Noite de domingo. Casal no quarto, a mulher romântica,torcendo por uma linda noite de amor e sexo. O marido, prático e burocrata, não atende às expectativas da parceira.
NESSA ALTURA do jogo, deveria haver mais mãos se tocando, bocas se procurando, algo mais poético e doce do que o simples encaixe de pernas e encaixe de corpos. Quem sabe um abraço bem gostoso, um sussurro indecente? Um deslizar de mãos pelos cabelos, querendo dizer "estou fazendo e gostando porque é com você", talvez revertesse o placar, fazendo a partida terminar em delicioso empate.
Mas ... Seria esperar demais do homem que se chama Tito; daqi há alguns minutos, como sempre, ele vai contrair o corpo, resmungar um "Tá indo? Tá gostando?" e finalmente relaxar, deixando a mulher se chama Edna inundada de sêmen vazia de todo o resto.
A partida prossegue com a tevê ligada, reprisando os gols mais bonitos e as comemorações mais inspiradas dos artilheiros do Campeonato Brasileiro. Safadamente, Edna imagina aquelas pernas mágicas, que fazem a bola chegar às redes, não há lugar para as pernas de Tito, domésticas e metódicas pernas. Mas nem assim uma coisa acontece. Nada acontece. Não há fantasia que funcione diante de tanta burocracia.
Com vontade de rir (para não chorar) ela pensa no leito do casal como uma mesa de escritório, onde cumpre uma tarefa para manter o emprego. Precisa agradar ao 'patrão' porque, afinal, aquela era a 'carreira' com a qual sempre sonhou. Se preparou para ser 'esposa', jogando charme na paquera, cinema, no namoro no portão.
Mostrou que saberia cuidar bem do 'escritório' quando preparou, sozinha, o jantar de noivado. Com elegância irreparável, vestiu primeiro o vestido de noiva branco, e depois a camisola negra da primeira noite.
Agrada ao 'patrão' porque a 'firma' cresceu. No quarto ao lado dormem Júnior e Jéssica, prova do bem-sucedido empreendimento, que tem carro na garagem, plano de saúde em dia e uma 'sede' bem cuidada por ela, funcionária padrão que parou no tempo. Não fez cursos, mal sabe mandar e-mails, esqueceu o inglês que aprendeu no segundo grau.
Mesmo assim, ocupa luga e honra nas reuniões da 'empresa', na cabeceira da mesa, presidindo o almoço em família, onde o prato de destaque é a sua espetacular lasanha. No resto do dia, funcionária de folga, mas exemplar, revisa cadernos e uniformes dos filhos, enquanto o marido l curte o futebol na tevê ou no estádio com os amigos, afinal é domingo.
Chegou a hora. Tito relaxa, ela sente o sêmen a inundá-la, solta um um gemido protocolar e ganha um protocolar beijinho no rosto.
Um zero. Termina a partida. No vídeo azulado, o artilheiro de pernas grossas comemora. Ao lado de Edna, o 'patrão' "de pernas não tão grossas resmunga alguma coisa que soa como boa noite e vira para o lado.
Em questão de minutos, dorme a sono solto. Edna toma um banho apressado, veste a camisola vermelha, comprada com ótimas intenções, senta-se no sofá da sala e prepara-se para ser inundada outra vez. No colo, o pote de sorvete gigante, ("três deliciosos sabores, a magia das frutas, a energia do açúcar, a sedução do chocolate") promete 15 minutos de puro êxtase ...
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