Capítulo 09

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Miguel Estevão encarava Jacó ainda sem acreditar no que acabara de ouvir, sentia a garganta seca, em silencio ele desviou o olhar para longe encarando qualquer ponto a sua frente. Desolação era a palavra certa, que tipo de pai ousa destruir a reputação da própria filha para alimentar um ódio doentio e sem causa? Ulisses Valverde estava perdendo a noção das coisas, ou já havia perdido ha muito tempo. E todos sem exceção haviam acreditado no teatrinho capenga que Ulisses Valverde havia encenado, parecia uma brincadeira de muito mau gosto.

_Eu posso dizer a eles o porquê dela ter vindo aqui, eu estou de prova!_ Dalva estava revoltada.

_Para que? Se bem sabemos que toda essa gente se finge de songa!_ Estevão estava espumando aos poucos o seu ódio, era algo admirável como ele conseguia maquiar a intensidade do que sentia. Jacó suspirou, estavam de  pés e mãos atadas.

_Se dizer isso a eles, vão pensar que é apenas uma cúmplice de Estevão, assim como pensam que Marlene é cúmplice de Ana, por mais odioso que isso possa parecer, eles realmente não tem exatamente como acreditar que não seja verdade, essas pessoas ainda tem a cabeça de mil anos atrás, para eles é impossível que um pai faça o que Ulisses fez se não houver verdade._ Jacó estava certo, Ulisses os convencera deixando neles a impressão fulminante da veemência de seus atos, não iriam supor, mesmo sendo perfeitamente aceitável em se tratando de Ulisses Valverde, que ele jogara o nome da filha na lama apenas para atingir Miguel Estevão, sim por que era como um sedutor de mocinhas inocentes que se aproveitava disso para manipula-las a seu bel prazer é que Estevão se tornara, da noite para o dia, conhecido em todo o Vale do pampa, Ana Rosicler era difamada de porta em porta onde seu nome era citado com um cortejo desfilado de apelidos atribuídos a pessoas baixas, era a prostituta vulgar e carnal e Ulisses Valverde era um pobre homem sofrido tendo em vista ter uma filha dessa estirpe e uma mulher que acobertava os atos desonrosos da filha, até sobre o futuro da pobre Amélia iniciou-se uma sombria especulação, a semente não cai muito longe do pé, diziam e outros complementavam dizendo que se o Valverde não tivesse mão firme na criação da caçula, ela seguiria os mesmos passos da irmã, da noite para o dia Ana Rosicler de Santa havia se transformado na prostituta mais bestial que todo aquele recanto já conhecera.

_E como esta Ana?_ indagou Estevão depois de um tempo calado e reflexivo.

_Eu só sei o que Raimundo disse.

_Eu vou ver como ela esta._ Dalva disse com o semblante pesaroso, Estevão concordou em silencio.

_E eu vou com você¬_ Jacó assentiu entendendo a necessidade que compungia o amigo_ não é bom que Marcos ande por ai sozinho, ele pode se tornar uma presa fácil desse lunático._ Marcos estava na casa dos Bonifacio a alguns dias_ Ele já sabe?

_À uma hora dessas a notícia já deve ter se espalhado._ Jacó sabia como fofocas corriam a largo por ali, a vida do irmão era um dos folhetins mais amados pelas pessoas do lugar.

_Não acha melhor ficar em casa, senhor Estevão?_ Dalva temia que o assassino de quem Ana falara ainda estivesse por perto.

_Se as coisas continuarem como estão quem terá medo de sair de casa será ele.

Ana Valverde não existia mais, o que existia era uma moça chamada Ana Rosicler, por que Ana Valverde havia morrido. Isso Ulisses Valverde disse naquela fria e escura manhã de maio, a manhã depois da tragédia, seus olhos vermelhos denotavam dor, havia passado a noite em claro, Ana Valverde nunca fora sua filha predileta, talvez na verdade não tivesse nenhuma filha predileta, Mariana era diferente apenas isso e ainda assim era mulher, uma decepção, três filhas, nenhum filho, sua mísera vida se resumia a decepções. Quando a filha mais velha se casara há alguns anos, havia erguido as mãos para os céus e dado graças, uma mulher a menos dentro de casa e a esperança de um neto para alegrar a família, mas Marina Valverde tinha o sangue ruim dos Valverdes, reconhecia que os Valverde eram ruins, e não gerará nenhum filho, nem filha, e ela parecia não se importar, o que pelo menos lhe livrava de tê-la que consolar. Cleber Tobias, o genro, bom homem, de boa família, todos sabiam que mantinha outra família, uma clandestina, uma com quem podia ter tudo àquilo que não tinha com Mariana Valverde, uma mulher e dois filhos, a família que lhe dava alegrias, Mariana era a mulher que ele apresentava para a alta sociedade, uma mulher de vitrine, Ulisses Valverde sentia a decepção correr feito veneno pelas suas veias, a única filha casada era uma figueira estéril, traída publicamente, uma boneca de porcelana, uma mulher de enfeite. Para ser sincero nunca havia depositado esperanças em Ana Valverde, Ana era como bolacha de água e sal, insonsa, sem nenhum atrativo que pudesse ser admirado, uma mulherzinha de personalidade inexistente, manipulável como uma boneca de pano, nunca fora notada nas festas, nunca despertara o mínimo interesse de ninguém, nem os próprios tios se lembravam de sua existência e sabia que Marlene também não lhe dedicava nenhum grande afeto, era apenas uma garota errada, não a odiava apenas não se importava, ela era a filha que não lhe dava motivos para nada, nem para sorrir, nem para chorar, ainda assim havia se empenhado em prepara-la para a alta sociedade, quem sabe? Seu pai costumava dizer que eram das maiores desgraças que se pode surgir as maiores bem-aventuranças, mas também jamais havia cogitado a possibilidade de vê-la se envolver em uma conspiração contra ele, seu próprio pai, mas enfim Ana Valverde havia sido útil em alguma coisa, não sentia a tristeza que encenava, a única coisa que sentia era um vazio no peito, uma sensação suspensa. Eu matei Ana Valverde ele pensou matei por uma boa causa.

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