Sarah passou quase todo o dia fora fazendo compras para a casa. Apesar do agradável tempo com Marie, ainda se sentia solitária. Jamais poderia compartilhar suas inseguranças e problemas conjugais com quem quer que fosse. Depois de muito ponderar, chegou à conclusão de que a única solução era continuar a ocupar o tempo para evitar pensar profundamente sobre seus sentimentos.
Havia muito trabalho a ser feito, e não só com os livros contábeis de David; sua casa também precisava de atenção. Passara quase toda a vida se preparando para ser a esposa de Thomas e não poderia abandonar aquela responsabilidade por um reles capricho. Sim, aquela angústia e a melancolia que a acometiam deveriam ser tratadas como um capricho tolo.
Sentia-se culpada pelo afastamento do marido; coagira-o e, pelo que parecia, Thomas não era um homem que suportava pressões. Precisaria mudar a abordagem, mas, antes de pensar na melhor maneira de agir, tinha que preservar os próprios sentimentos; era isso ou enlouqueceria. Sim, sentia-se à beira de um ataque de histeria. O que mudara em tão pouco tempo?
Quando a carruagem parou na entrada de Groove House, um lacaio a ajudou a descer e carregou seus embrulhos. Earnest, o mordomo, aguardava sua senhora com um porte elegante, mas, apesar de estar bem-vestido, algo a incomodou. Na gola do paletó havia um discreto cerzido.
— Lady Hervey. — Ele fez uma mesura polida.
— Boa noite, Earnest. Por gentileza, poderia pedir à Sra. Pattel que me encontre no escritório?
— Certamente, senhora.
Sarah seguiu para o escritório de Thomas, que estava vazio. Colocou os livros de David sobre uma pequena mesa redonda e caminhou pelo cômodo.
— Senhora — a governanta anunciou sua entrada.
— Pia! — Sarah se sentou, avaliando a vestimenta da funcionária. — Quero que providencie tecidos de qualidade para confeccionarmos uniformes para os criados. Quero o brasão dos Hervey em todos que trabalharão em Groove House.
— Perfeitamente, senhora.
— Precisamos que tudo seja agilizado. Pretendo enviar os cartões na próxima semana informando o dia em que receberemos visitas.
— Mais alguma coisa, senhora?
— Quem é o novo cozinheiro?
— Estou treinando uma cozinheira do jeito que a senhora gosta — respondeu orgulhosa.
— Precisamos de um chefe francês. — Sarah coçou o queixo. — Alguém de temperamento moderado e que permita minhas intervenções na cozinha.
— Se me permite, acho que um francês com essas características será impossível de encontrar, minha senhora.
— Não me incomodo se for uma mulher. — Piscou sorrindo. — Na verdade, a ideia de termos uma cozinheira francesa me agrada.
— Isso será mais fácil de encontrar, milady, e, certamente, vantajoso.
Sarah se levantou e caminhou pelo cômodo.
— Em breve vou precisar de uma nova camareira, de preferência alguém que não se arraste pela casa, que não faça objeções a banhos noturnos e que consiga ouvir; ou que não se finja de surda.
Pia fez uma reverência e se retirou. Sarah pensou em perguntar pelo marido, mas se conteve. Sentou junto à mesa de Thomas e verificou seus livros de contas. As anotações eram ainda mais desordenadas que as de David. Surpreendeu-se ao constatar que a herança que lorde Willian lhe antecipara o deixara satisfatoriamente rico e com muito potencial para investimentos. Perdeu a noção do tempo fazendo anotações e passando as contas a limpo.
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A Marquesa (Repostando)
Fiksi Sejarah"Uma história de época que traz à tona temas atuais como a "igualdade de gêneros"! Londres, século XIX. Em um universo dominado pelo gênero masculino, a mulher era um ser à margem, não tinha voz nem vez. A mocinha não é uma super-heroína e, como tod...