Ignite (Jackson Wang) 💎

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"Onde Jackson se afunda em sua própria vingança. "

Não me lembro exatamente como minhas memórias foram voltando à minha mente. Mas me lembro que foi depois que derrotei F'rall.

Foi como se tudo o que eu já havia vivido entrasse em conflito com outras lembranças, ainda enevoadas, como sonhos esquecidos em um desperto. E, meses depois, pensei que enlouqueceria. Era imagem atrás de imagem, atrás de imagem, até que eu não soubesse mais o que era verdade ou o que era sonho. Meu presente era tudo o que eu poderia ter convicção. Tudo o que eu podia me ancorar.

E, conforme os dias passavam, e o Torneio das Sombras se aproximava, as imagens de um passado que, outrora parecia que não me pertencia, foram se solidificando. Tornando-se mais nítidas, contrastadas em meu subconsciente. 

Então duvidei de tudo. Dos meus anseios, dos meus medos, da minha sede por vingança e passei a questionar o porquê de estar lutando. E essa sensação faz os meus ossos doerem há semanas.

Acordo com o barulho estridente do relógio cuco, que torna o fio de dor lancinante em meu crânio ainda mais intenso. O barulho quase lembra os gritos agonizantes dos bastidores das lutas do Torneio. Gemo e afundo a cabeça no travesseiro murcho, quase em frangalhos após os meus ataques, até o barulho acabar. 

Me levanto e caminho até a janela, que por mais que eu me esforce em limpar, sempre está suja de cinzas das chaminés do complexo industrial. Às vezes, é como se as cinzas já tivessem ocupado todos os lugares que podiam. As janelas, as ruas, meus cabelos, unhas, poros, e entrasse, e entrasse, cada vez mais fundo em mim mesmo, lembrando-me que eu sou tão cinzas quanto elas. Que um dia, nos tornaremos um só punhado de poeira escura da cidade, que só bastaria um golpe certeiro de Galmax ou Silf para isto.

Até mesmo esta falta de confiança em mim mesmo é sinal de que eu estou fraquejando. E a abertura do Torneio é em menos de 72 horas. Preciso resolver as coisas hoje.

Coloco a calça do uniforme da fábrica e uma das camisas mais limpas que eu tenho. Vou até o banheiro, me deparando com a tigela da pia cheia de lodo e me perguntando quando foi a última vez que limpei aquilo. Molho meus cabelos, quase tão escuros quanto as cinzas hoje, e penteio-os para trás. Duas folhas da grande árvore tatuada em meus braços escapam pela manga da camisa, me lembrando novamente das minhas dúvidas. Eu sabia de onde elas vinham, e o porquê delas. Eu havia feito em Doria, há três anos, em homenagem a minha mãe que foi morta embaixo de um carvalho pelo meu pai.

Mas agora, há uma memória duplicada. Lembro-me de estar debruçado sobre uma cama de papel, sem camisa e dopado. Lembro também das faíscas de cores variadas saindo de um aparelho e pessoas discutindo atrás de uma parede de vidro.

"Ele não vence esse. Quem vence é Wellix Wang. O impacto será maior se ele vencer o Torneio 4."

Wellix é o  nome do meu pai. O maldito dono das indústrias Wang. O homem que há anos planejava o Torneio das Sombras, mas somente há quatro anos atrás conseguiu colocá-lo em ação, em uma popularidade monstruosa, e que fazia questão de competir e vencer todos os anos.

As palavras ainda pinicam em minha mente, como algo que não se encaixa, que não deveria estar aqui. Suspiro e saio do apartamento, com uma determinação nova.

Merlia está encaixando as polias de sua bicicleta outra vez, com os braços suados, como se já tivesse passado um dia inteiro de trabalho. Ela solta um grito enfurecido, xinga um palavrão e invoca as chamas verdes, com três palavras curtas e as lançam contra a bicicleta, que se reduz a poucos pedaços de metal e cinzas mal cheirosas.

Night Ways [One Shots]Onde histórias criam vida. Descubra agora