Coisas estranhas acontecem com a mente de um homem na guerra, coisas que mesmo contando com toda honestidade do seu coração ninguém acreditaria, e essas são aquelas que ainda não se tem vergonha de contar. Mas se passar por louco não é uma preocupação minha e por isso escrevo esse relato, tão duvidoso como a memória de um velho, mas ela é a única que me resta, devo certa confiança a ela.
Estávamos indo para o fronte de guerra italiano, o navio cortava os mares revoltosos como uma faca e balançava tanto que pensávamos que nossos espíritos sairiam do corpo, estava saindo, meu estômago embrulhava tanto que tinha medo de acabar vomitando ele para fora.
O imenso atlântico estava tenso, o sol escaldante queimava a lataria do navio que era refrescado pela brisa salgada do mar, não havia nada em frente nem atrás, a estibordo nem a bombordo, apenas o vazio eterno preenchido pelas ondas espumantes, o silêncio imperava, mas as vezes era rasgado pelo canto dos marinheiros entediados e pelo barulho das águas.
O sol já tinha se posto quando os sensores detectaram algo, do silêncio mortal foi-se para o pandemônio infernal, os alarmes gritavam e os marinheiros assumiam seus postos, eu estava do lado de fora tentando observar alguma anomalia na escuridão do oceano, não via nada, mas escutava um barulho assustador de algo voando, era um avião inimigo.
Para nossa surpresa o avião rodeou e rodeou sem atacar, nossas metralhadoras antiaéreas não conseguiam acompanhar o maldito, mas não precisava, ele tinha nos deixado por algum motivo misterioso. O mistério iria se resolver em poucos minutos depois, havia um submarino inimigo bem embaixo da gente.O perigo era iminente, o navio iria ser atacado, os marujos entraram em desespero, todos corriam para os botes salva vidas, outros tentavam comunicação aliada, mas era inútil, um torpedo já havia nos atingido fazendo o navio tremer por todo e rachar no meio, explodindo, deixando a água fria e impiedosa do mar penetrar e vidas serem engolidas por ela, era mais um Titanic.
Neste mesmo instante eu fui puxado para um bote e caí no mar, não me lembro quem me puxou ou se realmente alguém me puxou, só sei que a parir daí minha memória se recusa a me lembrar. O fato é que acordei quase sendo frito vivo pelo sol escaldante do mar, minha pele estava tão vermelha e dolorida que eu parecia uma lagosta. Não havia nenhuma nuvem no céu, tão azul que as vezes parecia negro por causa do sol, eu estava perdido na desolação azul do atlântico.
A noite se aproximava e eu rezava incansavelmente para alguém me encontrar. O sol escaldante se escondia e o frio noturno rasgava minha pele, meu estomago rosnava de fome e eu sentia o gosto do sangue na minha boca, de tão seca, eu lamentava. Naquele momento eu tinha certeza que iria morrer, e lamentava não pela morte, mas pela forma cruel que ela veio me encontrar, mas de tanto chorar e sofrer acabei perdendo as últimas forças que me mantinha acordado, eu desmaiei.
Era manhã quando acordei, minha cabeça doía por algum motivo e eu tinha a estranha certeza de que tinha morrido. Estava em uma ilha, havia arvores, praia e algumas rochas, garças voavam pela areia e o som do atrito das ondas nas pedras preenchiam o ambiente. Pensei por alguns instantes em estar no céu, mas minha cabeça doía demais para isso, e eu não via Deus em lugar algum, a menos que ele fosse uma garça.
Muitas coisas passavam pela minha cabeça naquele momento, a primeira era como eu havia chegado naquele lugar? E onde diabos estava o bote? Mas essas eu acabei por ignorar e substituir pela preocupação em achar algo para que eu não morresse de fome. Comecei minha peregrinação pela ilha adentrando mais em sua mata, não era tão fechada o que permitia entrar sem muitas dificuldades, ao caminhar alguns metros eu notei o barulho de água, e minha sede guiou-me pela selva quase que me controlando, foi aí que as coisas ficaram estranhas.
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Hédon
ParanormalCoisas estranhas acontecem com a mente de um homem na guerra, coisas que mesmo contando com toda honestidade do seu coração, ninguém acreditaria.