A Perseguição

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   Não importava o que fizesse, não importava o que dissesse. Um grito não passaria de um sussurro. Paula não iria embora. Tratava-se da ex-namorada mais obcecada que a humanidade já tivera registro.

   Quando Breno saia de casa, podia ver a mulher no fim da rua, contemplando-o com olhos profundos e amarelos. Sua carne era pálida e, mesmo de longe, fazia com que um calafrio percorresse a sua espinha.

   À noite, na volta para casa, ela estava no mesmo lugar. Não tentava se esconder. Buscava sempre estar à vista de Breno. Mesmo quando ele não a via, era capaz de senti-la.

   Por diversas vezes a questionou sobre a razão daquele ato pueril, mas ela sempre se metia a correr e desaparecia. Tais investidas eram realizadas apenas enquanto houvesse a luz do sol, já que sob o luar, Paula assumia um aspecto cadavérico. Os olhos chegavam a aderir um brilho opaco.

   Breno nunca tivera amigos. Talvez alguns colegas passageiros, mas seus amigos ficaram presos em sua infância, e por isso não podia compartilhar qualquer coisa. Seus cabelos começavam a cair e estava sempre com dor de cabeça.

   O seu médico sempre recomendava os mesmos remédios e a mesma indicação de psiquiatra. Ambos não passavam de momentâneos alívios. O que lhe restava era tentar dormir com a sensação de que Paula estava próxima à porta, observando-o com seus olhos amarelos.

   Durante a madrugada ele acordava suando, e às vezes gritando, atormentado por pesadelos com a própria. Pesadelos causadores de sua insônia. Chorava, chorava, e se masturbava imaginando a filha do vizinho.

   Ele acreditava em Deus e gostava de pensar que tudo não passava de uma provação divina. Isso lhe dava energias para continuar.

   Porém, não conseguia entender o porquê de um homem como ele ser motivo da perseguição de uma garota. Um homem magro, baixo, de barba por fazer. Era difícil imaginá-lo com uma namorada. Mas acontecera.

   Uma manhã chuvosa. O sol não estava por perto, pois as nuvens o jogara para longe. Breno caminhava sob as pesadas gostas de água que desabavam do céu. Ele precisava chegar a integração de metrô do Recife e para isso precisara sair da Rua da Aurora, por meio da Ponte de Ferro e em seguida entrar na Rua do Sol. A chuva não desistia, ficando mais forte. Breno não tinha chances. Seu guarda-chuva ficara em casa. Esquecer coisas essenciais era um erro recorrente de sua personalidade. Um dos muitos motivos que implicavam em sua virgindade aos vinte e cinco anos.

   Cogitou a possibilidade de correr até um abrigo, mas sabia que ao fazer isso, estaria se abrindo a possibilidade de tropeçar no próprio pé. Preferiu abaixar a cabeça, guardar sua pasta com papeis dentro do casaco e caminhar. Talvez encontrasse algum local para aguardar a trégua da chuva.

   Muitas pessoas corriam de um lado para o outro; outras caminhavam com passos rápidos, protegidas parcialmente por seus guarda-chuvas.

   Breno não se encaixava entre esses. Aceitara seu destino. Não reclamaria. Não xingaria a Deus por ter mandado chuva naquela hora. Na sua cabeça não tinha muitos pensamentos relacionados nem a chuva e nem a Deus, mas, apesar disso, sentia-se incomodado com os constantes pingos atingindo sua pele.

   A estação do metrô estava distante e a preocupação dele em relação aos documentos em sua posse começava a deixá-lo irritado. Até que não as sentiu mais e ouviu uma voz suave como o som que escapa de uma minúscula caixa de música:

   − Espero que não seja nenhum documento importante.

   Breno olhou para à direita e viu uma garota de cabelos escuros e pele branca como o cume do Monte Everest. Segurava um guarda-chuva vermelho com bordados amarelos.

A PerseguiçãoWhere stories live. Discover now