Após a chegada da Estrada de Ferro Oeste de Minas e a instalação de oficinas no Arraial do Divino Espírito Santo, várias famílias se mudaram para a localidade. Como as casas próximas à Matriz eram mais valorizadas, e recebendo suas moradias de própria EFOM, os forasteiros se estabeleceram nas cercanias da Estação e da "beira da linha". Assim a cidade crescia em dois pontos, no Largo da Matriz, no alto do morro, e na beira da estrada de ferro. Esses povos eram diferenciados por si mesmos: Povo da Estrada e Povo do Largo. Pensamentos, trabalho, situação financeira, social e diversos outros fatores diferenciavam os dois tipos de moradores do arraial.
O Povo do Largo já estava estabelecido na região havia tempos, era um pessoal mais conservador, mais fechado e viviam tipicamente do comércio ou de pequenas criações de animais. O Povo da Estrada era um povo que vinha de não se sabe onde nem como. Essa gente era mais liberal e mais alegre que o pessoal local. Viviam dos trabalhos oferecidos pela Estrada de Ferro e orgulhosamente contavam com seu ordenado garantido no fim da semana. Esse pessoal era olhado com certa prevenção pela população local.
Certa vez, no ano de 1905, chegou nestas paragens um Circo de Cavalinhos, que se estabeleceu a frente da Igreja Matriz. Tal acontecimento levou alegria a todos os moradores, sem distinção. Foi prometida uma enorme festança em razão do raro acontecimento que tanto mexia com a vida deste povo. O Sr. Francisco Machado Gontijo, que já possuía seus sessenta e tantos anos e era o Juiz de Paz do arraial, chefiou seus "Bate-Paus" com a finalidade de policiar o Circo. Essa atividade reunia os mais importantes e conhecidos moradores da localidade, todos sem exceção, moradores do Largo.
Num momento, o "bate-pau" Pedrinho Carneiro e o ferroviário Alfredo Rocha entraram em desavença e foram advertidos pelo Sr. Francisco Machado. A confusão parou por ai, pelo menos por alguns instantes. No fim do espetáculo, o Povo do Largo logo tratou de voltar para suas casas. O Povo da Estrada não fez o mesmo, e alguns arruaceiros continuaram a se embebedar, cantando e dançando aos berros: "Polícia não quer que eu sambe aqui, mas é aqui que eu hei de sambar!" Num dado momento sacaram suas armas e iniciaram um tiroteio enorme. Um dos tiros foi logo acertar a porta da casa do Sr. Francisco Machado. No dia seguinte, o Sr. Francisco tratou de punir os ferroviários pela baderna. Passou para o Sr. João Severino de Azevedo o cargo de Juiz de Paz e tratou logo de abrir um inquérito contra os baderneiros. Um processo levou 14 ferroviários até Itapecerica para responder à júri. Foram todos absolvidos, mas o fato serviu para alimentar a desavença entre o Povo da Estrada e o Povo do Largo. Em razão do fato, foi mandado da capital, Belo Horizonte, o primeiro destacamento policial para essa localidade, compostos de um cabo dois soldados.
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CENTRO (FAR)WEST MINEIRO
Short StoryComo dois âmbitos diferentes de uma pequena vila do centro-oeste mineiro se confrontaram. Baseado em relatos reais.