Capítulo 14

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Ainda não era dia, mas Byakuya acabou acordando... Yoruichi estava dormindo, encolhida junto ao corpo dele.

– Dormindo assim até parece que é uma gatinha mansa... Né, Bakeneko?

Reparou então que ela estava vestida com o haori, que ele antes usara, e nada além. Ficou escorregando os dedos nos cabelos dela e desfrutando da quietude do momento. Foi então que se deu conta de que há anos Yoruichi tinha essa mania de querer vestir suas camisas, seus ternos, seus quimonos, de querer dividir o mesmo cobertor com ele... Além da ocorrência de agora, se recordou de outra recente, cerca de dois meses atrás, quando toda aquela situação havia começado. No dia que a impediu de ir a Sunshine Coast, ele a confinara em seu quarto e naquela ocasião, ela vestiu seu roupão de banho. Sorriu e se perguntou se aquilo seria inconsciente ou proposital.

Deixando a questão de lado, ajeitou-a cuidadosamente na cama, pois não queria acordá-la ainda. Olhou ao redor em busca de um cobertor, mas não encontrou nenhum por perto, então percebeu que estavam deitados sobre seus trajes cerimoniais e que os lençóis finos do leito largo e baixo ainda estavam em seus devidos lugares.

"Pelo visto fiquei um pouco afoito demais ontem..." - ele pensou consigo.

Suspirou e se levantou, abriu uma das gavetas do closet e encontrou uma bermuda, vestiu-a e depois procurou por um cobertor. Logo cobria Yoruichi e se sentou ao lado dela. Ficou observando-a dormir, relembrando alguns momentos daquela noite tão intensa.

Já aceitara o fato de que há dias se sentia ansioso por se deitar com ela, mas ainda assim havia se portado com uma volúpia que não julgava ser capaz. Não sentia vergonha disso, mas estava um pouco intrigado. Conheciam-se há anos, cresceram juntos, mas ter uma relação com Yoruichi - mesmo uma mera relação sexual -, era algo que nunca passara por sua cabeça.

Ainda a admirava, então se inclinou e depositou um beijo no rosto dela, depois se endireitou e pensava em ir buscar algo para comer, mas então os quimonos amarrotados na cama capturaram sua atenção. Voltou a olhar para Yoruichi, podia enxergá-la melhor agora que já se habituara à baixa luminosidade no quarto. Os olhos percorreram a silhueta sob o tecido fino, então ele vidrou o olhar e de repente foi transportado no tempo.

Ele tinha onze anos e estava em passeio na grande fazenda que servia de colônia de férias para os Kuchiki e Shihouin, no interior de Brisbane. Era um dia chuvoso, ele discutira com o avô por alguma bobagem e fugiu correndo a esmo pelos vastos hectares da fazenda. Foi pego pela chuva, caiu, se machucou e sentiu uma dor insuportável. Ficou derrubado no chão por tanto tempo que perdeu a noção das horas até que escutou a voz dela.

"Moleque arteiro! Eu sabia que ia acabar se machucando. Engole isso. É remédio."

"Minha perna tá doendo... Tá doendo muito. Deve tá quebrada!"

"Não, não tá quebrada. A dor já vai passar e logo o seu avô vai encontrar a gente."

"Tá doendo, Yoru..."

"Já vai passar."

Perturbado, Byakuya balançou a cabeça em negativa.

– Não! Isso não aconteceu de verdade. Foi só um sonho.

Mesmo contra a vontade, ele se recordou do cheiro da chuva, do corpo de Yoruichi exposto pelo tecido branco molhado - o corpo de uma adolescente de dezesseis anos, plenamente amadurecido. Lembrou-se de se agarrar a ela, de choramingar em seu peito, de adormecer sendo abraçado e quando acordou já não sentia dor alguma e estavam deitados no chão, lado a lado, refugiados junto à carcaça de um velho trator, as roupas sujas e ela só com o hadajuban, porque as outras peças do quimono cerimonial dela lhes serviam de forro para a terra molhada e de atadura para a perna machucada dele. E quando acordou, ele ficou observando-a dormir exatamente do mesmo jeito que estava fazendo agora.

Vítimas do DeverOnde histórias criam vida. Descubra agora