Capítulo 4 - O rapaz da taverna

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Kile passara quase a madrugada e o dia inteiros correndo no lombo de Cenoura. Gary sobrevoava o local, vigiando para ver se não havia ninguém próximo que o estivesse procurando.

Só pararam por dez minutos para fazer uma pequena refeição com alguns cogumelos inofensivos que Kile encontrara na base de uma árvore. Logo em seguida, eles retomaram a viagem.

Ao final da tarde, nem Kile, nem Cenoura, nem Gary aguentavam mais continuar na estrada, e Kile, por fim, resolveu parar, se aproximando de um pequeno vilarejo em meio à grande área de campos, florestas e bosques que havia percorrido.

Já anoitecia quando os três viajantes – ou fugitivos, como preferir – entraram na pequena vila, iluminada apenas pelas luzes que emanavam das janelas das casas.

Bem na entrada do vilarejo havia uma pequena taverna, e Kile achou-a adequada para seu descanso e o de seus companheiros. Levou Cenoura até um bebedouro de cavalos que ficava em frente a um corrimão para que fossem amarradas as rédeas dos animais, e acariciou sua crina enquanto o animal bebia a água, exasperado, tamanho seu cansaço.

– Me desculpe, rapaz... – falou. – A partir de agora vamos reduzir o ritmo.

Kile trouxera consigo também um mapa. De acordo com as suas observações, eles deveriam estar em Hellington Transgrald.

Um forte estrondo de pratos caindo no chão e se quebrando ecoou de dentro da taverna, ao mesmo tempo em que vozes abafadas se elevaram, o tom de irritação:

– Seu canalha! Volte aqui!

Kile percebeu que a taverna se agitava por dentro, e resolveu entrar para conferir o que acontecia. Porém, nem chegara ainda ao pé da porta, ela foi aberta violentamente e um corpo foi jogado para fora da mesma.

A criatura jogada bateu com tudo a cara na lama, se afundando ainda mais nela, enquanto o dono da voz aparecia, gritando nervosamente e passando por Kile sem nem mesmo percebê-lo.

– SEU INDECENTE! CÃO VIRA-LATA! GATO FUGIDIO! REPITA: VOCÊ DORMIU COM A MINHA MULHER?!

Ao que o rapaz não respondeu, ainda estirado no chão, o homem foi até ele e chutou-lhe a barriga. Kile deduziu que aquele era o próprio taverneiro. Usava um avental longo e sujo e tinha a pele oleosa e vermelha como a de quem cozinha e bebe o dia inteiro. O cavaleiro observou-o chutar ainda uma outra vez a barriga do jovem antes que este tivesse alguma reação.

– Eu... – Começou o rapaz, levantando vagarosamente o corpo, com dificuldade, até se encontrar frente a frente com o taverneiro. – Dormi.

Sinceramente, Kile não esperava uma resposta afirmativa para a pergunta. O rosto do taverneiro passou de vermelho a roxo, e ele deu um gigantesco soco no rosto do jovem.

– SEU CRETINO! VOCÊ DORMIU COM A MINHA MULHER... DEPOIS DE FICAR NOIVO DA MINHA FILHA!

O rapazola estava quase perdendo a consciência. Via-se que estava deveras bêbado.

– EU VOU TE MATAR, VAGABUNDO! – Anunciou o marido traído, tirando do bolso de seu avental um gigantesco facão de cortar carne.

Kile sabia que a ira do homem tinha motivo para existir – e um bom motivo. No entanto, como cavaleiro do rei, um instituidor da justiça, Kile não via na morte justiça alguma – apesar de seu pensamento em relação à pena de morte ser considerado atrasado e infantil para a época.

O Cavaleiro e a PrincesaWhere stories live. Discover now