O primeiro

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É realmente uma dádiva divina amar. O amor mais puro nos preenche, nos eleva ao melhor de nós e nos divide em dois, três, quatro... O ideal é que ao decorrer de nossos curtos caminhos, achemos alguém que nos desperte essa capacidade de amar, e que nos foi dada como um presente. Às vezes nem percebermos essa nossa sorte, que se esconde dentro do nosso mais profundo. Porém, quando eu era mais nova, achava que não chegaria minha vez. Pensava eu, que não haveria ninguém. Ninguém me dissera sobre esse 'presente'. E então, eu era sem sal, sem gosto, muito desiludida e cheia de ilusões. Não sabia que havia sido presenteada com algo tão lindo, não achava merecer. Tinha a visão que o ser humano ímpio, não poderia sentir algo que fôra feito apenas para os santos, os que não são terrestres. Até que chegada a minha hora, não podia crer. Eu sendo uma criança, claro que não se pode esperar esse amor santo e pleno que prezo. As coisas decorreram da maneira mais clichê comigo, desde o início, até o fim. Começaram como na maioria da vezes na escola, pois o fato de eu ser uma menina solitária não me permitiam uma ampla vida social. Eu estava mais uma vez sendo a novata numa escola depois de mudar a cada ano escolar. Essa era diferente, seus degraus nos levavam ao primeiro andar e chegando lá, parecia o térreo. Havia grandes árvores plantadas no primeiro andar, e no primeiro dia que entrei pelo portão da frente, me senti meio perdida achando que eu tinha subido para o lugar errado. Aquela escola era estranha, e eu não tinha noção das coisas tão marcantes que viveria. Dali, tirei duas grandes amizades que creio não ser para muitos receber. Encaro certas coisas que recebemos da vida com olhos de gratidão, pois os vejo como presentes. Essas duas amizades me deram os melhores momentos, até nos separarmos após o término do ensino médio. Na escola, com ajuda dessas duas amigas, conheci o primeiro que gostei, o Vinícius. Vinícius era o rapaz mais meigo e com feições ternas que já  vi. Alto, moreno, bonito e Deus não aceitou que ele fosse único e o fez gêmeo. Seu irmão seria idêntico a ele, se não fosse o pequeno sinal na sua bochecha direita que os diferenciasse. Eles eram aqueles "Flower Boys" da escola, que todas queriam tirar um pedaço, e todas morriam de ódio por qualquer uma que com eles tivesse o mínimo de amizade. Logo ao vê-los, tive uma queda terrível pelo Vinícius. Se não fosse o jeito que ele me olhou e me encarou, acho que não seria ele o escolhido para ser a minha primeira decepção. Ele tinha um sorriso moleque nos lábios, completamente cheios de vida visto aquela cor avermelhada que eles possuíam. Falou comigo tão naturalmente que já parecia me conhecer antes disso, e mesmo assim, não pude deixar de notar o mais leve sinal de timidez disfarçada pelo seu figido descaramento.
Ele ia me procurar todas as manhãs, no intervalo das aulas com sua tropa de amigos também "Flower boys", me tornando a garota sem sal mais detestada pelas meninas da escola.
Não demorou até nos envolvermos. Vinícius fora a pessoa que me dera vontade de ir a escola, e lembro que tinha coragem para levantar-me todas as manhãs às 5h30, me arrumar, comer em apenas 30 minutos, e pegar dois ônibus todos os dias para ir a aula, embora nos víssemos apenas nos intervalos. Com ele, dei meu primeiro beijo. Ele tinha algo de muito especial no jeito dele, era tímido, mas não era só a timidez que deixava ele especial, era o respeito. Talvez eu deva considerar também que ele gostava de mim, pois na nossa curta "relação" mal nos beijávamos, conversávamos ou nos tocávamos. Costumávamos passar as manhãs juntos com nossos amigos, conversando pouco e sempre de mãos dadas. Ele jamais exigiu nada mais do que isso, coisa que me deixava completamente grata pois apesar da minha pose de sabe-tudo, eu não sabia coisa alguma, mas acho que certas coisas não devem ser muito exigidas a uma pessoa de 15 anos de idade. Eu, muito lenta, mal sabia beijar ou manter uma conversa interessante por conta da timidez.
Após algumas semanas estando com o Vinícius, eu não sabia bem o que era nossa relação. Mesmo assim, resolvi contar para minha mãe e desabafar. Minha mãe sempre fora uma mulher autoritária, daquelas que falam sem perceber que mesmo falando normal, parece estar mandando em alguém. Ela, além disso, sempre fora ciumenta. Minha mãe falava quando eu era mais nova que nem morta ela aceitaria um namorado meu. Mesmo assim, eu pensava muito no Vinícius. Na saída da escola, no ônibus, no caminho de casa, conversando com os vizinhos e amigos, tomando banho, comendo e até.. bem. Fazendo coisas naturais de um ser humano, nada mais ocupava minha mente. Por isso, decidi contar a minha mãe apenas o que eu estava sentindo, e para minha surpresa, ela nem fez questão de dar a mínima importância. Até que um dia o Vinícius parou de me procurar. Ele não ia mais a minha sala de aula, não sentava mais na roda de amigos no intervalo, e me dava um frio "Oi" ao passar por mim. Eu ainda era filha da minha própria mãe, me manti firme e orgulhosa fingi não me importar. Não falava mais com ele ao passar e mal cumprimentava seus amigos. Não queria quem não me queria. Meu complexo de inferioridade me deixava muito atenta a entender que eu não era o suficiente, e eu não oferecia a relação que ele queria e nem ele chegaria a tentar me forçar.
Acabado meu curto relacionamento bobo, porém que me deixou ainda mais cheia de complexos que antes, eu não era a felicidade em pessoa, e nem a mais infeliz. Costumava viver eu e minha família com simplicidade, ou melhor dizendo, com a pobreza que pode causar vergonha aos menos orgulhosos. Éramos apenas eu, minha mãe, meu irmãozinho com pouco mais de quatro anos e meu pai, numa casa em que não tinha água, luz e que tudo era feito à base do improviso. Essas duas últimas coisas como sabemos, são essenciais para a sobrevivência da evolução, e com o improviso brasileiro, minha mãe conseguiu alguém no bairro que dava aquele jeito que se paga pouco, ou nada, melhor dizendo. Quem resolvia essas questões em casa era sempre minha mãe. Meu pai, estava sempre trabalhando para nos trazer o pão, ou dormindo, pelos dias e noites perdidas que ele passava trabalhando. Eu sabia que nada que eu fizesse poderia mudar algo, mesmo assim não podia deixar de lamentar. Via as necessidades em aperto e aqueles que deveriam proteger a mim e a meu irmão sofrendo conosco.

