Sober

400 45 3
                                    

Viver em uma cidade grande é mais difícil do que eu pensava.

Doncaster sempre fora pequena e todos confiam em todos desde que me entendo por gente, então não saber quem é o próprio vizinho é estranho para mim, mas meio que entrei no ritmo. Em todo caso, eu não seria o esquisitão que cumprimenta a todos e não recebe nem ao menos um aceno de cabeça de volta, claramente um "caipira". Se não pode com eles, junte-se á eles.

Decidi vir cursar Radiologia em Londres depois que me formei em enfermagem. Minha família sempre teve tradição nessa área da saúde e mesmo eu vendo o quanto minha mãe trabalha por longas horas como enfermeira no hospital local, decidi seguir por esse caminho. Foi uma aventura e descobri que sou bom em trabalhar nisso, mas essa aventura não foi tão grande quanto sair da minha pequena cidade e me mudar para a capital.

Todos lá em casa apoiaram a decisão e mesmo eu sabendo que sentiria falta de todos eles - Meu Deus, eu vivia com seis irmãos, mãe, padrasto e meus avós maternos! - morar sozinho era algo que eu tinha que fazer, tinha que aprender. E cá estava eu, onze meses depois, me ferrando com Medicina nuclear e comendo macarrão instantâneo nas noites de terça (e quarta, quinta e sexta). Pensando bem, só fazia alguns dias que eu tinha voltado para essa rotina de comer macarrão instantâneo. Eu havia sido praticamente proibido de fazer isso nos meses anteriores.

Veja bem: o pior de sempre comer isso, não era o gosto de macarrão requentado ou a galinha caipira que não tinha gosto de galinha caipira, era que comer miojo me lembrava do cara de cabelos enrolados e olhos verdes que me baixou minhas guardas e entrou não tão de mansinho assim em minha vida; era lembrar que quando vim para Londres, eu não sabia que iria me foder.

Não apenas no sentido literal, mas em quaisquer outros existentes também.

Onze meses apenas nessa cidade e eu consegui descumprir a única e mais importante regra que me coloquei: Não se apaixonar.

Como sempre, apaixonar-se não é tão bonito quanto como nos livros. Eu sentia dor o tempo todo apenas em o olhar, a angustia de talvez nunca ser correspondido, de ser apenas um teste, um boneco inflável usado para descobertas sexuais. Eu nunca recebia olhares apaixonados de volta, admirados sim, mas apaixonados não (exceto, talvez, pela noite de sexta passada); eu apenas recebia flertes de forma amigável e desejosas, nada romântico - ok, houveram momentos bem românticos, como o jantar, mas não tinha isso do recíproco em relação à sentimento. Eu sabia que não ou ele não teria feito o que fez se houvesse.

Então eu estava apenas fodido. No bom, mas principalmente no mau sentido.

Niall Horan - um grande amigo que fiz na aula prática de primeiros socorros ao que foi voluntário para aprendermos a manobra de Heimlich - desde o começo me avisou que eu tinha que tomar cuidado, mas como bom tolo apaixonado, não o ouvi.

Ele conhecia a reputação de Harry Edward Styles - todos conhecem na verdade - e mesmo ficando um pouco chocado no começo quando revelei sobre nossos encontros, Niall não achou absurdo que isso pudesse acontecer. Afinal, "praticamente todas as meninas da faculdade já tinham passado por suas mãos, porque não começar a experimentar os caras também?"

Quando cheguei quase aos prantos em frente à porta de Niall, eu sabia que ele sabia o que tinha acontecido sem eu nem mesmo falar uma palavra - não que eu conseguisse também.

Harry havia me magoado.

Mas não foi só culpa dele. Eu me deixei acreditar que de fato ele estava gostando de mim e eu não era apenas mais um. Que estávamos caminhando para algo real. Talvez até um relacionamento. Os momentos eram mais intimos e eu me sentia em casa a cada vez que olhava para ele, mesmo estando o tempo todo apavorado de que nada daquilo fosse real. E ao que parecia, não era bem assim mesmo.

Booty CallOnde histórias criam vida. Descubra agora