Capítulo 1

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É estranho não saber que rumo sua vida vai tomar. Você se sente perdida, inquieta, ansiosa e completamente confusa sobre as decisões. Foi assim que me senti após o término da Faculdade de Medicina. Sabia que deveria escolher a especialização o mais rápido possível, pois quanto mais tempo se passasse, maior seria a dificuldade em retomar os estudos e conseguir um emprego.

Foi então que conheci a maravilhosa doutora Julia, especialista em Patologia Forense, em uma das palestras que assisti. Já gostava dessa área devido aos programas de TV e livros policiais, mas não imaginava que me apaixonaria ao ponto de escolhê-la como profissão. Após uma longa conversa sobre como a patologia serve para desvendar a causa da morte da vítima e ajudar a descobrir o culpado, decidi que iria me candidatar para o mestrado em Medicina Legal em uma nova universidade, em uma cidade um pouco afastada de onde moro.

Mal pude acreditar quando os resultados saíram e meu nome estava na lista de colocados. Iria me mudar para Leewood Town, começar uma vida nova e sem pais por perto. Não que eu esteja reclamando, adoro liberdade e independência, será muito bom para mim. Sempre tive o desejo de morar sozinha, mas como ficarei nos dormitórios da universidade ainda vou ter que esperar um pouco pra isso.

"Jade, já pegou tudo? Casaco? Carregador? Celular? Escova de dentes? Documentos? Um lanchinho para viagem?"

"Mãe, está calor, pra que o casaco? E acabamos de almoçar, nem demora tanto tempo assim! Uma ajudinha por favor, pai..."

"Ela já sabe o que precisa fazer, Helena, já tem 23 anos, não é mais um bebê..." Disse meu pai, que sempre me apoiava em mostrar que eu já era bem adulta para não precisar de ser relembrada de tudo aquilo.

"Eu sei, mas é difícil ver ela se mudando para outra cidade."

Depois das despedidas e de colocar tudo no carro, comecei a dirigir em direção à casa da minha melhor amiga, Tracy, que iria para a mesma Universidade que eu, porém para o mestrado em Nutrição Clínica. Nos conhecemos na Faculdade de Medicina já que tínhamos as mesmas aulas, mas acabamos por optar áreas diferentes. Ela sempre diz que sou meio louca por decidir seguir uma área na qual passarei a maior parte do tempo lidando com mortos.

"Eu definitivamente não conseguiria, quem iria me responder enquanto eu estivesse falando sem parar? Seria muito sem graça, além de não gostar do silêncio do meu parceiro de conversa acho que ele iria retomar à vida somente para poder fugir de mim... ou para mandar eu calar a boca..." Me disse uma vez enquanto tomávamos café, mexendo nos seus longos cabelos castanhos enquanto me olhava com seus olhos verdes brilhantes e seu sorriso habitual. Não ligo muito para cor dos olhos das pessoas, mas os de Tracy eram tão profundos que não tinha como não gostar.

Assim que cheguei em sua casa, fui recebida com abraços e gritinhos de alegria. Ambas decidimos ir no meu carro para que fosse menos aborrecida a viagem para Leewood. A mãe de Tracy estava tão empolgada quanto ela, nos dando biscoitos caseiros para levar.

"Quem diria que essa maluquinha aqui iria se dedicar tanto? Estou tão orgulhosa de vocês, minhas queridas!" A mãe de Tracy estava quase chorando de emoção enquanto nos abraçava.

"Ai mãe, deixa disso. Já estamos indo, tchauzinho, mais tarde ligo." Tracy se desvencilhou do abraço meloso, já que ficava um pouco envergonhada quando sua mãe demostrava muito afeto em público.

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Ao sair da casa de Tracy fomos direto para a Universidade Leewood. Quando chegamos lá, vimos que cada departamento era localizado em um prédio diferente, não muito distante uns dos outros, porém provavelmente não poderíamos nos encontrar com muita frequência entre uma aula e outra.

