Tomates verdes fritos

16 2 0
                                    



"Sessão número três, paciente quarenta e nove; Senhor Rodrigo Sacário D'mont. Eu sou a Doutora Madalena Flores e hoje é dia oito de agosto de 2004, são cinco e meia da tarde e esta é a única consulta do dia."

- Podemos iniciar com um tema sortido, Sr D'mont?

- Sim, acredito que queira saber mais um pouco sobre minha primeira vítima.

- É a cerca disto que deseja tratar hoje? – Ela pescou uma pasta ao seu lado e retirou um de seus muitos arquivos. – Na semana passada conversamos bastante sobre seus pais, acredito que já encerramos este assunto. – Houve uma pausa silenciosa entre nós dois, todavia prosseguindo ela disse um pouco receosa. – Você poderia me dizer quantas foram?

- Não. Vamos conversar sobre minha primeira vítima.

"Era uma manha fria, daquelas que nos pegam de surpresa no meio do outono, falo daquelas manhãs que você as subestimam saindo de casa com sua camisa velha e surrada."

Era uma das poucas vezes que eu saía de casa para fumar e uma das muitas em que me sentia perseguido pelas pessoas ao meu redor.

"Ela se rendeu depois de um tempo, o suor de se debater em meus braços cobria sua face. Deu-me tempo de faze-la dormir num enforcão. Depois eu peguei minha faca e você sabe, fiz um corte sucinto em sua jugular. O sangue molhava minhas mãos e eu me abrigava em seu calor, que eu posso descrever como... morno."

Eu percebia que a doutora Madalena se impressionava com minhas palavras, porém ela sempre conseguia disfarçar enquanto anotava em sua prancheta alguma coisa de que eu não fazia questão de saber.

Algo dentro de mim queria revelar cada segredo sórdido que guardava dentro de minha mente, mas havia um sentimento de retenção que me fazia medir as palavras dispostas.

- O que te atraiu nela?

Droga, eu não sabia se devia dizer ou não. Conscientemente sabia que aquilo não era uma sessão de desabafo e sim uma entrevista policial privada e delicada. Decidi perguntar sobre discrição e ela me confortava em dizer que nenhuma palavra seria compartilhada com os policiais ou a justiça.

- Sabe... Eu nunca fiz distinção de classe, cor ou gênero. Bastava um olhar profundo ou alguma coisa que me faria meditar sobre a pessoa que estava lá, disposto em libertar esta alma. – Dei uma golada no copo d'água à minha frente e continuei. – Esta vítima em especifico me atraiu pelo jeito de agir. Parecia que sofria muito, como se a vida não fizesse sentido e eu quis dar sentido à ela.

"Quando a confrontei, dialoguei bastante. Como se fosse uma entrevista superficial entre dois indivíduos desconhecidos e ela, por incrível que pareça, desabafou."

- Você em algum momento pensou em desistir, deixa-la e seguir seu caminho?

- Não...

"Não a capturei de imediato. Preferi manter alguma conexão, pois não queria estragar nenhuma família e sim libertar ela da vida e suas adversidades tantas vezes dolorosa."

- Olá, está indo ao terminal também. – Disse-me ela. Seu nome era Cássia e sua postura era confiante, porém algo em seus olhos dizia que não, seus olhos imploravam por socorro.

- Oi. Estou. – É claro que não estava, porém precisava convencê-la de minha honestidade.

Passamos longos golpes de tempo conversando até que consegui convence-la a ir comigo para casa, com a desculpa de que lá poderíamos beber e conversar. Ela dizia-me que iria ir ao encontro de uma amiga, mas que não haveria grandes problemas em faltar nesta ocasião.

- Rodrigo, você tinha noção das consequências que viria com isto?

- Eu tinha sim. Mas quando você toma uma decisão fundada em pensamentos sólidos, nada mais faz sentido, pois nada se acrescenta ao que você "maquinou" em pensamentos.

- Então, admite que a Cássia fora fadada à morte desde o primeiro momento?

- Sim. Soube que iria mata-la desde o momento em que a conheci.

- Eu me sinto perdida, estou em busca de um sentido na vida, sabe? – Disse-me Cássia.

-Sei. A humanidade procura sentido na vida desde que a morte se instalou em nosso meio. – Lembro-me de demonstrar interesse romântico toda vez que ousava a responder suas perguntas. – Quero encontrar um sentido em minha existência também.

Quando comecei a contar sobre Cássia, pude sentir o desconforto na psiquiatra em ouvir todas as palavras proferidas. 

Você leu todos os capítulos publicados.

⏰ Última atualização: Aug 14, 2019 ⏰

Adicione esta história à sua Biblioteca e seja notificado quando novos capítulos chegarem!

Pecados ÍntimosOnde histórias criam vida. Descubra agora