Apenas pequenos flashes de memória são o que me restam do momento em que me vi rastejando pra frente.
Imagens turvas do mundo girando enquanto eu sou carregada pra algum lugar, as gotas d'água pingando em meu olho, as feridas ardendo como pimenta. Da dor eu me lembro bem. Então o céu é substituído por madeira, e o chão por algo macio e seco. Não vi quem me carregou. Um rosto surge e vai embora diversas vezes de meu campo embaçado de visão. Sinto retirarem minha roupa e isso queima. Um pano úmido com água quente é levado de encontro a meus ferimentos e grito com a agonia a cada toque.
Tem talhos por todo o corpo. Algo é colocado nas feridas e refresca a dor. Sinto meu corpo arder em febre e suar em demasia, uma xícara é colocada em meus lábios enquanto levantam minha cabeça pra que eu beba o líquido de gosto amargo. Acabo me entregando e deixando o sono dominar, mas ele vem perturbado demais.
Quando acordo, aos poucos retomando a consciência percebo estar sozinha. Tem uma lareira crepitante estalando suas linguetas flamejantes do outro lado do cômodo que parece ser uma sala e um quarto ao mesmo tempo apesar de grande. Penso em tentar me levantar, mas desisto quando percebo não ter forças suficientes pra isso.
- Acordou cedo demais criança volte a dormir. - uma voz suave, mas autoritária soou vinda de um outro cômodo.
- Eu não posso ficar, tenho que voltar pra casa - respondo rouca e tossindo em srguida.
- Pode, pode sim. E vai. - então a dona da voz surgiu pela porta do tal cômodo.
Uma mulher que eu julgaria por volta dos cinquenta, cinquenta e cinco anos usando um vestido verde escuro que mais parecia ter vindo de um filme medieval. Sua tez clara típica da região e cabelos ruivos presos em um coque até combinavam com a cor. Tinha olhos escuros e rosto com poucas rugas que só surgiam quando ela sorria como naquele momento.
- Precisa descansar, está muito ferida e passou boas horas de febre alta. Não está em condições de sair ainda. - Ela me entregou um copo de barro com água fresca que bebi avidamente - devagar, ou vai fazer mal.
Em seguida me passou um favo de mel dizendo que ajudaria a curar a garganta dos gritos fortes. Realmente eram um alívio às ranhuras que estavam depositadas lá.
- Olha eu agradeço de coração tudo que está fazendo por mim, mas eu preciso ir, a viagem é longa e eu tenho que trabalhar após o almoço, se não ir agora eu não chego a tempo. - tentei levantar outra vez e uma pontada aguda nas costelas me fez curvar sobre o tronco.
- Não precisa mesmo. Você vai ficar quietinha aí e se for preciso eu vou usar a minha autoridade com você Rebecca. - uma segunda voz irrompeu adentrando a casa.
Ela também usava um vestido escuro e antigo, mas de braços nus que ostentavam tatuagens vermelhas em diferentes desenhos e um deles era o Trisckle um importante símbolo celta.
Se eu achava o tom da ruiva autoritário mudei completamente de opinião. A mulher que entrou era no mínimo cem vezes mais. Os cabelos Negros até o meio das costas, o rosto belo de expressão forte, os olhos duros como pedra e a postura imponente mescladas a voz incisiva e o queixo erguido fariam qualquer um sentar e obedecer.Mas eu não era qualquer um.
- E que autoridade é essa será que posso saber? - a desafiei com os olhos.
Certo eu tava acabada e bastava ela apoiar um dedo em uma de minhas feridas que eu choraria e pediria arrego, mas orgulho é uma coisa difícil e que eu ainda tinha.
- A autoridade de mãe. - Ela cuspiu as palavras que no entanto me fizeram rir.
- A senhora está louca é? - ri mais - eu nem te conheço nunca vi seu rosto na vida, e pra sua informação minha mãe está vivíssima no Brasil. Então talvez você tenha me confundido com sua filha, mas sinto informar que não sou.
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Nas Asas do Corvo
Fantasía"Nem acredito que finalmente vou conseguir o emprego que sempre quis! Certo, é lá na Irlanda, mas o que eu posso fazer? Se é lá que está a oportunidade é pra lá que eu vou, em busca dos meus objetivos." Rebecca Montenegro, é uma recém graduanda em...