A água lá fora caía de forma impiedosa, abafando o choro sôfrego daquele que nadava contra a própria correnteza sem fôlego com os pulmões dilacerados, sangrando em agonia pela falta de ar e com o seu rosto molhado em lágrimas debaixo de seus travesseiros. A dor lhe socava o estômago, lembrando-o que não se pode fugir sempre da cruciante realidade, rasgando-lhe as entranhas e fazendo o dono do par de olhos felinos gritar e se contorcer em absoluto desespero, encolhido no peito, e envolvido pelos braços, de seu gentil e amado amante que em silêncio explorava, com seus dedos finos, a floresta loira e inquieta dos fios sedosos repousados em seu peito, tão laranja e quente quanto os raios solares, porém tão sensível como a derme canceriana de quem está num encontro de anos com a morte.
Akaashi se perguntava de onde vinha os sais dos oceanos se os rios eram sempre tão doces e gentis, mas depois de se banhar nas águas cristalinas de Kenma e ficar tão próximo de sua nascente, percebeu que suas águas se salgaram devido à todas as lágrimas do choro baixo que o gato dócil emite toda noite, com seus lábios rachados segurando dentro de si a dúvida que serpenteava sua mente desde o momento em que percebeu que havia algo diferente; por que o mundo não lhe acolhia com um sorriso nos lábios e um abraço quente como fizera com tanto outros à sua volta? Queria que o pano apertado em sua caixa torácica fosse capaz de suportar a revolta de suas águas e que aguentasse mais uma vez a tormenta durante aquela madrugada estrelada.
A coruja observava com atenção o filhote, seus olhos cor de céu, semicerrados, procuravam algum sinal de abertura, algo que pudesse usar para confortar seu namorado, mas as palavras não pareciam fazer sentido, não existia uma fórmula especial para ser aplicada, nada havia em seu alcance para ser usado em um momento tão delicado, além de abrigá-lo em sua humilde morada e lhe servir uma xícara de chá quente e sem açúcar das pétalas do crisântemo vermelho de seu jardim, sua cor favorita, a mesma cor que transbordava do corpo ressentido em seus amparos, o motivo pelo qual Kenma estava tão perturbado.
— Fica. — Um sussurro falhado extinguiu o silêncio entre os dois. Kozume, com o pouco de força que tinha, agarrou-se na camisa do pijama de seu companheiro ao sentir uma corrente de ar fria passar pelo seu corpo miúdo quando o outro tentou se levantar. — Você precisa de remédios. — Protestou diante da cena que partia seu coração em pedaços. — Eu preciso de você, Keiji. — E foi o suficiente para Akaashi ouvir os cacos restantes de sua estrutura caindo ao chão, abraçou com força seu mundo, desejando que aquele abraço curasse tudo, mas ele sabia que não havia remédios para curar a dor que Kenma sentia, não existia nenhuma composição química barata que colocasse fim aquilo, fora a aquiescência interna da rosa ferida; agora um cravo em colapso.
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A fluidez do rio de suas veias
FanfictionAté mesmo a água do mais calmo dos rios pode tornar-se perigosa em uma noite de tempestade.