Que merda é essa, Amélia?

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   Todo equilíbrio que mantive durante todos esses dias se transformou irá. Suas palavras trouxeram um gosto amargo a minha boca. Eu não iria deixar passar dessa vez.

- Então, não ia quebrar minha cara? – Ela gritou fazendo com que uma rodinha se formasse em nossa volta. Ninguém que me conhecesse acreditava que eu fosse capaz de bater nela, e por isso só estavam observando nós duas com calma.

Depois do que ela disso fui para cima dela e dei um chute em sua barriga. Ela caiu no chão parecendo estar sem ar, não estava acreditando que eu realmente iria para cima, igual aos outros, então foi pega desprevenida. Até então ela não havia revidado, mas quando tentou, não teve sucesso. Durante minha infância meu pai me fez frequentar aulas de muay-thay, eu sabia me defender quando precisava.

Todos que não nos conheciam gritavam a nossa volta, instigando ainda mais a briga. Só fui parada quando senti um braço musculoso me agarrar por trás e me tirar com dificuldade de perto dela. Ao olhar para as mãos que me seguravam reconheci as tatuagens, era Gustav.

- Me solta! – Gritei para ele.

- Não vou, olha a merda que você fez por causa de uma provocação idiota! – E o que ele me disse me fez parar de lutar para sair de seus braços e ficar séria.

- Isso chega a ser engraçado de ouvir quando seus pais estão vivos, quando você chega em casa e eles estão lá em paz. Mas quando não fazem nem seis meses que você perdeu os dois, posso te dizer com toda certeza que não tem. – Falei de maneira fria e ele se calou. Como se começasse a entender meu lado.

- Amélia, eu não sabia – Sabrina disse parecendo se arrepender do que havia dito, Eric a segurava de lado. Ela não tinha nenhum arranhão, não bati direito.

- Eu sei. Sabe porquê? Porque você não me deu nem ao menos uma chance de mostrar quem eu era. Você preferiu me atacar e me fazer sentir um lixo todas as vezes que entrava pela porta do bar ou quando eu estava com seus amigos! – Cuspi as palavras como um desabafo por essa semana.

- Deixa que eu cuido da Sabrina – Eric falou quando Gustav me largou e foi tentar ajudar a amiga.

- Vem vamos sair daqui. – Gustav segurou meus ombros de maneira acolhedora e em seguida minha mão, não entendi esse gesto, mas mesmo assim o segui. Estava aérea o suficiente para ser levada dali por qualquer estranho. Vi que Beatriz e Kiara nos seguiram. Eu não havia contado para nenhum deles essa parte do meu passado, na realidade nunca conversava sobre mim com ninguém nesses últimos tempos.

- Você está bem? – Beatriz perguntou quando paramos.

- Claro que não, olha a cara dela, Beatriz! – Kiara falou irritada e elas começaram alguma discussão da qual eu fiz questão de não prestar atenção.

- Essa merda sempre foi assim – Gustav falou pegando um cigarro e colocando entre seus lábios – Desde o ensino médio. Uma hora brigam, ficando sem se falar por meses. Outra hora voltam a se falar como se tivessem nascido grudadas. Mulher é o demônio – Conversou descontraído comigo pela primeira vez. E eu ri.

- Essa festa já deu para mim – Falei começando a sentir dor em todos lugares onde eu tinha cicatrizes. O médico havia dito que são dores psicológicas, já que só doem quando me lembro do acidente. Sua recomendação para isso foram consultas com algum psicólogo, mas é caro, então consigo conviver com isso por mais um tempo.

- Eu te levo para casa – Beatriz falou parando a discussão e eu neguei.

- Você bebeu. Prefiro ir a pé – Me levantei do chão onde eu estava sentada.

- E você não dirige? – As duas, Beatriz e Kiara, perguntaram ao mesmo tempo.

- Claro que não.

- Eu levo, então. – Gustav falou com um leve tom de irritação em sua voz. Nós entramos todos em um impasse, já que eu não queria que ele nos levasse e Beatriz não queria deixar seu carro sozinho lá – Fiquem quietas. Vou deixar a chave do meu carro com o Eric e aí levo vocês no outro. Pronto. – Seu tom de voz dessa vez ficou mais alto e mais irritado, ele não era um cara com muita paciência.

Antes mesmo de ouvir nossa resposta saiu a procura do Eric, que provavelmente estava com a outra garota. Meu único receio naquele momento é que ele estivesse bravo comigo, de resto eu estava despreocupada.

- Pronto, vamos. - O tatuado falou quando chegou perto de nós novamente e nos seguiu.

- Eu vou na frente – Disse Beatriz quando estávamos perto do carro. As duas começaram novamente uma discussão, só que dessa vez elas não gritavam uma com a outra, eram só farpas que ficavam trocando.

- Eu que vou, enquanto vocês ficarem que nem criança, não vão ter o que querem – disse impaciente e entrei no carro. Por sorte quando me sentei meus músculos pareceram relaxar e da dor se tornou muito mais leve, era quase imperceptível. Talvez eu esteja precisando mesmo de uma ajuda para isso acabar.

- Mal começou a andar com o Gustav e já está igualzinha – Beatriz resmungou pra Kiara que concordou. Não sei o que foi mais engraçado na cena, o modo repentino como elas pararam de brigar e foram para o mesmo lado, a expressão da Beatriz ou modo como Kiara concordou. No fim eu soltei um riso quase imperceptível do comentário, assim como ele.

Não eram nem onze horas e já estávamos voltando para casa. Os três pareciam desanimados com o fim da noite, ninguém conseguiu aproveitar muito a festa. O plano de todos era chegar em casa umas seis da manhã e comentar da festa o resto da semana. Eu estava me sentindo culpada.

- Me mostrem algum lugar bom dessa cidade – Falei para eles que me olharam confuso – Vocês duas sempre me falam que essa cidade tem algo de bom para me oferecer, vamos me mostrem!

- Não quer ir para casa? – Kiara perguntou com um sorriso travesso em seus lábios.

- O último lugar que quero estar agora.

- Gus, já sabe? – Ela perguntou chegando perto dele que assentiu – Agora sim que noite vai começar – e esfregou suas mãos com animação. Não perguntei para onde estávamos indo, mas eu também não me importava, só queria que eles tivessem uma noite boa. Estava agradecida o suficiente por não terem feito pergunta nenhuma sobre os meus pais.

Durante o percurso fui em silêncio, mantendo meu foco na estrada escura em minha frente. Eu ainda tinha medo de andar de carro pela noite, embora eu consiga me mostrar fisicamente "tranquila". Nós paramos o carro em uma estrada de terra e saímos do carro. Olhei confusa para o campo ao meu redor, o que estávamos fazendo nesse lugar?

- Vem – Gustav falou baixo segurando pela segunda vez na noite minha mão, acho que ele queria me guiar no escuro, já que as outras duas estavam muito à frente de nós. Só que pela primeira vez senti meu corpo se eletrizar com seu toque. No mesmo momento que tive essa reação, minhas bochechas pareciam estar ficando mais quentes. Eu corei simplesmente pelo cara ter segurado minha mão. Que merda é essa, Amélia? 

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