Eu me perguntava todos os dias ao dormir e ao acordar qual era a minha missão aqui e para quê viver. Para quem. Me ajoelhava diante minha cama, e com aquela dor profunda sem entendimento e explicação, chorava por muito tempo. Ouvi de alguém bem mais velho e sábio algo que eu sei que você vai compreender também. Todo ser humano carrega uma dor dentro de si. Pode ser por quaisquer motivos, ou até mesmo sem saber exatamente do porquê, ela está lá, pulsante em nós. O interessante é procurar possibilidades que nos tragam paz, mansidão, plenitude em coisas que nos fazem feliz. Para muitos não é o suficiente, tanto que num grande ato de covardia, esses tiram as próprias vidas. Dizem por aí que para cometer o suicídio tem que ter muita coragem. Coragem para enfrentar a dor, o medo de onde vai ou não vai, o fato de causar algo a alguém... Entretanto a verdade é que é em si um ato covarde. A pessoa que tem coragem de tirar a própria vida, não é corajoso o suficiente para viver.
E

u sabia exatamente o que me causava infelicidade. Sabia que havia mais de um motivo e os separava em coisas que podia e não podia mudar. Para as que eu não podia mudar por questão de estarem no passado, eu chorava em lamentação. Por aquelas que eu sabia que podiam ser mudadas, também chorava e me lamentava. Por essas eu chorava com ansiedade e por não entender qual o caminho certo para mudá-las. A solução que eu me dera fôra tentar fazer amizades, ler livros em maior quantidade e estudar como únicas formas de distração. Com isso, surpreendentemente obtive respostas positivas em questão da "dor".

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⏰ Última atualização: Dec 30, 2019 ⏰

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