Após descobrirmos onde ficavam os departamentos, seguimos em direção aos dormitórios. Um aglomerado de residências de cor branca com telhados alaranjados, dispostas a alguns metros umas das outras. A maior delas possuía uma entrada principal para a recepção. A grande porta de madeira desembocava em um saguão abarrotado de estudantes que desejavam pegar a chave do quarto onde ficariam alojados.

Assim que entrei no saguão, percebi que a abóbada era simplesmente maravilhosa, no estilo de arquitetura gótica que tanto gosto, com arcos que conforme iam se juntando, formavam uma estrela complexa no seu interior. Estava tão distraída que sem perceber dei alguns passos para trás até encostar em algo. Assim que me viro, estou de frente para um garoto um pouco mais alto que eu, de cabelo curto escuro, olhos castanho escuros e uma expressão de choque.

"Ah, peço desculpas!" Digo, com o coração acelerando cada vez mais a cada segundo.

Sua expressão se suavizou um pouco.

"Não tem problema, também estava distraído." Deu um pequeno sorriso e simplesmente se virou para ir em dição à saída.

"Uuuiii, logo no primeiro dia tropeça numa beldade daquelas, queria ter a sua sorte! Ou melhor, uma amiga como eu que propositalmente não avisou que você iria de encontro com um Deus grego, para que rolasse um primeiro contato." Disse Tracy enquanto me olhava com um sorriso maquiavélico e ao mesmo tempo orgulhosa de seu feito.

"Não acredito que você fez isso! Você podia ter me avisado. Que tipo de amiga é essa?"

"Uma que quer arranjar um cara lindo pra sua melhor amiga, não teria nenhuma graça atrapalhar o seu destino estabalhoado para os braços de um gato daqueles. Agora anda, temos que entrar na fila para pegar a chave dos quartos."

Felizmente conseguimos ficar no mesmo quarto, o que facilitaria a adaptação em relação a isso. O quarto não era espaçoso, com duas camas de cada lado e duas escrivaninhas perto da janela. Estávamos no térreo, portanto talvez desse para ouvir mais os barulhos do lado de fora, mas parecia sossegado na medida do possível. Passamos o resto da tarde e início da noite arrumando nossas coisas, então já cansadas e com fome decidimos ir à pizzaria do campus para relaxar um pouco.

O local era bem agradável e estava lotado, já que nesta mesma semana muitos cursos iriam começar suas aulas. Sentamos em uma mesa perto da janela em uma mesa de quatro lugares. Após pedirmos uma pizza calabresa e dois refrigerantes começamos a conversar distraídas quando sinto alguém tocar levemente meu braço.

"Olá, desculpe, esse lugar está vago? Não encontro mais nenhuma mesa vazia e queria saber se vocês se importam se eu me juntar a vocês." Disse para nós duas uma menina loira de olhos castanhos, parecendo simpática.

"Claro que pode sentar, sinta-se à vontade. Me chamo Jade."

"Pazer, Caroline."

"Tracy."

Após fazer seu pedido à garçonete, Caroline continuou a conversa, contando que era nova na universidade e que estaria fazendo o mestrado em Medicina Legal.

"Não acredito nisso, que coincidência! Também estou iniciando esse curso." Eu disse, surpresa com a situação.

"Quando cheguei aqui e não tinha nenhuma mesa vaga pra mim pensei que fosse azar, mas afinal foi mesmo sorte. Espero ter sorte assim nos exames." Rimos e começamos a comer, pois nosso pedido já havia chegado.

"Sabem, minha colega de quarto já estuda aqui faz um tempo e me disse que vai ter uma festa hoje à noite, mas não me sinto muito a vontade indo sozinha. Por acaso querem ir comigo?" Disse Caroline, parecendo otimista ao esperar nossa resposta.

Eu e Tracy nos olhamos e sorrimos, nada melhor que uma festa para conhecer pessoas novas e analisar o ambiente. Não que eu seja uma pessoa que saia muito, mas quando entro no clima adoro dançar, não me importando com as pessoas ao redor e esquecendo dos meus problemas. Ainda mais com Tracy, que sempre me acompanha enquanto nos divertimos. Além disso, o mero pensamento de que talvez o garoto misterioso de hoje de tarde esteja na festa me deixa animada e pronta pra sair.

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