Loup-Garou

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A lua alta sob sua cabeça, o cheiro do orvalho misturado a varios animais noturnos que tinham passado por ali, o vento frio da noite roçando seus pelos negros. A grama molhada abaixo das suas patas firmes, as árvores balançando em uma sinfonia harmônica e delicada, o silêncio da floresta mostrando que era o único predador presente; a doçura na ponta da língua. O líquido escarlate descendo pela sua mandíbula repleta de pelos. Sim, ele estava sentindo tudo aquilo sem deixar passar se quer uma sensação, ele sentia tudo ao mesmo tempo e quão maravilhado estava por ter a oportunidade de sentir tudo tão deliciosamente, tão perfeitamente.

Amaldiçoado. Alguns diziam. Demônio. Diziam outros. Ele não se importou com aquilo, não enquanto ele tinha nas mãos tudo o que todos queriam mas, ninguém tinha coragem de fazer o sacrifício necessário. Ninguém fora tão corajoso quanto ele. Sua existência tinha outro significado, seus objetivos agora iam além de uma vida próspera no campo. Desistiu de tudo pelo qual sua família tanto batalhou para ter em suas mãos o poder de tirar vidas, e ele não se importava com isso. Podia até dizer que, no seu íntimo em um cantinho escuro que ganhara espaço com o decorrer dos dias, ele gostava de matar, gostava das vítimas implorando por suas vidas, gostava do sabor do medo na ponta da língua.

Ao olhar para baixo encarou os olhos negros e espantados da sua vítima já sem vida, a garota tinha cabelos tão amarelos quanto os raios do sol, os olhos negros eram contornados por cílios grandes e marcantes. As bochechas rosadas de quando sorria agora estavam pálidas, dos lábios grossos entreabertos escorria um filete de sangue que cortava sua pele alva. Ela era linda porém, proibida. Uma jovem camponesa virgem que estava no lugar certo e na hora certa, para ele é claro. E para quem disse que apenas os sanguessugas gostam de virgens se enganou, são um prato delicioso nas mãos de lobisomens famintos. Agora com o peito aberto e sem alguns dos órgãos, o lobisomem lambia o focinho enquanto se deliciava daquele banquete, ninguém daria falta dela até o amanhecer, pena que ele não podia estar mais enganado...

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Garret sabia o que tinha feito, ele lembrava com carinho e apreciação do sangue doce e da carne saborosa da jovem virgem de cabelos dourados. Quem diria que ele - logo ele que era tão cauteloso - deixaria se levar por seus desejos animais mais profundos. Ele que observava tudo, sabia exatamente a vítima que chamaria menos atenção, aquela de que a ninguém faria falta. Passava dias segurando a transformação, controlava sua fome de carne humana como se colocasse correntes em si mesmo até ter certeza que tudo sairia como planejado.

Calculista, observador. Quem suspeitaria de um jovem peregrino galanteador? Com cabelos em tons de castanho escuro, cílios grossos, barba feita, lábios finos em uma linha curva na ponta. Garret andava sempre bem vestido, com um olhar afiado e uma postura impecável, pedia abrigo por alguns poucos dias nas hospedagens dos vilarejos e não demorava para escolher seu alvo. Quando seu plano já estava traçado ele ia embora, fazia questão que todos o vissem partindo e voltava a noite para buscar o que tinha ansiado há muito desde que chegou, sua vítima perfeita.

Ele tinha regras, ninguém podia dizer que o demônio das florestas era alguém desorganizado, claro que existiam lobisomens loucos que matavam tudo que viam em sua frente e seu final era á fogueira. Não queria uma morte assim, era muito novo para se deixar levar pelas crenças idiotas dos aldeões, e além de tudo se considera deveras inteligente ao ponto de enganar todos e sair impune. Enquanto vagava procurando a próxima vila ou cidade que atacaria ele mentalisava suas regras e seu modo operante.

Nada de crianças. Que tipo de demônio mata crianças?

Nada de mulheres grávidas. Preferia as jovens virgens, até porque não matava crianças.

Nada de homens. Odiava o sangue grosso masculino, a adrenalina fétida que soltavam e sabia que teria um grande desafio para captura-lo.

Nada de pessoas conhecidas. Evitava as jovens conhecidas, procurava os lugares mais afastados, garotas que quase não saíam de casa, órfãs ou garotas desatentas, às quais a pequena sociedade não dava valor.

Loup-GarouOnde histórias criam vida. Descubra agora