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São Petersburgo, 20/01/1905.

   Natasha era uma mulher pertencente a terceira camada da sociedade, ou seja, uma camponesa.
Seu marido havia falecido de causas naturais deixando sua esposa grávida da terceira gravidez. Durante os meses que se estendiam, Natasha sofria com sua gestação cada vez mais fragilizada; a mulher aos poucos preocupava-se mais e mais; o tempo passava, sua filha mais velha havia falecido por conta da gripe, sua filha do meio, já com 18 anos estava se preparando para participar da manifestação frente ao Palácio de inverno do Czar.
Durante dois dias o assunto mais falado na casa das senhoritas era a manifestação, uma revolta com tentativa de conscientizar o czar que o povo precisava de amparo, com impostos cada vez mais caros estava difícil manter as fazendas e, ocasionalmente cada vez menos era produzido.
Cansados e exaustos de superfaturar a coroa e ficarem com o que se dava aos porcos, esta pacata seria a tentativa mais "corrente" de conscientizar o impiedoso, segundo os líderes desse movimento.

Domingo, 22/01/1905.

Aquela manhã parecia uma como qualquer outra, Natasha e Veronika dividiam o último fatia do pão preto que haviam produzido antes da última coleta de impostos daquele mês. Por mais que a progenitora tentasse disfarçar era evidente seu desconforto em relação a sua gestação, Viktoria estava para nascer a qualquer instante, Veronika por mais que quisesse estar ao lado de sua mãe, seu desejo por justiça e igualdade era maior e como sua mãe não havia pedido sua presença durante aquela manhã, a jovem não viu motivos para estar com sua mãe naquele dia.

12:00 (meio dia; horário fictício)

Veronika havia deixado a fazenda de sua mãe fazia algumas horas, a manhã mal havia terminado; Natasha estava a limpar os poucos grãos que haviam lhes restado, a senhora Khrushchov não via a hora de sua filha nascer, a esperança que a revolta trouxesse alguma mudança pairava seus pensamentos, Natasha encontrava-sa perdia em devaneios, nua imaginação a levava a uma realidade onde suas filhas vivam em uma Rússia livre desta monarquia sem pudor, seus pensamentos foram interrompidos por uma forte pontada ao pé da barriga, a dor a fez cair de joelhos ao chão, por mais que gritasse por ajuda nada nem ninguém a ouvia, era óbvio o que estava acontecendo ali, Viktoria estava vindo ao mundo, em poucos instantes sua bolsa rompeu, a água de seu parto escorria entre suas coxas; Natasha estava desesperada, não sabia ao certo se sobreviveria ao parto sozinha, sua única opção foi sentar-se encostada a parede da pia de sua cozinha, dobrar suas pernas e fazer forças, quando mais dor sentia mais força fazia, seu interior aos poucos dilatava, lentamente viktoria dava seus primeiros "passos" ao mundo, seu parto fora o mais doloroso e arriscado que sua mãe já teve. Ouvir o choro da garota lhe foi seu maior alívio.

  Após recuperar-se do exaustivo parto Natasha lentamente levantou-se, apenas tirou os grãos de dentro da pia e lavou sua filha, Viktoria havia nascido pálida e miúda, porém tinha fôlego; para sua mãe já era o suficiente.
Distraída com a concepção de sua filha e acabou não percebendo que Veronika não havia retornado.
  Com o fim do dia e o cair da noite Natasha entrou em desespero, esperava que aquele hora sua filha já estaria em casa para conhecer sua irmã, entretanto a notícia correu rápido; o mensageiro avisava com seu sino irritante que os causadores da grande baderna nos portões do palácio foram mortos em um grande massacre.

Sete anos depois.

1912.

Viktoria já estava com seus sete anos, sua para preservar a infância da garota Natasha, sua mãe achou melhor criar a menina como filha única, e por não existirem registros fotográficos ou escolares de nenhuma de suas falecidas filhas não foi difícil esconder de Viktoria que o dia de seu nascimento fora o fatídico dia da morte de sua irmã.
Durante seus sete anos, Viktoria sempre ouvia sua mãe dizer que o czar era impiedoso, logo, não deveria contraria-lo, a pequena sem fazer ideia do que seria "O Czar" apenas concordava. Mesmo com o alto custo dos impostos a vida na fazenda era divertida, a garota desenvolvia suas habilidades com a agro-pecuária desde muito nova, com três anos já tinha um grande apreço pela natureza.

Cinco anos depois. (Implantação do governo de Lenin)

Em 1917, Viktoria já estava com seus 12 anos, era perceptível a mudança que seu país estava sofrendo, até mesmo para ela, que a todo instante perguntava a sua mãe o que estava acontecendo.
Durante a implantação da ditadura de Lenin o país precisou passar o uma estatização, ou seja, tudo agora era do estado e os lucros seriam distribuídos pelo mesmo, e isso gerava uma grande revolta na mãe de Viktoria, pois acreditava que por ter erdado de seus pais sua fazenda era sua por direito e nada nem ninguém além da morte seria capaz de tira-la dela.
E assim foi, na tarde do dia 06 de novembro daquele mesmo ano a mãe de Viktoria foi assassinada brutalmente enquanto a menina brincava com os bezerros recém nascidos; no momento em que a garota se distanciou de sua mãe os subordinados de Lenin chegaram a fazenda anunciando a ela que agora tudo ali pertencia ao estado e a mais ninguém, sua resistência ao que fora imposto fez com que a mãe da garota fosse assassinada ali mesmo, suas produções saqueadas e obviamente, agora órfã, Viktoria seria levada ao campo de concentração 37.
  Amedrontada e sem saber o que estava acontecendo ali, a garota penas  observava o caminho tomado pela carruagem dos soldados. Claramente, por não ter visto o corpo de sua mãe estirado ao chão acreditava que a mesma iria buscá-la ou estivesse a sua espera em seu destino final.
  Ao chegar no lugar, animada por acreditar que sua mãe lá estaria a menina desceu afobada da carroagem, mas ao olhar em volta, só existiam crianças ali, Viktoria estava de fato sozinha.
Encaminhada a uma fila onde dava para um grande dormitório, a única pergunta que a garota fazia era "Onde está minha mãe?", por vezes fora ignorada e por estas vezes ela insistiu na pergunta, até ser respondida " Sua mãe te abandonou garota! Siga a fila."
Ao ouvir aquelas palavras algo não lhe parecia certo, por que sua mãe a deixaria? Todavia, a mesma não estava ali para esclarecer  suas dúvidas.
Ao chegarem no dormitório, a jovem menina fora encaminha a uma fileira separada, por não saber o que havia acontecido a sua progenitora não poderia ir contra o sistema ali implantado nem mesmo se revoltar, isso era uma vantagem que viktoria teria das outras crianças.
  Durante aquele fim de tarde todas ali foram devidamente cuidadas, e as 19:00 (dezenove horas; horário fictício) todas já estavam dormindo, ou postas em seus sacos de dormir.
Não era lá o mais confortável para repousar seu corpo, porém era muito melhor do que uma esteira de palha e cobertores surrados; pela primeira vez seu corpo foi aquecido pelo calor que não era de sua mãe.
 
  Mesmo que estivesse ali meio a tantas outras crianças, algo não calava em sua mente, sua mãe jamais a deixaria, Natasha sempre fora tão presente em sua vida, não era capaz de a deixar sozinha por um mínimo instante, seus pensamentos a faziam viajar para um distante rumo, seus devaneios acabaram em prantos que podiam ser ouvidos nos quadro cantos do grande galpão de metal. 

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