Capítulo 11

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ANA SE LEVANTOU no susto e procurou o celular em meio aos casacos com os quais tinha se coberto. O som extremamente alto ecoava pelo ônibus, uma dúzia de pessoas - em sua maioria adultos emburrados - a encaravam e resmungavam.

Isso não seria um problema se o toque não fosse um remix de Expecto Patronum, do Harry Potter, que aumentava o volume a cada explosão do refrão.

Em desespero, ela jogava tudo para o alto, em busca do celular, enquanto Taelor mal se aguentava de tanto rir. Não tinha passado nem da metade da música, mas parecia que estivera tocando há séculos, e Ana só ficava mais vermelha.

Por fim, quando o motorista freou com um tranco, o celular caiu do capuz da blusa, quicando no chão sujo e trincando a tela. Felizmente - ou não - ele parou de tocar. Mas a tela se apagou também.

- Droga, droga, droga... - Ana murmurou, se abaixando para pegar o telefone e quase batendo a cabeça no banco da frente.

Taelor puxou a própria bolsa do meio do banco, a colocando aos pés. Ana então jogou o celular entre elas, levando a mão à cabeça e suspirando. Não, ela não ia surtar, não ia.

- COMO EU SOU IDIOTA - choramingou, sem se conter.

O celular que ganhara de presente ainda no ano retrasado de Lola... Aquele que ela quase fez a tia devolver à loja pelo preço que não deveria ser gasto com bobagens. Lola vai me matar, como eu falo com ela se...

Mas o ônibus pulou na estrada de novo, a fazendo se lembrar onde estava. O porquê de estar ali. Lola havia sumido, não fora um sonho; ela estava em um ônibus pras Terras Altas tarde da noite.

Ana voltou a chorar.

- Ah, não, amiga, não vá começar a fazer birra. - Taelor a repreendeu, a abraçando. - A gente compra outro.

Ana quis rir, pelo jeito de mãe da amiga, mas não conseguia. E também se sentia, por algum motivo, culpada se risse de qualquer coisa naquele ponto.

Tae se afastou, tirando o cabelo dos olhos, e pegou o celular, virando entre os dedos. Começou a batucar com as unhas bem feitas na parte de trás, até passar uma delas na lateral e arrancar a tampinha que protegia a bateria. Então retirou o pequeno retângulo, soprou, colocou de volta e pressionou o botão de ligar. Em menos de um minuto, o logo com fundo azul da marca ressurgiu na tela.

Ana abriu os olhos e soluçou, a expressão de desespero mudando para indignação.

- Isso mesmo, você é boba.

Tae abanou o ar, olhando pela janela do ônibus, para o campo infinito que se estendia adiante, um ou outro poste de luz amarela impedindo a completa umbra. Um rio estreito brilhante separava a estrada quase deserta da cidadela do outro lado, poucas luzes acesas contra as sombras do inverno.

Elas nunca haviam estado ali, tão longe. Porém, Ana não podia negar: o céu nunca parecera tão limpo, escuro e estrelado quanto naquela noite, naquele lugar em que nunca havia pensado de verdade.

- Tae... Onde estamos?

Taelor ligou o próprio celular, abrindo o GPS que mal funcionava. A luz fantasmagórica iluminou seu rosto, vermelho de frio.

- Nas Terras Altas, Ana. Perto de Auchreoch.

Ana assentiu, mesmo que não fizesse muita ideia, e voltou a olhar pela janela, as árvores desenhando no horizonte profundo seus arabescos. As estrelas piscavam, entre elas a que mais se destacava: a Estrela Polar, em seu esplendor, guiando-as para o Norte.

A neblina de inverno passou como uma brisa selvagem, carregando pequenos flocos de neve. Ana continuou encarando as estrelas, e se pegou imaginando se elas a observavam de volta.

Aurora | Adhara: Deraia - Livro IOnde histórias criam vida. Descubra agora