Capítulo 20 - Parte Dois

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Samantha se aproxima.

 — Este é um dos últimos livros que antecedeu a Batalha dos Três Grandes —, expõe Samantha, trazendo um exemplar pesado em mãos. — Fala sobre várias coisas, inclusive a longa e cansativa história da Era do Declínio.

Desgosto um tantinho menos dela quando a vejo depositá-lo à minha frente, solicita em cumprir sua oferta de dar-nos respostas.

— Acho que estudamos um pouco sobre, quando falamos da criação de Aliança —, comento, olhando com fome mal disfarçada para o livro grosso que promete muitas histórias e explicações que eu posso não ter de outra maneira que não seja lê-lo.

— Não, não. — Samantha balança a mão, como se desconsiderando minha afirmação. — Este é especial. É o livro que conta sobre a história da América, sobre a República Americana, sendo mais específica, antes, durante e depois da Era do Declínio. É muito importante mantê-lo inteiro e conservado, pois existem nada mais que três cópias destes, sendo que uma tem pouquíssimas partes legíveis e a outra está perdida há muito.

— Em que idioma está escrito? — Indago, vendo a maneira com que ela passa o dedo pela capa, logo em cima das letras de uma língua desconhecida por mim.

Dedilho os vincos em minha testa, tentando aliviar a tensão e a dor de cabeça que se pronuncia.

— Latim. É uma língua antiga que sobreviveu por pouco —, explica, ao perceber nossa confusão. — Foi escrito por dois historiadores, um das Ilhas Perdidas e outro Republicano, um dos primeiros Cae. Por isso é tão raro, já que não podemos perder nossa história. Nós o protegemos com cuidado, para não ser pego ou sequer descoberto por invasores, então o mantenham em segredo total.

Assentimos em conjunto, hipnotizadas pela mágica poderosa que parece estar contida nas páginas amareladas que são folheadas por Samantha.

— Então, o que foi esse ataque? — Lanço, enquanto espero, recebendo um suspiro de Samantha.

— Eles são nossos vizinhos —, abrevia, parando de procurar e erguendo a mão até a boca, como se fosse roer a unha, mas muda de ideia e a abaixa de novo, voltando à tarefa anterior. — Nada confiáveis, mas costumam ser discretos, na maior parte do tempo. Estão procurando alguma coisa que não sabemos e acreditamos que tenha sido isso os fez adentrar o território da Reserva sem convite, o que é uma afronta ao meu irmão.

Sinto que ela é sincera, por isso guardo minha réplica sarcástica para mim, silenciando minha resposta sobre o que penso de seu irmão.

— E... — Minha língua fica pesada com o esforço de verbalizar meus pensamentos que não estou acostumada a aceitar ter. — Eles são aquilo que vimos na janela, não é?

Não é uma pergunta, mas Samantha assente, após uma curta pausa.

Meus olhos se arregalam mesmo que a ação tenha sido esperada, o sentimento de pânico querendo crescer ao meu redor, mas, apertando as unhas no estofado fofo da cadeira em que me acomodo, eu me forço engulo o enorme caroço que entala minha traqueia, que quer sair junto com as palavras "é mentira" enquanto fujo pela primeira porta que encontrar.

Ela respeita o momento de silêncio que recai sobre as meninas e eu.

Respiro fundo e anuo para ela, apoiando a testa na mão com o incômodo da dor de cabeça que vem, dizendo a mim mesma para aceitar que estou entrando numa nova etapa de minha vida, que pode ser amedrontadora, mas não menos real.

Todas nós estamos um pouco assustadas, embora tentemos não demonstrar, cada qual por seu motivo. Meu orgulho me faz ficar imóvel, inexpressiva, para as descobertas, meus instintos me avisam para ficar alerta, mas minha mente — minha lúcida e fértil mente — parece não se dar conta do caos em que me meti, pois, no fundo, sinto o desespero ser aplacado pela promessa de uma bela anestesia de aceitação que não espero ter tão cedo.

Penny aperta meus dedos, lembrando-me de sua presença, e eu os aperto de volta, mostrando-lhe, sem palavras, que estou do seu lado.

— Eles vão voltar? — Indaga Chia, torcendo os dedos.

— Eu não sei — é o que Sam diz.

Sua expressão contradiz suas palavras.

Frida está mexendo na manga da blusa. Reconheço o gesto como uma mania que ela tem ao ficar numa situação que a deixa nervosa.

— Eles são perigosos? — Chia volta a falar, fazendo a pergunta em um sopro baixinho. — Digo, será que nós devemos nos preocupar?

— Fiquem longe das janelas por hoje, e ficará tudo bem. Samuel e os rapazes estão cuidando de tudo. Não devem me questionar sobre isso.

Esta é a única resposta que temos.

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