Capítulo único

939 139 154
                                    

Aquele definitivamente não era o melhor dia para se levantar da cama, constatei assim que botei meus pés no chão e analisei a imagem que refletia do espelho gigante do guarda-roupa. Fios de cabelo apontavam para todas as direções, meus olhos inchados mal abriam e ainda tinha o prêmio maior, uma espinha gigante que surgiu bem no queixo, de uma hora para outra. Definitivamente era o fim. Aquela segunda-feira macabra prometia ser praticamente um filme de terror, contando que eu seria o personagem principal, claro.

Eu estava horrível!

Me sentia a própria reencarnação da noiva do Chucky, ou Annabelle, como preferirem. Pois eu não sabia afirmar qual me representava melhor naquele instante.

— Você tá um bagaço. — falei para mim mesma e soltei um grunhido nada feminino.

Minha autoestima era quase inexistente e eu nada podia fazer, além de tentar cobrir aquela espinha horrenda com maquiagem. Mesmo sabendo que pareceria um choquito branco, porque, obviamente a protuberância não sairia com maquiagem, no máximo camuflaria a vermelhidão. E isso não era nada animador.

Me arrumei como pude, molhei os cachos e tentei dar algum tipo de glamour ao meu cabelo. Mas era uma batalha perdida, ele não iria me obedecer. Meu cabelo tinha vida própria e fazia o que bem entendia, não era possível controlá-lo.

Por sinal, eu bem queria ter aqueles cachos de embaixadora da Salon Line; porém, eu estava mais para o que tiver de ser será. Assim sendo, resolvi fazer um coque alto, peguei meus óculos de grau — claro, desgraça pouca é bobagem, esse ser humano ainda precisava ser míope pra acabar com tudo de uma vez — e terminei de me arrumar como pude.

Torcendo para não encontrar nenhum conhecido nas ruas, era isso ou tirar os óculos e fingir demência. Tipo: Me perdoe, não te vi, sabe como é, estava sem óculos!

Entretanto, de nada adiantaria, visto que a pessoa continuaria vendo o estado deplorável que eu me encontrava naquela manhã.

Não havia para onde correr, era um daqueles dias que até Murphy se compadeceria de mim. Peguei minha bolsa e, resignada, saí de casa. Parando na padaria que tinha a caminho do meu trabalho. Era rotina, eu sempre tomava meu café da manhã no mesmo lugar, era barato e gostoso e eu não via o porquê trocar minha padaria preferida.

De modo que, entrei e me sentei em uma mesa mais afastada, torcendo para não encontrar ninguém por ali. Todavia, não demorou nem alguns segundos e alguém chamou minha atenção. Eu sempre era atendida por Sakura, éramos quase amigas íntimas. Contudo, naquela manhã detestável, não foram os olhos acolhedores e gentis da minha atendente favorita que me fitavam curiosamente. Ousei levantar o olhar minimamente, para descobrir de quem se tratava o indivíduo, e meu queixo foi ao chão.

Olhos azuis cristalinos, como duas piscinas me olhavam amorosamente. Enquanto a pele bronzeada contrastava com os cachinhos dourados do rapaz.

Uau!

Espera, de novo, uau.

— Bom dia, posso ajudar? — sua voz reverberou pela padaria e eu quase me encolhi na cadeira.

Qual é? Eu estava só o bagaço, o pó da rabiola, o fiapo do pão, a capa do Batman. Tinha dia melhor pra um gato desses surgir no lugar super confort que eu escolhia pra tomar meu café?

Suprimi um gemido de tristeza e enfiei a cara no cardápio. Mesmo sabendo de côr o que eu queria. Afinal, eu fazia o tipo que pedia o de sempre. Sakura saberia disso, mas aquele outro, com cabelos encaracolados e olhos questionadores não parecia entender que eu era cliente vip ali.

— Hã... — enrolei, tentando ganhar tempo. Aliás, para disfarçar meu estado de nervosismo. Se ele me visse horrível e com àquela espinha monstruosa na cara, eu nunca mais teria chances. — Acho que quero um café com pouco leite e uma rosquinha de creme.

Açúcar ou adoçante?Onde histórias criam vida. Descubra agora