A rodovia dos imigrantes estava engarrafada demais. Era terça-feira, duas horas da tarde, sem ser férias ou feriado. Os vidros do carro da família Villar estavam fechados, enquanto usufruíam do ar-condicionado ligado no máximo. Edgar Villar tamborilava os dedos nervosamente sobre o volante, olhando de relance para o relógio de pulso. 14h 02. Qualquer um odiaria ficar preso no trânsito, mas Edgar não conseguia se quer suportar. Ao sentir um toque delicado no seu braço direito, virou-se automaticamente para olhar a figura miúda de sua esposa, Vivian. Ela sorriu fracamente, afagando de leve o braço do marido.
— Logo, logo, estaremos em casa. – Edgar não pode conter o revirar de olhos. Ele sabia que não era tão logo, mas ergueu minimamente o canto dos lábios, suspirando fundo. — Pelo menos as crianças estão quietas.
As crianças não eram exatamente crianças, mas para todo pai e mãe, seus filhos seriam seus eternos pequenos. Pelo menos era assim que Vivian Villar pensava. Ela olhou para o banco de trás, vendo seu filho mais novo de 14 anos dormir com a cabeça encostada no vidro e sua filha mais velha, olhando a paisagem fixa do lado de fora, visto que o trânsito continuava.
— Camila, está tudo bem?
Camila suspirou. Ela definitivamente não queria estar naquele carro indo para São Paulo. Odiava aquela cidade, por mais que “as oportunidades de crescimento fossem maiores”. Por deus, ela queria voltar para sua antiga casa em Itajaí, Santa Catarina, mas infelizmente seu pai fora transferido para São Paulo, e como ela ainda tinha 17 anos, não emancipada e sem ser capaz de se sustentar sozinha pois não trabalhava, ali estava ela, dentro do carro. Camila olhou a mãe e forçou um sorriso.
— Claro mamãe, estou bem.
É claro que Vivian não se convenceu daquela resposta, afinal aquela era sua filha e ela a conhecia muito bem, mas não a questionou. Camila nunca foi de se abrir na frente dos outros, diferente do seu filho mais novo, Luiz.
— Mãe, a gente já chegou? – Luiz disse com a voz grogue de sono, esfregando os olhos.
— Não, estamos em um engarrafamento. – explicou — Vocês querem água?
Enquanto via sua mãe entregar a pequena garrafa plástica ao seu irmão, Camila checou seu celular discretamente pela milhonésima vez durante aquela viagem. Por que Pedro não respondia mais?
A história de Camila e Pedro não era antiga, mas para ela era como se fosse. Desde a sétima série (oitavo ano) era apaixonada por Pedro Bueno, um garoto de cabelos castanho claro e olhos da mesma cor. Na sétima série ele era tão franzino que se ele perdesse um pouco mais de peso, Mila imaginava que ele fosse sair voando ao mais leve dos ventos. Hoje em dia, o garoto tinha mais massa muscular pelos treinos diários de handebol e sua dedicação a academia.
Mas eles não eram um casal.
Eram melhores amigos.
Camila Villar nunca assumiu seus sentimentos pelo garoto, tão pouco deixou transparecer que o amava. Ela sabia que ele a amava, mas era daquele jeito que quando ela ouviu, sua vontade foi de se esconder e nunca mais sair do buraco. “Amo você Mila, é a melhor amiga que eu poderia ter.”
Ela estava na friendzone, e aparentemente nada poderia tirá-la de lá.
Olhou novamente para o telefone, suspirando. Pedro Bueno teria que se explicar, ô se teria!
— Mila, posso jogar no seu celular? – Camila sorriu minimamente, desviando a atenção para seu irmão. Ela sabia que após o péssimo desempenho acadêmico dele no bimestre, seus pais haviam tirado o telefone dele. E o vídeo game. E o tablet. E qualquer outra coisa que Edgar e Vivian pudessem imaginar que Luiz pudesse usar para se divertir. Ela entregou o celular para o irmão, desistindo finalmente de esperar por uma mensagem.
Horas mais tarde, eles finalmente chegaram em São Paulo e Camila finalmente estava no que seria sua nova casa. Era um prédio localizado na Conceição, próximo ao terminal Jabaquara na Zona Sul da capital. Havia uma estação de metrô à 500 metrôs do apartamento, motivo pelo qual Edgar escolheu alugar ali. Quando entrou no apartamento, haviam tantas caixas que Camila quis chorar.
— Bem-vindos ao novo lar crianças! – Edgar parecia extremamente feliz, arrastando sua mala até onde Mila imaginou onde seria seu quarto.
— Filha, seu quarto é aquele de frente com a porta do banheiro. Luiz, o seu é o que está ao lado do banheiro.
Luiz correu para o seu quarto para abrir a janela. A vista não era lá muito bonita. Tinha prédios comerciais que atrapalhavam a visão, mas para ele, era importante morar num lugar alto.
— Legal. – foi a única coisa que disse, afinal moravam no quarto andar.
Camila levou suas coisas até seu quarto. As únicas coisa que não haviam levado da antiga casa eram as camas e o guarda-roupas, que era embutido. Havia uma pilha de caixas com seu nome escrito no canto do quarto, mas pelo menos sua cama estava livre.
Ela se deitou, sentindo o colchão diferente do que estava acostumada. Na hora ficou incomodada.
— Mila, seu celular tá tocando. – ela rapidamente se levantou e pegou o aparelho da mão do irmão.
O nome Pedro Bueno brilhava na tela.
— É melhor você ter bons motivos para não ter me respondido Pedro!
Ele riu. Ah, aquela risada...
— Desculpa Mila, eu juro que estava treinando. – ela respirou fundo, o ouvindo. — Jamais ignoraria minha melhor amiga.
E ali estava a maldita.
A maldita friendzone.
— Eu pensei que você estivesse chateado. Não sei. Meu pai simplesmente foi transferido para dar aulas em São Paulo e eu tive que vir. – disse ela após fechar a porta de seu quarto. — Eu não queria ter vindo Pê, você sabe disso.
— Eu sei Mi. – ele só a chamava de Mi quando queria falar algo que julgava ser delicado. — Confesso que fiquei chateado. Não sei quem vai tomar sorvete no shopping comigo, ou simplesmente comer um camarão nA Beira Rio. – Camila segurou as lágrimas, pensando nos bons momentos. — Mas é uma ótima oportunidade pra você Mi... Você poderá fazer uma faculdade ótima e de graça! E quem sabe depois de formada você não volta? Prometo ir te visitar sempre que possível aí. Afinal, combinamos que iríamos juntos ao show do Maroon5.
Camila riu minimamente. Maroon5 era a banda favorita deles.
— Sim, você tem razão. Eu já sinto sua falta Pê.
— Sinto a sua também Mila. – ele suspirou — Tenho que ir, a gente se fala por mensagem, ok? Beijos!
— Beijos Pê.
Quando a chamada terminou, Camila olhou para as caixas.
Era melhor ela começar a desempacotar rápido, assim teria mais tempo livre depois.
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Camila
RomanceCamila jamais esperava que fosse sair da cidade que tanto amava e ir para a cidade grande, mas ali estava ela, começando uma nova vida em São Paulo. Triste por ter deixado seus amigos para trás, Mila começa a tentar aceitar sua nova vida, mas ela n...