capítulo cinco

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Capítulo V

Katie sentia-se terrivelmente embaraçada, enquanto se dirigia à cadeira que Carver lhe indicara, reservada aos clientes. Cliente era a palavra apropriada e não pretendia se esquecer disso. Seus pensamentos estavam confusos desde o momento em que entrara naquele escritório. Para Carver, aquilo era estritamente profissional. E se tivesse sido o pirata do baile de máscaras?
Embora evitasse olhar diretamente para Carver, não pôde deixar de observar que aqueles dez anos o tornaram ainda mais atraente, com um olhar viril e dominador. O sucesso certamente lhe fizera muito bem. Porém, seus olhos castanho-escuros já não possuíam mais a mesma ternura de antes, pelo menos nenhum sentimento em relação a ela. O que fez o passado parecer subitamente vazio.
— Seria melhor começarmos com um resumo do que está pretendendo fazer e por que acha que seria um bom investimento — disse Carver, fazendo-a notar que havia perdido todo o senso de iniciativa. — Preciso saber o que tem em mente para ser capaz de avaliar os resultados.
Katie ensaiara aquela cena várias vezes. Não haveria nenhuma dificuldade em expor seus planos se Carver fosse um estranho. Nesse caso, fingiria que nunca o vira antes, do mesmo modo que ele havia sugerido inicialmente: Ajudaria se fingíssemos que estamos nos encontrando pela primeira vez?
Com aquela idéia fixa em mente, Katie iniciou sua explanação, começando pela experiência que tinha com crianças e o emprego atual em uma creche. Em seguida passou a enumerar a necessidade de um serviço de transporte seguro e confiável para levar e trazer crianças, aliviando a tensão dos pais que trabalham o dia todo.
Carver meneou a cabeça pensativamente.
— Está se referindo a creches, escolas pré-primárias...
Katie inclinou-se para frente na ânsia de enfatizar seus argumentos.
— Será por onde começaremos a divulgação de nossos serviços. Porém, não pretendo atender apenas crianças nessa faixa etária. Estou pensando em crianças em idade escolar que tenham compromissos médicos, odontológicos, aulas de natação, de dança, cursos extra-escolares, aniversários, assim como buscar adolescentes em cinemas ou festas. Geralmente os pais ficam preocupados quando seus filhos utilizam transporte público ao voltarem tarde da noite.
— Isso implicaria em uma extensa carga horária — advertiu ele.
Katie assentiu com um gesto de cabeça, explicando detalhadamente:
— Durante a semana teria início às seis horas da manhã, e antes e depois do horário escolar seriam as horas mais movimentadas. Espero terminar antes das nove horas da noite na maioria dos dias. Nos finais de semana seria diferente pois há várias atividades esportivas e festas para adolescentes.
— Você percebeu que não lhe sobrará tempo para uma vida social? — inquiriu Carver, fitando-a atentamente, na esperança de que ela reavaliasse aquela situação.
— Não tenho vida social — disparou, sem se dar conta de como aquilo poderia parecer absurdo.
— Como? — O olhar de Carver tornou-se subitamente céptico. — Katie, você é uma mulher muito atraente. Imagino que tenha vontade de se relacionar socialmente, ir a festas, bailes...
A ênfase sutil àquela última palavra teve a intensidade de uma descarga elétrica. Carver sabia!, foi o primeiro pensamento que lhe veio à mente. Seu coração disparou e sentiu uma onda de calor invadir-lhe o corpo inteiro.
— Às vezes, porém nem sempre estou disposta — revelou irritada, buscando novos argumentos que o convencessem de que estava enganado a respeito da imagem que fazia dela. — Não dou muita importância a isso — afirmou, lançando-lhe um olhar furioso.
Não, ele não poderia saber. Era bobagem se afligir à toa.
Seguiu-se um embaraçoso silêncio, enquanto Carver avaliava aquela resposta.
Ele não tinha intenção de levar as coisas para o lado pessoal, porém não pôde evitar a pergunta.
— Isso significa que não está envolvida com ninguém?
— Sim. E não pretendendo envolver-me — retrucou, encarando-o com expressão altiva. Queria deixar claro que relacionamentos amorosos não eram prioridade em sua vida. Sua energia estava canalizada para o projeto profissional que acabara de expor.
Carver encarou-a por um momento, e suas sobrancelhas se arquearam.
— Não pretende se casar? Ter seus próprios filhos?
— Você faria essas mesmas perguntas a um homem, Carver? Por acaso, estamos diante de uma discriminação sexual? — perguntou em tom desafiador.
— Estava apenas questionando suas prioridades — retrucou tranqüilamente. — É meu dever avaliar a estabilidade de um empreendimento, antes de recomendar um financiamento.
Ainda irritada pela presunção dele acerca de suas necessidades pessoais, Katie o encarou friamente.
— Então me dê uma oportunidade de mostrar que minha prioridade é montar esse negócio e fazê-lo prosperar.
— Ótimo! — exclamou ele, com um gesto significativo. — Contanto que esteja a par dos prós e contras. Está praticamente, deixando sua vida pessoal de lado.
"Que vida social?", pensou, e em voz alta disse:
— Espero que este trabalho preencha minha vida até que prospere o suficiente e me permita investir em mais veículos e empregar outros motoristas.
Por um instante, Carver fitou-a atentamente avaliando sua força de vontade.
— Então pretende expandir seu negócio.
— Sim — Katie confirmou sem hesitar, colocando mais convicção em suas palavras. — Atualmente, cada vez mais, ambos os pais trabalham fora. Funcionaria como uma extensão dos serviços de uma babá, diminuindo o sentimento de culpa e devolvendo a paz a esses pais tão ocupados.
Carver assentiu.
— É realmente uma idéia vendável.
— Tenho certeza disso.
— Porém, precisa de dinheiro para colocá-la em prática.
— É por isso que estou aqui.
— Certo — disse ele, inclinando-se para trás na cadeira. — Bem, não vamos perder mais tempo, já estou convencido. Apresente-me a documentação.
Katie sentiu uma sensação de vitória. Com um gesto rápido, ergueu a pasta sobre os joelhos e retirou os documentos, selecionou-os e, em seguida, colocou-os sobre a mesa.
— Todas as informações sobre custos, estimativa de lucros e minhas referências encontram-se aqui — informou, satisfeita por não ter negligenciado nada.
Em seguida pousou novamente a pasta vazia em seu colo e pôde finalmente relaxar, enquanto Carver conferia os dados meticulosamente. Ele achou o material obviamente abrangente e fez algumas perguntas que foram prontamente respondidas.
Katie teve certeza de que seu empreendimento fora aprovado quando ele pôs de lado o planejamento ricamente detalhado, sem tecer nenhuma crítica e começou a ler suas referências.
Certa de que não haveria motivo para preocupar-se com elas, voltou sua atenção para as mãos másculas e fortes de Carver enquanto virava as páginas. Notou que não usava nenhuma aliança de casamento.
Seriam aquelas mãos que algumas noites atrás acariciaram seus seios nus? Viúvo havia dois anos, carente de sexo e ainda sofrendo pela perda da esposa. Isso explicaria aquele desejo agressivo que se extinguira tão rapidamente, uma vez satisfeito. Um encontro anônimo era a melhor resposta para alguém que tinha intenção de desaparecer em seguida. Isso não o comprometeria em nada.
Carver teria ido ao baile de máscaras com aquele intuito? Nesse caso, por que a escolhera?
Não demonstrara nenhum interesse por ele, nem mesmo o notara antes que a tirasse para dançar. Entretanto Amanda lhe dissera que o pirata não tirava os olhos dela, enquanto dançava com o toureiro. Será que mesmo por detrás da fantasia de Carmen, fizera-o se recordar dela? E por que aquele pirata a fizera lembrar-se de Carver? Seria ele o rei dos piratas?
A boca, os cabelos, o toque exigente... Na ocasião ficara totalmente atraída pela semelhança. E agora, sentia aquele mesmo perfume...
— Vejo que passou a maior parte de sua vida trabalhando em Londres — comentou ele, arrancando-a subitamente de seus perigosos devaneios.
— Sim. Era fácil arrumar um emprego como babá — apressou-se em explicar. — Minha mãe era inglesa, e nasci na Inglaterra. Tenho dupla nacionalidade.
— Está de volta à Austrália há apenas seis meses. Como pode ter certeza que se adaptará aqui?
— Esta é a terra das oportunidades. Posso estabelecer algo aqui, o que certamente não poderia na Inglaterra.
— Então, voltou com este plano em mente?
— E desde então venho estudando sua viabilidade.
— Está totalmente engajada nisso?
— Completamente.
— Pronta para assinar as linhas pontilhadas?
— Imediatamente.
— Você terá que preencher e assinar vários formulários. Poderemos fazer isso agora e concluir a transação ou poderá levá-los para sua casa para uma avaliação adicional, se preferir.
Katie não conseguia acreditar no que acabara de ouvir. Fora tudo tão rápido!
— Você está aprovando o financiamento?
— Sim. A margem de lucros estimada cobre amplamente os juros que terá que pagar. Não se trata de uma aventura de alto risco.
— Passemos aos formulários — decidiu, incapaz de conter a alegria e o alívio por aquele resultado tão imediato.
— Suponho que tenha cópias de toda a documentação? — perguntou Carver, juntando os documentos dela em uma pilha.
— Sim.
— Arquivarei estes aqui.
Katie mal podia acreditar que aquilo realmente estava acontecendo. Carver dispôs os formulários e explicou minuciosamente o que ela estava prestes a assinar, certificando-se de que entendera cada cláusula e o que acarretaria caso não pudesse fazer os reembolsos.
— Só isso? — ela perguntou avidamente.
Carver lançou-lhe um sorriso.
— Providenciarei para que o dinheiro seja remetido à sua conta hoje mesmo.
Katie deu um amplo sorriso. "Consegui!", pensou. Seu pai recusara-se a lhe emprestar dinheiro e zombara das chances de ela obtê-lo em outro lugar, mas ela conseguira!
— Parabéns, Katie — disse Carver, levantando-se da cadeira.
— Obrigada.
Ao contrário de seu pai, ele confiara nela, apesar de tudo que houvera no passado e a amargura da separação.
Carver contornou a suntuosa mesa e estendeu-lhe a mão. Katie levantou-se de um salto e retribuiu-lhe o cumprimento. Feliz naquele momento promissor, não pensava em mais nada... Até que os dedos fortes de Carver se fecharam ao redor dos seus.
Subitamente viu-se de volta ao salão de baile, deliciando-se com o calor envolvente daquela pele que emitia ondas sensuais, atiçando-lhe o corpo. O dedo polegar de Carver acariciou ligeiramente o lado interno de seu pulso, fazendo-a estremecer. Seu olhar foi atraído para o pequeno botão que fechava a camisa branca, ocultando a linha espessa de pêlos pretos e macios no peito musculoso.
— Carmen... sem a máscara.
O doce murmúrio soou como um trovão aos ouvidos de Katie. Ele era o rei dos piratas! Ninguém mais poderia dizer aquilo!
O impacto daquela constatação atingiu-lhe a mente, golpeando violentamente seu coração. Seu olhar fixou-se no dele, e a mesma certeza brilhava nos olhos de Carver. Sentiu-se acuada, sem ter para onde fugir. Então era ele, pensou. Nenhum dos dois poderia negar aquela verdade.
Carver soltou-lhe o pulso e pousou o dedo sobre seu queixo, deslizando em movimentos sinuosos.
— Teria o mesmo sabor, a mesma sensação, sabendo que era eu... que era você? — sussurrou, fixando os olhos desafiadores nos dela.
Katie ficou petrificada, sem que lhe viesse à mente uma única resposta. Aquela pergunta a atingiu da mesma forma que a presença de Carver Dane naquele elevador. Sua mente latejava, enquanto ele deslizava o braço ao redor de sua cintura e com a outra mão erguia-lhe delicadamente o queixo, fazendo-a encará-lo.
O rei dos piratas sem a máscara!
Katie fitou o rosto, a boca de Carver aproximando-se cada vez mais e rendeu-se àquele beijo sem nenhuma resistência. O desejo de saber se agora teria o mesmo gosto era excessivamente selvagem. Não ponderava as conseqüências. Estava além de qualquer tipo de preocupação, apenas precisava de respostas.
Os lábios de Carver roçaram os dela suavemente. Katie fechou os olhos, abandonando-se com fervor às suas próprias emoções. Ele a provocava com carinhos suaves, prolongando ao máximo aquela exploração sensual, pressionando-lhe a língua sobre os lábios ávidos por um contanto mais intenso.
Aquilo não era uma fantasia. Era Carver! O homem que amara loucamente anos atrás. E seu coração batia mais forte, ansiando que ele a amasse como antes, retrocedendo no tempo e recuperando a alegria e a paixão gloriosa que sentiram um pelo outro. Dominada por aquele desejo, Katie enlaçou-lhe o pescoço, puxando-o de encontro ao seu corpo e o beijou com sofreguidão.
As mãos dele tocaram-lhe os cabelos, acariciando-lhe a nuca. Puxou-a ainda mais de encontro ao seu corpo, fazendo-a sentir a evidência física do seu desejo. Katie queria que ele a desejasse, clamasse por ela, e que ficassem no passado todos os anos em que ficaram separados.
Tudo acontecera exatamente como ela desejara. O beijo tornou-se íntimo e profundo, reacendendo a súbita explosão de paixão, a necessidade selvagem de excitar e ser excitado, de desfrutar um do outro.
Katie sentiu a força do desejo de Carver. Aproximando-se mais dele, esfregou seu corpo, movendo-se em ritmo sensual. Desejava sentir aquele corpo ardente que a envolvia. A mão dele prendeu-a com firmeza contra o próprio corpo, provocando-lhe sensações intensas. Os contornos suaves de seu corpo corresponderam com ardor àquele anseio que já não podia negar.
— Ambos desejamos isso — murmurou Carver.
— Sim... sim.
— Não aqui — disse ele em um tom firme. — Não acho que seja a hora, nem o lugar.
Katie precisou de alguns segundos para perceber que estavam no escritório dele. Era difícil retomar o contato com a realidade.
Carver ergueu a cabeça, e os olhos escuros lançavam faíscas.
— Você está livre esta noite?
— Sim — respondeu sem pensar.
— Eu irei à sua casa. Às nove horas está bem?
— Minha casa? Como sabe...
— Seu endereço está nos formulários que você assinou — interrompeu ele.
— Pode vir mais cedo se quiser. Eu poderia fazer o jantar e...
— Não. Não estarei livre mais cedo.
— Não estará livre? — Katie começava a parecer tola, repetindo as palavras dele.
— Em um futuro bem próximo você também não estará, se é que falou sério sobre o seu empreendimento.
— Isso é... isso é verdade. — Katie engoliu em seco ao perceber que esquecera o compromisso que fizera há pouco para conseguir o financiamento que ele aprovara.
Carver deslizou uma mão pelo seu quadril, enquanto com a outra afagava-lhe os cachos negros.
— Sempre gostei dos seus cabelos — disse com um sorriso ardiloso.
Katie lançou-lhe um olhar cheio de curiosidade.
— Foi isso que o atraiu em Carmen? — perguntou, desejando que fosse verdade, pois significaria que ainda se lembrava dela.
Ele deu de ombros, e seus olhos se estreitaram.
— Carmen passava uma imagem muito sensual.
E verdade, admitiu a si mesma, porém ficou desapontada com a resposta.
— O pirata também — retrucou.
— Uma coincidência feliz. Mas esta noite será por opção, não é, Katie? — perguntou suavemente, com um brilho de antecipação no olhar.
Katie sentiu um aperto no peito provocado pela sensação que ele deixara ao se afastar.
— Sim — concordou ela, embora aquilo a atingisse duramente. Era de sexo que estavam falando, nada mais.
Porém, naquela noite teriam mais tempo juntos, tempo suficiente para descobrirem o que queriam um do outro. A esperança de um novo recomeço deixou-a animada. Teriam a chance de corrigir um erro do passado.
Carver deu alguns passos, pegou a pasta que estava ao lado da cadeira e a colocou sobre a mesa.
— Precisará levar as cópias dos documentos que assinou — aconselhou ele.
— Obrigada novamente, Carver — disse, abrindo a pasta apressadamente e guardando os documentos, enquanto um pensamento desagradável assomava-lhe a mente.
— Você não foi influenciado por... por...
Carver estreitou o olhar.
— Não é do meu feitio comprar as mulheres, Katie.
— Não. Claro que não. Por que o faria? — balbuciou, recriminando-se pela terrível gafe. Certamente as mulheres desejariam ardentemente ir para cama com ele. Desesperada para explicar a suspeita infundada, acrescentou:
— É que meu pai...
— Eu não sou seu pai — Carver cortou friamente.
Katie sentiu uma sensação desconfortável dominá-la. Estava piorando as coisas, referindo-se ao homem que Carver tinha todas as razões do mundo para odiar.
Os lábios de Carver curvaram-se em um meio sorriso.
— A transação está concluída, Katie. Sua idéia está muito bem fundamentada. Agora é com você fazê-la funcionar.
— Agradeço sua confiança em mim, Carver — disse ela, respirando fundo. Determinada a não ser indelicada novamente, pegou a pasta e caminhou em direção à porta.
— Eu o verei hoje à noite?
— Sou um homem de palavra — declarou secamente, acompanhando-a até a porta.
Por alguns segundos, Katie hesitou, sentindo-se angustiada por sair dali, quando ainda havia tanta coisa por resolver entre eles.
— Hoje à noite — disse ele firmemente.
Ela sabia que deveria se contentar com aquela promessa. Até aquela noite...

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