Capítulo I - A Fonte dos Quatro Anjos

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    -Oi Apollo-disse Nanda calmamente enquanto ambos passavam pelo emblemático portão de ferro que marcava a entrada da escola "Vivución".

    -Oi Nanda, tudo bem? -Ele respondeu entusiasmado ao ver ela.

    -Tudo ótimo, então, eu preciso falar com você mais tar... quer saber, esquece... não, pera... eu estou com medo de te atrapalhar com a minha besteir... mas... ah, sei lá, quando eu posso te encontrar?

    -Ok... me encontra no intervalo, eu vou estar junto com a Nicole e com o Benjamin, naquela mesa de xadrez perto da Fonte dos Quatro Anjos, bom, o lugar de sempre.

    -Beleza, até depois!

    Os dois foram para direções opostas e se despediram com um sutil olhar que revelava mais coisas do que parecia, cada um para a sua sala, para o seu pequeno mundo, separados por dois prédios, os prédios dos garotos e o prédio das garotas.

    A escola Vivución, mesmo com esse nome estranho por causa de sua descendência francesa, era um colégio muito rígido, as pessoas eram separadas por prédios de acordo com seu gênero, e, em cada prédio, as salas era divididas pelo nome de alguma pessoa famosa. Por ser uma escola especifica para ensino médio, e por se situar no bairro nobre de São Paulo, cada sala era dividida pelo nome de pessoas famosas. A primeira série de matemáticos, a segunda de escritores e a terceira de biólogos.

    O único momento em que meninos e meninas podiam ficar juntos, era no intervalo, por trinta minutos dos 360 que tinham que ficar dentro daquela escola.

    Todos já acomodados em suas devidas salas, Nanda e Nicole, na sala Clarice Lispector, no pavilhão feminino, Benjamin na sala Machado de Assis, e Apollo na sala William Shakespeare, ambos no pavilhão masculino , o sinal toca, e, de cinquenta em cinquenta minutos, um professor saia pela porta, e outro entrava, tudo isso em um ritmo insano, os tratavam como máquinas, o ciclo se repetia quatro vezes, até tocar o quarto sinal do dia.

    Todos os alunos se levantam. A maioria ajeita suas blusas, alguns aproveitam o tempo em pé para esticarem suas colunas, que ficaram na mesma posição por duzentos minutos seguidos ao decorrer das 4 aulas de 50 minutos que começavam as 7:10 da manhã.

    Apollo era muito amigável, fazia amizades muito facilmente, era simpático e um dos meninos com mais destaque em todo o colégio, mas toda a vez que chegava a hora do intervalo, todos sabiam o que ele ia fazer, sua rotina era a mesma. Ele sempre levantava, ajeitava a sua roupa, e ia em passa apressado, já que estava nas regras da escola que era estritamente proibido correr nos corredores, meio irônico, não é mesmo, até o seu ponto de encontro com seus amigos, cumprimentando somente com um "oi" ou "olá" quem o chamasse no corredor. Já Benjamin já era mais introvertido e totalmente antissocial, passava no corredor com passos de lentos e curtos até se encontrar com Apollo que o apressava, mas até esse encontro, ele era invisível, e não que ele se incomodasse com isso. Ele não era que nem seu amigo que as vezes precisava de atenção; ele simplesmente criticava as pessoas em silêncio, mas todos sabiam de uma coisa: "Se fosse para terem um inimigo, que ele não seja o Benjamin".

    Os dois saíram das suas respectivas salas de aula e acabaram se encontrando no corredor e foram em direção ao seu habitual ponto de encontro. Enquanto isso, no prédio das garotas, Nanda, tímida, foi passando despercebida pelo meio de todas aquelas mesquinhas patricinhas que se achavam as melhores do que todo mundo. Já Nicole, impaciente como era, passou esbarrando em todo mundo, até que esbarrou em Clara, que gritou:

    -Ei, menina estranha, olha por onde você anda! Eu sou boa demais para ser empurrada por um serzinho como você!

    E cochichou:

    -Meu Deus, que menina doida, é por isso que ela só fica com aquela idiota antissocial da Nanda, duas loucas.

