O FUTURO DO CRIME

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Eu quase cuspi todo o meu café enquanto processava aquilo. Fiquei atônita! Já fazia quase duas semanas que eu estava nos Estados Unidos e tudo lá permanecia igual e sem surpresas; contudo, naquele dia, a America do Norte me assustou de verdade. Engoli o meu café e falei para o Eduardo:

- Você viu o jornal?

- Quê?

- O jornal criatura! Olha aqui.

Na verdade, eu estava segurando o meu celular aberto no site do The Washington Post. Lembrando disso agora, fico aliviada de não ter cuspido o café.

- Hmm... Que loucura, né? – O Edu disse ao olhar o celular e voltar a se concentrar em sua mala, terminando de arrumá-la para irmos embora.

Edu nunca foi da área em que eu trabalhava – o direito -, mas, ainda assim, fiquei espantada com a sua reação inerte em relação aquela manchete esquisita que dizia: O Futuro do Crime - Tribunal Criminal de Washington Começa a Usar Robô Especialista em Direito Como Juiz.

De toda forma, quela viagem já tinha me deixado familiarizada com a questão da tecnologia. Estava lá a trabalho para um congresso jurídico sobre as mudanças globais nas leis ocorridas pelo mundo digitalizado. Ainda assim, fiquei espantada com notícia. Era um absurdo! Como as sentenças seriam dadas por um robô? O Estado passaria a responsabilidade sobre a liberdade de um cidadão para uma máquina? De agora em diante, robôs seriam especialistas em tudo?

Comecei a ler o artigo e descobri que o título estava um tanto quanto sensacionalista. Aquilo tudo não passava de um protótipo em fase de teste, o que não deixava de ser absurdo, mas funcionava da seguinte forma: um computador, programado por meio de inteligência artificial, ao receber as informações de um determinado caso, faz uma análise baseada nas decisões de juízes reais. Tudo isso, em cerca de cinco segundos. Após essa análise, emite uma sentença condenatória que prometia ser mais precisa e fundamentada.

Não quis ler o resto, já estava com ânsia de vômito.

- Deixa de ser cri-cri, Kátia!  Às vezes isso pode até ser bom... Vai que a decisão do robô é mais justa?

- Justa é a caralho, Eduardo! Isso aí é o início do Eu Robô* e ninguém ta percebendo.

- Não vejo problemas em um robô que prende ladrões, por exemplo. Aqui essas coisas funcionam. – Deu uma pausa na fala. - No Brasil roubariam o robô. 

- Você é inteligente de mais para falar esse tipo de coisa. É só pensar com um pouco de senso crítico, enfim... – Respondi e decidi encerrar o assunto.

Naquele dia, voltei para o Brasil revoltada. No entanto, algum tempo depois - cerca de duas semanas - enquanto acessava o site de outro jornal estadunidense me deparei uma nova notícia relacionada aos robôs juízes. A manchete foi bastante interessante: Futuro do Crime? Robôs julgadores de Washington são desligados após constatação de sentenças racistas.

"Nada de novo sob o futuro." – Pensei comigo. Ao imitarem as decisões de seres humanos, os robôs emitiram decisões racistas e, por isso, foram desligados. Deixaram, assim, o racismo somente para as pessoas, já que os seres humanos são especialistas no assunto. 

De fato, enquanto o mundo se desenvolve a sociedade aparenta estar no mesmo lugar. 



*Eu robô: Obra literária que contém uma coletânea de contos escritos por Isaac Asimov. Passa-se em um tempo futurístico em que sociedade compartilha o cotidiano com robôs humanóides levantando questões reflexivas. Também deu origem ao filme homônimo. 

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⏰ Last updated: Oct 03, 2019 ⏰

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