Outlander || Yoonjikook

Capítulo VII - Um Dom Precioso

Ji Min teve que guardar repouso no quarto por alguns dias.

No primeiro, não conseguia nem se erguer da cama, e depois de se acostumar com a rotina simples e movimentada de Hworan, era estranho ficar sem ver praticamente ninguém. Sentia falta das crianças e do trabalho no campo. Sentia falta da brisa fresca impregnada com o odor das ervas e dos modestos raios de sol que venciam as nuvens que coroavam a montanha. Sentia falta de ser útil.

Já não desejava ir para casa. Quando pudesse ir, iria. Se sobrevivesse a esse Sonho, iria. Só pedia a qualquer deus que pudesse ouvi-lo que se apiedasse e não permitisse que o tempo d’O Sonho e da realidade coincidissem. Não gostava nem de imaginar como Yang Soon estaria se coincidissem…

A única coisa boa disso tudo eram as visitas de Kook. Ele estava falando sério ao dizer que ficaria ao seu lado, afinal.

Havia sentido um pouco de receio de voltar a conversar com ele ao vê-lo cruzar a porta na manhã que sucedeu sua ceninha desastrosa (além de ainda estar se sentindo envergonhado, Ji Min não confiava em si mesmo. E se acabasse se distraindo e falasse alguma besteira que delatasse sua mentira? O que será que Kook pensaria se descobrisse a verdade? Se fingi estar com amnésia, poderia estar fingindo sobre tudo. Ele deixaria de acreditar em mim…). No entanto, sua língua não o traiu, e conseguiram conversar normalmente. Não perguntou sobre a família dele, e ele não perguntou sobre seu passado, como se tivessem estabelecido um acordo silencioso: nada além de nós interessa.

Ji Min contou o pouco que podia sobre sua pessoa sem se colocar em risco: seu gosto por plantas e seus substratos, seu interesse por medicina, seu desejo de ajudar os outros. Falou sobre suas aulas com o senhor Hyun Ni e acabou contando que não sabia ler.

(Na ocasião, Kook o felicitara por ter conseguido se tornar discípulo de Kim Hyun Ni — o médico mais brilhante do império, por sinal —, pois, além de ter sido o primeiro a conquistar tal honra — Hyun Ni se recusava a ensinar, apesar da montoeira de pedidos que recebia —, agora tinha livre acesso ao rico acervo pessoal do médico — algo cobiçado por muitos e concedido a bem poucos; o manual de plantas, esquecido sobre sua mesinha de cabeceira, não havia passado despercebido aos olhos do rapaz. Ji Min não conseguira guardar segredo, não quando Kook parecia tão feliz por sua sorte. Tivera que contar a ele que em suas mãos todo aquele conhecimento era o mesmo que pérolas atiradas aos porcos, meros rabiscos sem sentido. Temera que Kook o repudiasse por não saber algo tão bobo quanto ler — que espécie de nobre não saberia ler? ele o julgaria um camponês, decerto —, porém ele se limitara a dizer que “lição aprendida é lição batida”, que se não se recordava poderia aprender tudo de novo e abrira o livro, pondo-se a lê-lo em voz alta para que ouvisse.)

Também falou sobre as tarefas que compartilhava com as crianças, sobre o caráter caloroso do povo de Hongsaejoo, sobre como tudo aquilo lhe trazia paz…

Por sua vez, Kookie — esse era um apelido bem menos meloso — foi bastante sucinto ao falar de si mesmo, porque, segundo alegava, não havia muito o que dizer. Ele era um guerreiro, assim como todos os demais homens do clã Jeon, e, também como eles, não passava de um mero instrumento para a expurgação da mácula que se abateu sobre a Família Imperial com o assassínio do Imperador Kim Min Kyu. Kookie não era nada espontâneo, ao menos não quando o assunto era ele mesmo. Ji Min teve que perguntar para aprender mais sobre ele.

Kook tinha o costume de ler muito, hábito adquirido graças à educação rigorosa que recebeu. Tinha um gosto especial por jogos e música e adorava cavalgar e desenhar, embora não estivesse tendo tempo para tais atividades por agora. Os deveres de Sua Majestade Eleita o mantinham constantemente ocupado.

(Ji Min até quis saber qual era exatamente a posição de Kookie, porém como essa pergunta poderia ser mal interpretada, guardou sua curiosidade para si mesmo. Ele provavelmente era um dos que protegiam o Imperador Conclamado de perto.)