Aprendi com as caçadoras a ter cautela.
A lagartixa estava lá todas as noites, na mesma janela fria, na mesma caçada eterna. Suas pequenas e numerosas presas estavam sempre ali, esperando a hora de suas mortes surpreendentes.
Mas hoje era diferente.
As pequenas mariposas encontraram uma majestosa parceira na escuridão. Ela era incrível, grandiosa, inevitável. A lagartixa perdeu o fôlego ao avistar tamanha grandeza.
Seus olhos seguiam o voo da criatura quando ela tomou a decisão.
Hesitante, aproximou-se para descobrir com o que estava lidando. Observou com firmeza. E preparou-se para a caçada que mudaria sua vida.
Quando a nova presa fixou-se em seu terreno, a lagartixa tomou posição. Sua respiração estava ofegante, embora contida. Qualquer erro e seu alvo bateria as asas para longe, ciente do perigo que se aproximava.
Os braços do réptil moviam-se lentamente, como se tivesse toda a noite ao seu dispor. Suas pernas acompanhavam, cuidadosas, os movimentos detalhados.
A cada passo vagaroso, as ações tornavam-se mais cautelosas. Qualquer erro, naquele momento, representaria uma tragédia. O futuro estava em jogo.
E a lagartixa, enfim, avançou. O peso do tempo tomava conta de cada passo, mas ela estava agora próxima o suficiente para realizar seu objetivo. Chegara o momento que diferenciaria o sucesso da vergonha. Era a hora de dar o bote.
Seu corpo todo ficou em êxtase. Os músculos se contraíram. Cada célula de sua frágil existência se aprontava para o combate.
Da cautela para a posição de ataque, cada segundo passava como uma vida diante dos olhos da lagartixa.
Era agora ou nunca.
Então ela atacou.
Em um piscar de olhos, a mariposa estava no ar, tremendo, batendo suas asas tortuosas.
Mas havia alguma coisa errada com ela.
Foi quando percebi que a lagartixa não tinha falhado.
Em sua boca, um pedaço da caça se mostrava. A mariposa estava ferida, e a sua caçadora sentira o sabor da vitória nos lábios. Tudo estava caminhando para o fim.
Desesperada e incapaz de fugir, a mariposa bateu à janela, pedindo socorro. Era tarde demais. O que antes era cautela tornara-se prontidão, e a lagartixa já estava à sua cola.
Só foi preciso mais um bote.
Logo, a lagartixa carregava sua presa inteira na boca, semimorta, debatendo-se.
Ela conseguira.
Com a caçada completa, o réptil vitorioso deixou a janela e sumiu na escuridão.
Foi tão bonito que me perdi em minhas próprias lágrimas. E assim fiquei, até que a noite me acalentasse.
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A lagartixa e a mariposa
Short StoryUm conto breve sobre o que acontece às noites em uma janela fria.