Chego em casa e procuro por minha filha, uma jovem linda e saudável. Grito-lhe o nome algumas vezes porém sem resposta alguma, dirijo-me para a cozinha e vejo um pequeno fio tênue vermelho escorrer do outro lado de meu balcão, sigo a trilha crescente, vejo uma poça de samgue se formar com o corpo falecido e frio de minha filha caído em cima, sinto um nó dolorido se formar em uma garganta, minhas pernas vacilam com a cena de minha filha com uma faca em seu pulmão esquerdo, caio ao lado de minha pequena em desespero, sinto as lágrimas encherem os meus olhos, mas não antes de mirar um pedaço de papel ao lado do corpo de Clarisse, pego o papel e o desdobro, vejo a letra de minha filha preencher cada linha.
"Mamãe,
À este ponto ja deve ter percebido o que aconteceu, sinto muito.
Tenho meus motivos para esta decisão. Ultimamente comecei a pensar em coisas que não fazem bem para mim. A violência e o caos está tomando conta de tudo, voltando da escola, homens perguntam se eu faria coisas que a senhora não gostaria que eu fizesse, mas adimito, fiz tais coisas algumas das vezes. É tudo muito complicado, eu sei, é como se eu fosse um pássaro, um pássaro preso, como se tivesse algo invisível ao meu redor, mas, por incrível que pareça, me acostumei e comecei a gostar, gostar da escuridão e dos segredos que ela esconde, ja sei a maioria deles.
Alguns segredos são mais obscuros que outros, as decisões que eu tomei não prejudicam só à mim, mas ao universo inteiro, a senhora deve estar chorando ou coisa assim (Acho que deveria, eu também estaria).
A vida toda só estive pensando em como seria a minha adolencência...Meu primeiro beijo, a primeira menstruação, a primeira vez, o começo da vida.
Poderia ter sido assim se meu caminho não tivesse tomado outro rumo, se não tivesse conhecido as pessoas que conheci, se não tivesse feito as coisas que fiz. Sei que pode parecer alguma fase da adolescência, mas eu tinha certeza que não.
Tudo começou aos meus 14 anos, quando eu recebi uma mensagem em minha rede social, dizendo que eu parecia alguem legal de se conhecer, era uma garota, Kayla, nos tornamos amigas, mas mal eu sabia que essa amizade poderia se tornar o meu maior problema.
Com o passar do tempo fomos nos aproximando, certo dia, recebo uma mensagem com um link, clico no link e quase que instantâneamente recebo o aviso "Suas fotos foram publicadas com sucesso" fiquei confusa, até ver o barulho das atualizações disparar, clico em uma delas e vejo fotos, malditas fotos! acabariam com tudo, poderiam acabar com a minha chance de ter uma vida, leio alguns comentários, todos horríveis, maldosos e dolorosos. Meus joelhos fraquejaram e caí a chorar, ouço o barulho de uma mensagem com os ditos "gostou das fotos?". Tomei alguns remédios para dormir aquela noite, mas não consegui sequer pregar os olhos. As fotos e os comentários não me deixaram em paz.
Então, quando consegui tirar as imagens da internet, surgiram problemas. Muitos. Gigantes.
Pessoas publicaram em seus próprios perfis com legendas horrendas, senti meu estômago revirar com a simples
a idéia de ir pra escola no dia seguinte. Então, faltava todos os dias sem a senhora saber, essa rotina virou prostituição, para conseguir dinheiro fácil, mas um de meus clientes acabou me apresentando à coisas novas, novas pessoas, com isso conheci um cara com mais ou menos 17 anos, começamos a ir pra festas quase toda noite, em uma dessas festas, nao me lembro em qual precisamente, injetei algo em minha veia, Heroína. A droga não era ruim mas também não era boa, alguns dias depois, esse cliente voltou, disse que minha conta com os chefes dele estava aumentando, comecei a me prostituir ainda mais para pagar a dívida, demoraram meses até conseguir pagar tudo, depois, tentei parar com esse vício, mas parecia cada vez mais difícil, tive crises de abstinência, consegui diminuir, mas nunca parar.
Dois meses se passaram, descobri que engravidei de um cliente, foi difícil no inicio, na verdade, a gestação inteira foi difícil, acabei encontrando o pai da criança. Ele me espancou, e disse que se a criança nascer, eu morreria. Disse a ele que abortei, mas na realidade, não.
Cada dia minha barriga crescia cada vez mais, mas, você estava ocupada demais para perceber.
Nove meses depois, tive a criança, era um garotinho lindo, mas, como toda mãe quer o bem de seu filho, o deixei em um orfanato, não foi fácil, mas era para o próprio bem dele, e o meu também.
Passado alguns meses, depois de completar meu aniversário de 16 anos, reencontrei uma amiga da época do ensino fundamental, conversamos muito e descobri que ela enfrentara problemas parecidos com os meus, mas, ela se protegia do mundo de um modo diferente, Lilian se auto-mutilava, dizia-me que os problemas se afastavam por um certo tempo. Comecei a fazer isso também, depois da morte do papai naquele acidente de moto. Na primeira vez doeu, muito. Mas fui me acostumando, escondo as marcas com pulseiras por isso nunca notou.
Tenho mais segredos do que pode imaginar, alguns deles não tenho coragem de revelar, mas alguns irei contar-lhe.
O primeiro era a minha anorexia .
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A carta de Clarisse
Teen FictionTodos nós temos nosso lado obscuro, todos nós temos nossos segredos e nossos problemas, a carta relata a história de uma adolescênte com mais problemas que o normal e disturbios incomuns para a maioria do mundo adulto. Clarisse, uma jovem de 15 anos...