Prólogo

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Uma das coisas que eu sempre odiei, é ter que acordar cedo. Mas graças aos privilégios de minha profissão, essa já não é uma opção para mim. Quando meu despertador toca, já são onze horas, e eu abro os olhos grata, pela vida que tenho agora. Percebo, pela bagunça no quarto, que Eric já saiu. Ele também não tem um horário fixo, mas gosta de chegar cedo ao trabalho, uma das inúmeras coisas que eu nunca entenderei sobre ele. Levanto, ainda nua, devido a noite de ontem, e procuro no quarto alguma surpresa, algum indicio de que ele tenha lembrado que dia é hoje. Mas nada. Visto meu robe, e vou até a cozinha, na esperança de que, quem sabe ele tenha feito alguma surpresa comestível. A surpresa, é a bagunça que ele deixou, assim como em todo o lugar por onde ele passa. Desisto, e aceito o fato de que esse ano, será como no ano passado. Ele provavelmente se esqueceu do nosso aniversário de namoro. Ele sempre me diz, que é uma atitude extremamente idiota comemorar esta data, se já estamos morando juntos. Eu também acho isso, em parte, mas como uma romântica incorrigível, é difícil não esperar algo especial. Um anel de noivado, seria pedir demais? Bom, eu sei que para Eric, seria. Nesses quatro anos de namoro, eu sei que a perspectiva de um casamento deveria ser totalmente anulada, pois Eric é um típico londrino que jamais pensa em se casar. Para ele, a vida que levamos está ótima. Sem um anel no dedo, “a coleira”, como ele diz. Só que as vezes, a gente cansa de ter tanta expectativa e acabar com apenas frustração. Vou para o banheiro e fico quase meia hora na banheira, pensando se entrego ou não o presente dele, que está escondido em meu closet desde o mês passado. Uma camisa, que eu desenhei e confeccionei especialmente para ele. Decido que só entregarei, se ele me der algum presente também. Me arrumo, o mais rápido possível, pois não quero me atrasar para o almoço que marquei com Rachel, meu braço direito no ateliê que sou dona. Escolho um vestido básico preto, de minha criação, assim como todas as minhas roupas são, botas baixas de cano longo, e um casaco de veludo. Me olho no espelho, e desfaço o coque de meus cabelos, que caem em volumosas ondas, até a minha cintura. Estou ótima, penso. Enquanto passo um pouco de blush, não consigo deixar de pensar em como tanta gente gostaria de ter uma vida tão perfeita quanto a minha pelo menos aparenta ser. Tenho o ateliê de moda mais famoso de Londres. Saio em quase todas as revistas de moda, moro na rua Blenheim Crescent, a mais cara do bairro Kensington, que é também considerado, o bairro mais caro para se morar. Tenho um namorado, que segundo a revista Look! (a mais vendida) é considerado o homem mais bonito e elegante de Londres. Pode não parecer, mas é mera coincidência o fato de meu namorado, ser dono da maior rede de grifes, onde minhas coleções são sempre vendidas, e lançadas. Mesmo tendo alcançado tudo que eu desejava, sempre sinto uma sensação de vazio enorme, que nem todo o dinheiro do mundo é capaz de preencher. Essa sensação, eu sei que vem do meu passado. Uma parte da minha vida que eu luto para enterrar, mas que está ganhando cada vez mais força dentro de mim. Olho pela janela, e vejo que o tempo está bom hoje. Decido ir de metro para o centro, mesmo ciente de que, de carro eu demoraria metade do tempo. Pego minha bolsa, um guarda-chuva por precaução e saio de casa. Rachel pode esperar um pouco, pois eu preciso de uma caminhada. Andar até a estação é um trajeto pequeno, mas o suficiente para eu poder pensar um pouco em minha vida antiga. Coisa que eu não faço, por algum motivo que eu desconfio ser medo. Nasci e cresci na cidade de Brighton, que fica cerca de duas horas de Londres. É uma cidade pequena, porém acolhedora, e o que mais sinto falta de lá, são as pessoas, e o verão. Eu tinha uma vida pacata, e convencional em Brighton até que aos 15 anos, conheci Jack Lanster. A partir daí, enormes coincidências aconteceram comigo, me fazendo abrir mão de tudo o que eu tinha. Me fazendo consequentemente chegar onde estou agora.

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