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"Quem um dia irá dizer que existe razão nas coisas feitas pelo coração?"- Legião Urbana

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"Quem um dia irá dizer que existe razão nas coisas feitas pelo coração?"
- Legião Urbana.

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CASSIAN
🦇

     Eu mataria minha Grã-Senhora. E Rhys provavelmente me mataria por isso, mas teria valido a pena.
Enquanto carregava uma Nestha completamente bêbada de volta para aquele muquifo onde ela tinha escolhido morar, eu só conseguia pensar que Feyre tinha um péssimo senso do ridículo. Ela poderia ter me pedido para carregar seus quadros pelo céu de Velaris, ou limpar o telhado da mansão, ou posar para um nu artístico. Pela Mãe, eu teria plantado flores com Elain se aquela maluca tivesse pedido isso! Mas não. Feyre pediu justamente o que eu não estava disposto a fazer. E ainda assim eu fiz. Porque era um general e obedecia à minha Grã-Senhora.
     Só que isso não diminuía minha vontade de esganá-la.
     O bar onde encontrei Nestha era o único na cidade que poderia ser considerado decadente. Então, obviamente, ela o visitava com bastante frequência. Era tão irritante quanto era deprimente. A coloquei na cama desarrumada e senti, com uma pontada de desgosto, o cheiro de sexo que se entranhava nos lençóis. Nestha ainda acabaria destruindo a si mesma... E às suas irmãs no processo, uma vez que tanto Elain quanto Feyre sofriam por ver seu estado deplorável.
     De quebra, acabaria destruindo a mim também. Maldita fosse!
     Tirei suas sandálias enlameadas e a cobri com um cobertor antes de me afastar em direção à porta. Antes que eu saísse, porém, ela abriu minimamente os olhos e os voltou para meu rosto.
     — Eu odeio você — falou, sua voz grossa pelo porre. E tornou a cair em um sono embriagado.
     Observei seu semblante, tranquilo como nunca era enquanto estava acordada.
     Linda e inalcançável, era isso o que Nestha Archeron sempre seria.
     — É, eu sei — murmurei para as paredes. E voei para longe, rumo ao Acampamento Refúgio do Vento, onde havia problemas que eu ao menos poderia ter esperança de conseguir resolver.

⚔️ ⚔️ ⚔️

     Devlon insistia em impedir que as fêmeas treinassem. Seus argumentos eram sempre os mesmos e eu já estava farto disso. Cedo ou tarde, cabeças rolariam.

     Andei entre os machos que treinavam sob a neve constante e recebi, como sempre, olhares enviesados. Ignorei alguns, rosnei em resposta a outros. Eu não estava exatamente de bom humor naquele dia. Encontrei o senhor do Acampamento envolvido em uma conversa séria com seus homens de maior confiança e me aproximei sem esperar por um convite.
 

   — Quero as meninas nos ringues de treinamento em vinte minutos — falei, ríspido.
     Devlon interrompeu o que dizia ao macho à sua frente e me encarou.
     — As meninas estão cuidando de seus afazeres — retrucou — Elas poderão treinar quando acabarem.
     Sempre a mesma coisa.
     Trinquei os dentes.

     — Não estou colocando isso em discussão, Devlon. Elas treinam agora, duas horas. E depois os rapazes podem ajudar com os afazeres domésticos.
 

