A cortina

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O mordomo tinha uma feição cadavérica e vestia um manto negro. Ele a levou até uma porta de madeira. Antes de abri-la, ele se postou à frente dela, bloqueando a passagem.

"Tem certeza que deseja prosseguir, senhora?", disse o mordomo.

"Tenho." Ela sentiu um calafrio ao dizer a palavra.

"Está com o objeto da pessoa com você?" Lis confirmou com a cabeça. "Muito bem. Espero que consiga o que procura."

Ela engoliu em seco, mas mesmo assim disse: "Obrigada."

O mordomo se moveu para o lado e abriu a porta.

"Se quiser um conselho, senhora", ele disse. "Seja breve."

Lis entrou sem olhar para os lados e sentiu a porta se fechar às suas costas. Havia um tapete no meio do salão. Várias colunas dos dois lados guiavam o caminho até as escadas e acima dos degraus a criatura se erguia do piso do altar. Várias cabeças de mulheres flutuavam sem corpo, como se cordas invisíveis as amarrassem no ar formando um arco, uma ao lado da outra, enquanto suas madeixas desciam até o chão como cortinas de um teatro.

Jamais imaginara ver aquilo em toda a sua vida. Não era isso que lhe vinha à cabeça quando lhe contavam sobre a vidente, mas como poderiam tê-la descrito? Ela achou aquilo belo. As faces mais velhas, no alto, observando-a com imponência, enquanto as mais jovens, abaixo, a olhavam com malícia e sussurravam umas com as outras, soltando risadas intermináveis. Eram belas, sim. Mas belas como animais selvagens. O tipo de coisa que se aprecia de longe, ou se dá as costas e foge antes que seja tarde demais.

"Está com medo, querida?", disse o rosto de uma mulher ruiva, com sua voz suave. Seu rosto era quase que todo branco, repleto de maquiagem. A única coisa que se destacava eram seus lábios, tão vermelhos que pareciam ter sido pintados com sangue. "Não tenha medo. Pode se aproximar. Sim. Isso. Me chamo Annabel, querida. Como se chama?"

"Lis, senhora."

Houve um "Oh" cheio de pena vindo de um rosto idêntico ao de Annabel. Lis reparou que essa face observava suas vestes negras, seu véu e a aliança em sua mão.

"Pobre criatura", disse o rosto da mulher. E Lis pôde jurar que uma lágrima caíra do olho esquerdo dela. "Pobre criatura. A morte é tão triste."

"Cale-se, Selina", Annabel bramiu para a irmã. Então pôs um sorriso no rosto e continuou: "Tenho certeza de que nossa visita não quer ficar ouvindo seus lamentos."

O salão fez silêncio quando o rosto de uma velha pigarreou. Até mesmo as risadas pararam. Seu rosto era frágil, porém imponente, as rugas lhe davam um aspecto de desgaste e sua pele parecia se esfarelar. Mas o que mais chamava a atenção eram seus olhos. O branco, o vazio.

"Retire o véu, criança", a Velha disse, com uma voz rouca, quase um crocitar. "Retire o véu. Não há necessidade de cobrir o rosto aqui."

Ela fez como a Velha disse. Seu rosto era jovem e forte, seu maxilar era delineado e os lábios voluptuosos. Tinha olhos castanhos — tão claros quanto mel — e seus cabelos negros descansavam sobre o ombro direito em uma trança. As faces jovens que estavam mais abaixo voltaram com os risinhos — Hihihihi —, seus olhares ainda mais maliciosos.

A Velha veio em sua direção, os cabelos a guiavam como uma cobra deslizando no ar, e só parou a centímetros de seu rosto. Lis sentiu a respiração fria lhe tocar e os olhos vazios atravessarem sua alma, suas vergonhas, seus pecados. Ela não tinha noção do que lhe aconteceria. Suas mãos tremeram quando o rosto se aproximou ainda mais. Era como se seu espaço tivesse sido roubado. O rosto girava e girava, analisando cada parte, cada sinal.

A Cortina (Conto)Onde histórias criam vida. Descubra agora