para se ignorar.
Eu acreditei que poderia ter tudo quando sentava ao seu lado e te ouvia falar Simon, mas essa noite me provou que eu estava errado.
Queria me desculpar por ter mentido, por você ter que descobrir minha real natureza dessa forma e não ter coragem de falar todas essas coisas na sua cara.
Mesmo porque depois da forma como você fugiu eu não espero que você queria me ver novamente.
Desculpa te expor assim Simon, foi errado e impulsivo (algo que eu não sou com frequência) e não vai acontecer novamente.
Ps: Acho que Ragnor estava certo em dizer que apenas tolos se apaixonam por mundanos acreditando que seria para sempre, mas o que poderia eu fazer se me tornei um tolo por você?!
                                                                           Ass: Raphael Santiago
- Eu ainda não credito que você vai me fazer colocar isso na caixa de correio dele e não falar pessoalmente.- Lilly está sentada na cadeira em frente a minha, segurando a carta em suas mãos.
- Eu ainda não acredito que te deixei ler isso.
- Você sabe que eu teria lido de qualquer forma.
Suspiro. Porque ela é minha amiga mesmo? Ah sim, ela não é, mas é o mais perto de uma que eu poderia encontrar no clã e eu não colocaria outro vampiro perto de Simon que não fosse ela.
- Você vai fazer isso por mim ou não?- Ela coloca as páginas no envelope e rapidamente fecha com o selo oficial do clã, então se levanta e vai embora sem dizer outra palavra, o que eu agradeço, pois não estou afim de papo no momento.
Me levanto de onde estou e me retiro da sala a caminho do meu quarto, conseguindo chegar na metade do corredor antes de ser interrompido.
- Santiago, precisamos discutir aquele assunto relacionado aos Lobisomens.- Rhy está parado na minha frente e leva tudo de mim pra não mandar ele se foder, sério, porque ser líder dessa porra dá tanto trabalho?
-Alguém morreu?
- Não, mas...
- Então pode ser discutido amanhã, porque eu estou indo dormir.- Não espero que ele entenda, mas sei que ele está aqui por tempo o suficiente para não questionar minha forma de falar ou o fato de que estou me retirando mais cedo do que normalmente faria.
2 semanas depois...
Todos apenas começaram a acordar, por isso o movimento no Hotel ainda é fraco enquanto bebo minha caneca de sangue quente antes de mais um dia de muita burocracia.
Pelo menos Camille se mandou, mais uma vez, penso comigo mesmo quando Lilly inrompe pela porta ainda com sua própria versão de pijama que consiste em não muito além de uma camiseta e calcinha como se tivessem colocado fogo em sua cama, apesar de que seu sorriso me sugere que, seja lá o que ela pretende me dizer, eu não vou gostar.
- Tem visita esperando no saguão.
- E eu tenho cara de porteiro? Dê o recado a quem está sendo esperado.- Falo colocando a xícara em cima do balcão da cozinha.
- É exatamente o que vim fazer.- ela diz caminhando até o balcão, onde ela senta com uma graça que é própria da nossa raça, cruzando suas pernas de um jeito tão dela e que faria a maioria dos humanos de joelhos aos seus pés, mas apenas me faz querer, fortemente, revirar os olhos.
- Sério, o que diabos o Magnus aprontou dessa vez?- Me pergunto caminhando para o Saguão e esperando ver o bruxo de traços asiáticos usando alguma roupa brilhante e maquiagem sentado confortavelmente como se fosse dono do lugar, mas em seu lugar encontro um muito desconfortável e muito humano Simon em pé, olhando ao redor como se tentasse absorver tudo ao mesmo tempo mas seu cérebro simplesmente não conseguisse processar.
Talvez por causa do batimento cardíaco tão incomum no Hotel, quase todos do clã encontram-se espalhados pelo local, observando com atenção o louco mundano que decidiu se aventurar em um lugar cheio de vampiros.
- Simon?- Ele se vira até que seus olhos se encontrem com os meus, seu rosto perde o olhar perdido e seu mais novo foco está totalmente concentrado em uma pessoa.
Eu.
- Raphael Santiago, você é um tolo. – Ele caminha até mim, chegando perto demais e resisto a tentação de dar um passo para trás, fugir do humano tão intimidador quanto alguém pode ser vestindo uma calça jeans folgada e uma blusa do Star Wars.
- Não vou questionar isso porque estou muito ocupado questionando a sua própria burrice Simon, o que diabos você estava pensando quando resolveu entrar em um hotel cheio de vampiros? Porq...- Minha tentativa de monologo repreendedor é interrompido por seus lábios nos meus, o que para mim parece uma ótima forma de ser interrompido, inclusive.
- Você decidiu deixou a porra de uma carta me dizendo o que você sentia, achei que teria direito a uma réplica.- Sua respiração está levemente ofegante e sei que estaria assim também se precisasse respirar.
- Eu quero tudo.- Sua testa está encostada na minha, suas palavras não passam de um sussurro.
- o que?- Não culpe meu cérebro de não estar processando as coisas direito.
- Todas as coisas que você escreveu... eu quero tudo e muito mais.
De longe consigo ouvir os gritos e assovios do resto do clã, mas não dou muita atenção, não quando todos os meus sentidos estão focados no fato de que tenho Simon em meus braços e seus lábios nos meus.
Eu estava certo desde o início, seus lábios tem gosto de caramelo.
 

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⏰ Última atualização: Apr 30, 2019 ⏰

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