   O risinho de deboche que ele exibiu me fez querer lembrá-lo dos motivos pelos quais eu era o general dos exércitos de Rhysand. Eu quis lembrar àquele macho insuportável que eu era, juntamente com Az, o Illyriano mais poderoso da história de Prythian. Mas eu não fiz nada disso, porque acender meus Sifões e distribuir alguns socos não resolveria coisa alguma.
     E também porque não tive a chance de fazê-lo.
     A pouco mais de dez metros de onde estávamos, vi o ar começar a oscilar. Era como se pequenas partículas de luz se desprendessem dele e ficassem girando, como estrelas em plena tarde de inverno. Desembainhei minha espada ao mesmo tempo em que a luz convergia para um único ponto e mostrava que era, afinal, uma travessia. E uma Grã-Feérica apareceu no centro do Acampamento Refúgio do Vento.
     Seus cabelos eram muito longos, de um preto azulado que parecia muito com os de Rhys, e as pontas eram naturalmente tingidas de azul vívido; os olhos tinham um tom dourado que se assemelhava a ouro líquido... Se um dia Amren a visse, provavelmente roubaria seus globos oculares. Baixa para uma Grã-Feérica, a mulher era linda. Tinha um rosto fino, de ângulos delicados, pele bronzeada e lábios carnudos. O único problema era que tinha acabado de invadir um acampamento Illyriano em pleno funcionamento.
     Os machos que treinavam imediatamente a cercaram. Mas ela parecia indiferente a isso, como se não ligasse para o fato de mais de duas dezenas de homens do tamanho de touros a estarem rodeando. Ou era muito tola para perceber que aqueles eram alguns dos melhores guerreiros de toda Prythian. A espada que trazia em sua cintura não seria de grande utilidade contra eles.
     Espada essa que, eu percebi, era uma lâmina Illyriana.
     Seus olhos perturbadores cravaram-se em mim.
     — Você é Cassian? — perguntou. Sua voz, apesar de obviamente suave, soou rouca, como se ela há muito não falasse.
     Apoiei minha espada no chão e sorri.

     O general em mim gritava um alerta de que aquela mulher, quem quer que fosse, era mais perigosa do que parecia. Talvez pela atitude fria e tranquila que ostentava, ou pelas roupas negras e justas que cobriam cada centímetro de sua pele e a escondiam como um manto protetor. Por algum motivo, a desconhecida me lembrava Rhys.
 

   E Rhys não era alguém que brincava em serviço.

     — Depende — eu disse — Quem é você?

     Ela deu de ombros.

     — Sou alguém que traz informações que você necessita.

     Ergui uma sobrancelha.
 

   — Como o quê?
     — Como os nomes de alguns Illyrianos que estão traindo Prythian e se aliando a Hybern. E o fato de que vocês desconhecem a existência de um herdeiro do Rei morto.
     Minha postura relaxada vacilou. Hybern não possuía herdeiros, mas quanto às tropas Illyrianas... Rhysand, Az e eu vínhamos tentando encontrar maneiras civilizadas de acabar com os focos de indignação que surgiram após a guerra. Eram as fêmeas quem mais se mostravam raivosas, alegando que tínhamos colocado nossos rivais de infância nas linhas de frente da batalha como uma forma de vingança. Era uma ideia ridícula, mas com potencial destrutivo. Nós Illyrianos não éramos conhecidos por nossa sutileza e paciência.
      — Prendam essa mulher antes que ela diga mais besteiras — Devlon grunhiu — Nós a ensinaremos a não brincar com guerreiros.
     Abri a boca para ordenar que ninguém tocasse na Grã-Feérica, mas ela acabou provando ser perfeitamente capaz de lidar com a situação.
     Fiapos de luz, brancos e dourados, enrolaram-se em seus braços e pernas, exatamente como as sombras espiralavam ao redor de Azriel. Essa luz girou para longe dela e se lançou contra os quatro Illyrianos que andavam em sua direção. Cada um deles caiu, inconsciente, quando o poder daquela mulher os encontrou.
     Sem saber se meus companheiros estavam ou não mortos, bati nos Sifões nas manoplas e fiz surgir minha armadura completa.
     — Eles estão vivos — a estranha garantiu ao ver que eu me preparava para detê-la — E você, Lorde Devlon, tem sorte por não ser um dos traidores de Prythian. Do contrário eu lhe mostraria o que acontece com machos que resolvem brincar com uma guerreira.
     Pelo Caldeirão, quem era aquela mulher?
     Como se ouvisse meus pensamentos, ela fez desaparecer os fiapos de luz que a cercavam, e disse:
     — Eu sou Valerie. E quero que traga seus Grão-Senhores até mim, general. Precisamos impedir que uma nova guerra tenha início.


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