Talvez Quatro Seja o Número da Sorte

" Ao cair da noite, tudo se vai, menos nossas ações."

Assim que Alice e Nicolas sumiram com o inspetor do patio, as vozes aumentaram com perguntas e afirmações, que com certeza eram falsas. Ninguém a conhecia, acabou de chegar na escola, mas eu e as meninas tínhamos uma certeza apenas.

– Essa Alice é louca! – Lorena disse empolgada. – Que soco incrível! – Ela ainda olhava o caminho que eles fizeram.

– Ela ta com grandes problemas. – Brenda disse, voltando a mesa para pegar suas coisas. – O diretor Marcelo vai acabar com ela.

– Um minuto de silêncio a garota que deu um soco épico no Nicolas. – Lorena abaixou a cabeça, mas em dois segundos levantou rindo.

– Eh… Só sei de uma coisa. – As meninas cessaram as risadas e me olharam com atenção. – Essa garota é muito foda.

Eu olhei para as duas, que riram muito alto, pois é muito estranho eu falar palavrão. Não pude evitar, ri também. Talvez Alice seja a tal pessoa que tenho esperado pra animar minha vida na escola, ou talvez seja só mais uma garota problema, ou os dois. A sensação de que meu ano iria ser muito agitado ainda estava comigo, cutucando minha cabeça e me deixando ansiosa para algo que ainda nem aconteceu, e que talvez nunca aconteça. Balanço a cabeça, tentando afasta-lo, falhando miseravelmente.

– Kamilly! – Brenda grita meu nome, parece que esta me chamando a um tempo. – Vamos, o sinal já bateu.

– Ah… Claro, vamos – Pego minhas coisas e me levanto.

Na sala, os sussuros eram bem altos e todos eram sobre o mesmo assunto: Alice e seu soco. Pode parecer estranho tudo isso por apenas uma briga, mas o fato de alguém ter enfrentado um do grupinho do Christian, é algo que não se vê aqui, nunca. Principalmente se esse alguém era uma garota novata.

– … Você viu como a boca do Nicolas tava sangrando?… – Kamilly ouviu um garoto de cabelo verde dizer.

– … É cara, eu devia ter gravado! Imagina só as views no… – Ele não pode terminar, pois o diretor entrou com Alice e Nicolas, que tinha um saco de gelo pressionado contra o corte.

O diretor se vira ao professor e sussurra algo em seu ouvido, o professor apenas balança a cabeça e concorda. Ele se vira, agora, para Nicolas e Alice, que estão a quase meio metro longe do outro. Alice o lança um olhar feroz quando percebe que ele a olha com ódio, pode parecer exagero, mas tenho quase certeza que vi fogo sair dos olhos deles. O diretor fala pouca coisa, mas parece super irritado, como sempre.

– Brenda disse que ele falou que não quer mais esse tipo de comportamento vindo deles, e que, mesmo Alice sendo aluna nova, ele deve lembrar que ela esta oficialmente no Livro. –Lorena leu a mensagem que Brenda mandou, já que ela se sentou na frente assim que o diretor entrou.

O Livro, como todos chamam, é uma longa lista que tem os nomes de todos os alunos que fizeram "delitos na escola". Uma vez lá, sempre lá. Mesmo você mudando. O diretor tem mania de dizer que: "Na polícia, sua ficha é suja para sempre, não sera diferente aqui."
Já disse que todos o odiamos?

– É, agora ela ta ferrada. – Disse em tom baixo, Lorena me olhou surpresa e se ajeitou na cadeira.

– Dois palavrões em um dia, quem é você?

– Cala a boca. – Empurro ela de leve, que ri e se vira para frente.

O diretor para de falar com eles, que apenas balançam a cabeça com desdém. Os dois se retiram e foram para os seus lugares, sem se olharem por um momento, o diretor deu bom dia e se retirou também. Assim que Alice senta, Lorena pula da cadeira e Brenda vem correndo saber por mais detalhes de tudo.

– O que ele disse? – Brende disse se aproximando da gente. – Você foi mesmo pro livro?

– Você foi expulsa? – Nessa hora, deu um beliscão em Lorena por ser tão insensível.

– Mesmo que não tenha sido sua intensão, Alice, obrigada por me defender. – Disse um pouco envergonhada. Ela sorri e coloca a mão no meu ombro, carinhosamente.

– Primeiro: Eu ouvi do que ele te chamou, acredite, ele foi longe demais, merecia aquele soco e, além do mais… – Um sorriso malicioso surge em seu rosto e um brilho de vitoria aparece em seus olhos – Eu tava louca pra bater em alguém.– Ela fala de forma irônica e orgulhosa. – Segundo – Ela olha para Brenda e Lorena, que escutavam tudo cuidadosamente – Só as chatices de sempre: Vocês erraram, não quero ver mais isso… Blá Blá Blá. E não, eu não fui expulsa. E terceiro, o que é essa merda de Livro?!

Seu jeito de dizer nos fez rir, o sotaque era realmente forte, mas não conseguimos dizer nada, pois o professor nos manda voltar pro lugar. Mas antes de irmos, Alice nos puxa.

– Vamos a algum lugar depois da aula?

– Pra que? – Pergunto.

– E precisamos de motivos pra sair? – Brenda ironiza, com animo na voz. – Claro, vamos ao Belle's. É uma lanchonete, um pouco longe, mas da pra ir a pé.

– Ótimo. Topam? – Alice olha para mim e Lorena.

A gente se encara e estranha o convite, é apenas o Belle's e, mesmo a gente ter gostado dela, ela é alguém desconhecido ainda para nós. Talvez esteja apenas tentando se enturmar conosco, não tinha nada de errado nisso. Dou um suspiro e balanço a cabeça concordando, Lorena faz o mesmo, parecendo mais calma agora que sabe que concordei.

Voltamos ao nossos lugares e as aulas passam devagar. O evento da briga passa e repassa na minha cabeça, o sentimento de vingança é bom e continua aqui dentro, porém, o desejo por mais apenas aumenta a cada vez que olho para Nicolas e seu corte. E se ele não fosse o único a se machucar… Talvez, só talvez. No fim daquela aula, mal tinha entendido a matéria, mas entendi outra coisa: Alice era a minha chance. Chance de ter coragem igual ela, de fazer alguma coisa contra aqueles que sempre me machucaram, chance de faze-los pagar por tudo.

Mas eu teria realmente a coragem de tomar essa decisão?