    Entre todos os problemas dessas falas, a maior delas foi que, o cochicho de Clara, foi baixo, mas não o suficiente para que Nicole não ouvisse, então, revoltada, ela parou de andar, respirou fundo, fechou os olhos e se virou em direção à Clara e disse com todo o sarcasmo do mundo, mas com um olhar de plenitude:

    -Olha aqui minha linda, vou ser bem clara pra combinar com o seu nome, já que você é tão egocêntrica que não consegue ouvir nada que não seja relacionado à você. Vamos por partes, pois a sua mente tem uma limitação que não consegue entender a coisas se não forem desenhadas. Infelizmente eu estou sem um papel aqui, mas se eu tivesse, mesmo assim não usaria, na verdade eu teria dó do papel, por ter que "sofrer" por uma pessoa tão burra, insignificante e irrelevante como você. Eu realmente ando só com a Nanda no pavilhão das meninas, mas eu prefiro andar com só uma pessoa que é minha amiga verdadeira, do que andar com uma legião de meninas que só te acompanham por medo e dó. Menina, você é falsa, ninguém pode confiar em você e eu tenho certeza que quando você perceber isso, já vai ser tarde demais, pois as suas atitudes já vão ter afastado todo mundo. E já aviso de antecedência, já que eu sei que você não tem a maturidade suficiente para ir falar com as pessoas na cara delas, e eu tenho a absoluta certeza, que quando eu sair daqui, você já vai reclamar de mim para suas colegas, que eu não me importo um pingo com a sua opinião e que, quando você tiver a mínima relevância na minha vida, e parar de ser essa pessoa idiota, estúpida e ridícula com as outras pessoas, que você é hoje, ai a gente conversa. Beijo tchau, espero que você tenha um dia iluminado.

    Clara se fingiu de desentendida com uma cara de derrotada e se virou em direção as suas amigas que estavam envergonhadas por concordarem friamente com tudo o que foi falado.

    Nicole saiu da sala apressada, puxando Nanda pelos braços enquanto continuava xingando mentalmente aquele ser humano horrível que passou dos limites.

    Dez minutos mais tarde, lá estavam Apollo, Benjamin, Nanda e Nicole reunidos no monótono, casual, mas, mesmo assim, perfeito, lugar que eles já tinham combinado desde que se conheceram. Na mesa de xadrez perto da Fonte dos Quatro Anjos.

    O grupo dos quatro, nomeado pelos mesmo de "B.A.N.A.", todos juntos, lanchando, até que do nada, Benjamin coloca seu sanduíche de volta no papel alumínio, coloca em cima da mesa e começa a observar a paisagem, algo que ele fazia todo dia, mas dessa vez, ele estava diferente. Ele sempre parava de fazer as suas coisas no intervalo para ficar analisando tudo que estava a sua volta, graças a sua crise de TOC.

    Ficou olhando a Fonte, o muro de folhas, cada uma das caras dos quatro anjos, as outras mesas de xadrez, tudo isso por 10 minutos, então ele começou a olhar fixamente para o pote de uvas roxas de Apollo e diz:

    -Essas uvas estão desproporcionais, estão fora de padrão, fora de escala, tem uma maior do que a outra.

    Depois de 30 segundos de puro silêncio, então o mesmo completa:

    -Eu estava olhando um pouco aqui do nosso canto, tanta coisa já aconteceu aqui, não sei se vocês se lembram, mas, no dia primeiro de novembro de 2017, ano passado, a Isabella, da sala Agatha Christie, estava sentada entre o anjo segurando uma jarra de barro e o anjo tocando corneta, na borda da fonte comendo um misto quente com maionese sozinha, pois sua prima da sala Bertha Lutz estava namorando com o Gustavo da sala Fernando pessoa, até que ela viu uma barata indo em sua direção em uma velocidade de 1 metro por segundo, mas sua fobia por baratas fez seu cérebro liberar adrenalina e noradrenalina no seu corpo, seus olhos logo se arregalaram, sua expressão ficou séria, sua testa ficou franzida, músculos faciais contraídos, e houve reação involuntária do corpo que a fez cair para dentro da fonte, todos riram e ela foi tentar achar uma toalha para se secar. Além do mais...

    Antes que ele pudesse continuar falando, Apollo, impulsivamente disse:

    -Sério cara, como você lembra de tantos detalhes, você é um robô?

    Todos começaram a rir e o sinal tocou logo em seguida. Eles se levantaram ao coro de mais risadas e quando iam começar a se despedir, Nanda falou:

    -Gente, desculpa atrapalhar, mas no final da aula eu preciso falar com vocês..., mas só se vocês puderem... melhor não... espera... eu preciso real falar com vocês, me encontrem na frente do portão azul!

    Todos responderam para ela em uma só voz não combinada que iriam encontrar ela lá. Se despediram e seguiram seus caminhos de volta para suas respectivas salas.

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