Capítulo 1

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Capítulo 1

Bateu a porta do carro e respirou fundo. Alice sentia como se sua vida estivesse recomeçando.

Mais uma vez.

Aquele lugar era mais uma chance que estava se dando. Mais uma vez que estava recomeçando, um novo lugar, uma nova vida, mais uma vez que queria se encontrar.

Nos últimos anos, os lugares não pareciam certos. A inquietação, as noites mal dormidas, as pessoas que não eram queridas, apenas conhecidos, apenas rostos que passavam pelas clínicas e hospitais que trabalhava.

Respirou novamente o ar gelado da manhã, olhando para as ruas vazias daquela pequena cidade. Alice não conseguia lembrar quando havia decidido mudar-se para lá, mas pensava que fora uma excelente decisão. Além da calma e da paz, aquele lugar lhe passava um certo aconchego que não conseguiu sentir em outros lugares, nem mesmo em sua cidade natal. E ela estava ali há apenas dois dias.

Quando marcou no mapa que se mudaria para Brookings, viu que estava descendo o mapa pelo Estado de Oregon. Suas moradas eram em cidades com grandes florestas, mas nenhuma se comparava a de Brookings, até agora. Assim que entrou pela estrada, notou que a floresta parecia segui-la onde fosse, cada vez maior, cada vez mais presente e sempre ao fundo de toda e qualquer paisagem. O verde pintando um imenso pano de fundo.

Gostava do clima que variava entre chuvoso e seco, se sentia bem. Mesmo que as roupas demorassem o dobro do tempo para secar na secadora, mesmo que seus cabelos parecessem sempre molhados. A época chuvosa era a que mais a agradava, desde pequena sentia-se bem em estar por entre as geladas gotas que vinham do céu.

Andou até a Clínica, vendo que essa estava com a porta fechada. Era uma modesta casa de dois andares, que atendia toda a população da cidade, mesmo com o grande hospital que existia no Centro. Olhou para o céu, vendo o vento levar as nuvens de chuva de um lado para o outro, movendo-as devagar.

Empurrou a porta de vidro, sendo recebida pela ambiente mais quente de dentro do corredor. Algumas pessoas estavam sentadas nas cadeiras de espera e o som de vozes que conversavam baixo, como se estivessem em uma igreja. Ajeitou o casaco no corpo, já querendo retirá-lo, o ambiente estava quente para o casaco, o jaleco, e a camiseta que estava usando por debaixo de tudo.

— Alice. — uma voz no final do corredor pintado de verde-claro a chamou e Alice tirou os cabelos castanhos ondulados da frente do rosto e fixou os olhos na garota ao fundo.

Era Anne que a chamava, os olhos azuis brilhavam maliciosos e Alice não entendeu o motivo. Se aproximou pelo corredor, acenando para os pacientes que estavam aguardando atendimento, ou apenas resultados de exames - até onde conseguiu perceber, não havia nenhum paciente seu.

Notou que a porta de seu consultório estava aberta, e lembrava-se de tê-la fechado na noite anterior, tinha certeza absoluta de ter feito aquilo. Estranhou, mas foi ver o que Anne queria primeiro.

A garota estava radiante, como se algo muito bom tivesse acontecido. Parou próxima da mesa dela, vendo-a tomar um café fumegante de uma caneca, escrito: 'Beije a Enfermeira'. Sorriu disso. Anne foi a primeira pessoa a recebê-la na Clínica há dois dias e até o presente momento, ela era a melhor pessoa que Alice conheceu naquela cidade. Ela não havia comentado sobre seu currículo ter várias cidades ao longo de tão poucos anos, não comentou sobre Alice não ser casada - ou ter namorado - com 29 anos e muito menos não comentou por ela ser acima do peso e não se importar com isso, como parecia ser uma obsessão de todas os médicos de sua idade. Anne era uma boa garota, e Alice estava notando que ela se animava com pequenas coisas.

Meu Lobo - DegustaçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora