Abrigo na Escuridão

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Christian

Já fazia uma semanas desde a última vez que Heloise veio até mim. Depois daquela tarde de quinta-feira no meu quarto, ela não me procurou mais, ela me evitava na escola e passava o dia todo trancada no quarto.

Há três dias meu pai viajou para Londres para uma reunião da construtora. Ele era dono das cinco construtoras mais bem sucedidas de Barcelona, e proprietário de todos os condomínios populares e de primeira classe da cidade.

Eu estava no chão da sala com uma garrafa de whisky ao meu lado quando Heloise desceu as escadas e parou ao me ver.

Enquanto eu me levantava caminhando em direção à Heloise, ela não se moveu, continuava paralisada. Me aproximei o suficiente para o ar ficar pesado, eu pude sentir o doce perfume dela entrando nas minhas narinas, então eu a beijei.

Quando me afastei dela, ela disse:

- Tenho que ir para a escola.

Assim que ela passou pela porta da frente da mansão, eu percebi algo estranho nela. Ela beija um pouco diferente agora, cortou seu cabelo channel, eu gosto agora. A única coisa que não mudou foi a forma como o corpo dela ainda sente o mesmo.

Demorou segundos para eu estar novamente sentado no chão da sala de estar, bebendo, fingindo que não preciso dela.

- Christian. - Janet gritou.

Eu olhei para ela e ofereci um sorriso doce a ela.

- Vá tomar um banho e ir para escola. - ela disse enquanto permanecia entre a cozinha e a sala.

Estendi minha mão direita para que ela pudesse me ajudar a levantar, enquanto a esquerda segurava a garrafa de whisky. Janet revirou os olhos, caminhou e segurou firme ajudando-me a ficar de pé e voltou para a cozinha.

Subi as escadas, mas andei em direção ao quarto de Heloise, entrei no cômodo, deitei-me na cama de Heloise, e olhei para a janela.

É como um tiro nas minhas veias, nunca pensei que voltaria nesse quarto novamente. Não venho nesse cômodo desde o dia em que ela me disse que precisava viajar por alguns dias, mas desde que ela se foi, nunca mais voltou.

Os olhos dela envolviam a verdade dentro de suas próprias mentiras. Isso parecia real para mim, mas lembrar só faz com que eu me sinta pior, talvez se ela voltar para mim, talvez eu a perdoe.

Frio, era isso que eu sentia todas as vezes que invadia a minha memória a imagem dela dançando nas margens do lago Vitória. Tudo o que ela deixou foram espaços vazios que me enchem de buracos como as crateras na lua, o rosto dela estava cada vez mais distante, e talvez daqui a algum tempo, talvez eu esqueça que de como ela partiu sem nenhum destino.

Eu tento continuar minha vida como se nunca tivesse conhecido ela, eu queria queimar as lembranças que eu tenho dela na minha mente.

Levantei da cama de Heloise e fui para o jardim de inverno, eu lembro que ela passava a maior parte do dia  cuidando das rosas, as rosas de cor amarela eram as preferidas dela.

Eu estou decidido a me trancar por dentro de vez, e não irei deixar isso me derrubar novamente. Eu a perdôo por tudo, eu quero deixá-la ir, não posso mostrar a ninguém o vazio que ela deixou desde a sua partida.

Pergunto o que há de errado comigo?

Eu nunca quis que fosse tão frio, mas estou convicto a afogar minha vontade de voar. Aqui na escuridão eu me conheço, e no final, eu acho que eu tinha que cair na escuridão, sempre encontro meu lugar entre as cinzas que meu passado deixou para me fazer companhia.

Não há uma maneira eu possa decidir o que é certo, meus fantasmas infantis sempre ficam nublando meus pensamentos. Mas eles não vão tirar meu orgulho, porque há algo em mim que é atrativo e isso pode matar qualquer pessoa, essa é a verdade que as pessoas não enxergam.

Levantei daquele chão escuro, peguei as chaves do meu carro e sai dirigindo. Eu não queria pensar, eu só queria dirigir a qualquer lugar até toda aquela angústia que me consumia por dentro desaparecesse.

Parei o carro de frente para escola, já havia encerrado as aulas, os alunos estavam saindo pelos portões, mas não vi Heloise, de fato ainda estaria lá dentro, mas quando avistei Louise sai do carro e fui até ela.

- Louise. - gritei.

- O que é? - ela perguntou séria.

- Onde está Heloise?

- Na capela com o Jeremy. - ela respondeu.

- O que? - gritei.

Enquanto eu corria em direção a capela, eu ainda pude ouvir Louise gritar meu nome:

- Christian.

Eu não devia explicações, por isso corri o mais rápido que eu conseguia. Quando entrei na capela Jeremy estava segurando o braço de Heloise com força como se fosse agredi-la.

- Solta ela, Parks. - gritei.

- Resolveu dar as caras, Corvin? - Jeremy perguntou ironicamente.

Quando ele soltou o braço de Heloise, andei em direção à ele, correios os punhos e soquei a cara dele três vezes seguidas, depois fui até Heloise.

- Ele te machucou? - perguntei segurando o rosto dela.

Ela estava assustada? Seus olhos estavam arregalados e ela não disse uma palavra sequer. Peguei a mochila e a mão dela, a conduzi até meu carro, joguei a mochila no banco do passageiro, e entramos no carro.

O caminho todo foi silêncio, Heloise não disse palavra alguma. Ela ainda estava assustada? Ou estava com medo de mim? Medo não, ela era a única pessoa nesse mundo que eu não queria que sentisse medo de mim, ela era meu diamante lapidado.

Se eu disser que isso tudo só vai machucá-la? Se eu avisá-la que o fogo irá nos queimar? Ela andaria nele comigo?

Se eu fosse cego ela nunca me deixaria guiá-la no escuro, no meio da noite, no silêncio, quando não houver ninguém para ouvi-la gritar por ajuda.

Se eu dissesse que poderíamos nos banhar em nas chamas do inferno, ela nunca desceria e viria me encontrar nas sombras. Mas a minha loucura estava consumindo Heloise aos poucos, meu veneno estava enlouquecendo a cabeça dela, e quando a tristeza deixá-la imóvel e quebrada em sua cama, eu iria abraçá-la nas profundezas do seu desespero até ela implorar para viver no meu mundo de dor.

Heloise precisa de mim, e eu quero vê-la testemunhar, gritar na luz santa para que eu dê a ela o suficiente para trazê-la de volta à vida, e fazê-la sentir o prazer novamente.

1085 palavras

Sussurros da NoiteOnde histórias criam vida. Descubra agora