Carta

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"Oi, como você está? Tudo bem?  Espero que sim.

Bom, desde já peço desculpas por não poder estar ao seu lado quando acordar. Também espero que algum dia você possa me perdoar.

Nunca escrevi uma carta desse tipo, mas acho que devo começar desde o princípio.

Como você sabe, eu perdi tudo, para ganhar um tudo e depois dar tudo de mim.

Meu tudo era eu, antes do acidente, excêntrico, alegre, cheio de si. Ah, mas como eu me amava.

Tinha muitos amigos, um bom emprego e um ótimo relacionamento com meus pais.

Porém eu ainda era vazio, faltava alguma coisa, faltava algo ou alguém.

Eu podia ser tudo aquilo, mas era estranho - pelo menos eu achava. Não conseguia me manter em um relacionamento por muito tempo, o mais duradouro foi de 3 meses, ainda me lembro o nome dela, Daugun Kayra, mulher bonita, confiante e incrível. Porém eu não conseguia me sentir confortável, estava insatisfeito, faltava alguma coisa nela ou em mim.

E eu descobri o que faltava.

Foi em uma festa, bebi demais, nem lembro se cheguei a usar algum tipo de droga, só lembro dos olhos dele, fortes e sedutores que se direcionavam especialmente pra mim. Direto, chegou em mim e pouco tempo depois fomos para um lugar mais reservado. Descobri gostar de homens, descobri o porquê dos meus relacionamentos darem tão errado.

Eu fui tolo.

Tolo de pensar que por ser o filho de ouro, poderia contar isso ao meu pai.

Eu estava eufórico naquele dia, iria dizer finalmente, depois de quase um ano me descobrindo, contar aos meus pais quem eu realmente sou.

"Pai, queria lhe contar algo" comecei assim, aparentemente tranquilo, mas com o coração a mil.

"Diga." Disse simplório, estava concentrado no jogo que se passava na TV, era final de campeonato, seu time na final, ocasião importante.

Eu respirei fundo, preenchi todo meu pulmão até não sobrar espaço e me afogar com o próprio ar, fazendo eu tossir, chamando a atenção do meu pai para mim.

"Está bem, garotão?"

Fiz que sim com a cabeça e me aproximei, sentei ao seu lado no sofá e aos poucos fui fazendo um pequeno discurso informativo sobre respeito e compreensão com as diversidades do mundo atual, até eu achar que o momento estava apropriado para dizer aquelas palavras.

"Pai, eu sou gay." Eu olhei para seus sapatos e sorri, estava aliviado.

Não deveria ter olhado para os sapatos.

Assim que ergui meu rosto recebi uma tapa forte na bochecha, e depois disso não parou mais.

Fui atacado por uma tempestade de fúria e ódio, xingamentos e agressões.

Não entrarei em detalhes, não é necessário, já passou e
estou bem agora.

Não nego que quis morrer ao ouvir aquelas frases direcionadas a mim, desejei tanto desaparecer que assim que consegui uma brecha sai correndo, sem rumo.

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⏰ Última atualização: Jul 17, 2022 ⏰

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