Por mais clichê que pareça, estava chovendo. O céu nublado trazia consigo o vento forte e as gotas finas, meu olhar desceu até o caixão que guardava o corpo jovem e pálido enquanto entrava mais e mais no fundo buraco. Sete palmos agora pareciam sete metros. Olhei em volta, escutando o murmúrio das árvores se balançando enquanto meus olhos alcançavam todos ali. O conselho mais útil que já recebi sobre pregar em um funeral de alguém é: "Não pregue o céu para ele. Não pregue o inferno para ele. Apenas pregue o evangelho para as pessoas que estão lá". Este princípio captura nossa tarefa independentemente do tipo de funeral que fazemos. Ironicamente, embora nos concentremos em lembrar e celebrar a vida do falecido, o serviço funerário é, em última instância, para aqueles que participam dele. Não para o morto, mas sim para o vivo. E quem disse que eu sabia porra alguma sobre o evangelho?
Nunca presuma que as pessoas saibam que o sofrimento é apropriado ou que elas sabem como lidar com o sofrimento simplesmente falando sobre o ente querido que morreu. Na verdade, muitos não querem falar sobre eles por causa da dor sentida na perda. E eu era uma dessas pessoas no momento. A mesma que estava prestes a discursar sobre a morte do meu próprio irmão.
Limpei a garganta e só assim percebi que havia um microfone grudado à minha boca, suspirando falhamente.
-Hoje, pela primeira vez, compreendi a dor que existe na perda, o verdadeiro peso de um adeus definitivo. Parece impossível a compreensão da simples ideia de que jamais voltarei a escutar a sua voz, jamais voltarei a ver o seu sorriso... -Paro por alguns segundos, encarando minhas mãos e me recompondo.- É difícil pra mim pensar que dentro de pouco tempo não vou poder contar com a presença de alguém que teve uma influência tão positiva na minha vida. Pois é, por muito que nos julguemos fortes, quando chega a hora de dizermos adeus a alguém que amamos todos percebemos como somos frágeis e como tudo pode mudar de repente. Hoje me despeço de uma pessoa que me marcou e que fez de mim alguém melhor. É injusto e muito triste a vida acabar assim para quem tinha ainda tanto para dar. Todas as palavras de homenagem são pouco para aquilo que você foi. Até sempre e descanse em paz, Park JiHyun.
Minhas pernas tremiam, eu não queria continuar ali, não daquele jeito, não frágil assim. Nunca. Nunca na frente dos outros. Eu não tinha muito controle sobre o que estava fazendo, mas não conseguia parar, passei por cada pessoa naquele lugar, ignorando o chamado fraco da minha mãe. Comecei a correr, fugindo de tudo aquilo. A visão embaçando, meu peito queria explodir e meus pulmões queimavam. Eu não aguentaria mais daquilo, nunca mais!
Senti um baque. Estava frio e, do nada, quente. Mas era confortável ao mesmo tempo, me senti bem por milésimos segundos. O cheiro. O cheiro era de JiHyun. Me sentia aquecido como entre as cobertas num dia frio, com uma xícara de café na mão. Só então abri os olhos e percebi que não era ali onde eu estava, estava molhado, com as barras da calça e os sapatos sujos de lama, o terno amassado e os olhos inundados, me sentia fraco. Mas me sentia protegido...
-Está ficando louco?? Você ia em direção à floresta! -A voz intensa me assustou, seus braços me apertavam e me mantinham junto a si.
-Você veio...
Foi a única coisa que saiu da minha maldita boca.
-Jimin, está me escutando? -Subi meu olhar, o encarando. Os fios castanhos e úmidos caíam sobre sua testa, ele suava e me olhava preocupado. Me afastei, assentindo.
-O que faz aqui, JungKook? Você sumiu durante dias! Desde que.... -Parei bruscamente, engolindo em seco.-
-Cada um tem o seu jeito de lidar com as coisas, e eu lidei do meu. -Ele voltou a se aproximar, prendendo meu olhar no teu. Por alguns segundos senti meu coração acelerar de uma forma desconfortável. Isso nunca tinha acontecido.
-Você cheira a ele.. -Minha voz o assustou, ou minhas palavras o fizeram.
-Você também. -O sorriso apareceu, seu sorriso era inevitavelmente engraçado, era fofo.
-Sinto falta dele... -Eu não conseguia acompanhá-lo, não conseguia sorrir.
-Todos sentimos, Jimin.
-Não. Vocês não entendem. Ele era meu irmão gêmeo! Não fazem ideia do quanto a dor é ainda maior. Você era só o namorado dele! Você pode apenas amar outra pessoa.
Sua feição se fechou e eu me senti frio novamente, JiHyun sempre dizia que eu devia tomar cuidado com as minhas palavras, eu sou um grande idiota.
-Jungkook, eu não..
-"Só"? "Apenas"? É verdade, eu era "somente" aquilo. E por isso eu deveria amá-lo menos que você, certo? Por isso minha dor não deve ser sentida? -Seus olhos me percorreram, ele se perdeu por alguns segundos.- JiHyun era tudo o que eu tinha, nunca mais diga que eu posso simplesmente esquecê-lo.
Minhas lágrimas não paravam, eu me sentia culpado, frustrado, triste, com raiva, insuportável, qualquer tipo de coisa, tudo menos feliz. Meu peito doía, eu não queria mais, não queria voltar pra casa e ver o vazio do quarto ao lado do meu, sentir o cheiro dele e não vê-lo lá. Não aguentaria voltar de novo.
-Ele não vai voltar mais, não é?
Eu o encarei por tempo demais, o suficiente para ter a minha resposta, esta que só se mostrou no seu olhar. Minhas pernas perderam as forças, meus joelhos cederam e se dobraram ao chão, então eu deixei sair, deixei sair tudo o que eu havia segurado nessa última semana. O mundo.
JungKook se ajoelhou e me segurou em seus braços, eu gritei, chorei, chamei por ele, por Deus, por qualquer um que pudesse trazê-lo de volta naquele momento. Mas ninguém podia. Ele não ia voltar mais, nem sequer por um segundo eu escutaria sua voz ou sua risada de novo. Nunca mais.
-Shh. Vai ficar tudo bem, vai passar. Eu estou aqui com você. -JungKook sussurrava enquanto eu tentava me controlar, foram minutos inteiros chorando de forma descontrolada, coisa que eu não fazia desde os sete anos.
Aos poucos meu corpo foi se acalmando, o corpo quente me protegia e eu me sentia bem com isso, mas não devia. Me afastei o necessário para encarar o céu, foi o suficiente para ver a quantidade de pessoas que estavam ali, nos assistindo. Minha mãe me encarava com o rosto inchado, meu pai igual a ela, eu fugi durante todo esse tempo, tentando mostrar força e lhes dar a resistência que precisavam, agora eu havia estragado tudo. Minha dor estava exposta e estava maior do que tudo já sentido por mim antes. E eles estavam vendo.
Aos poucos as pessoas se dissiparam, a chuva engrossava e os raios relampeavam no céu. Minha mãe se aproximou e nos ajudou a levantar, me apoiando em si, JungKook a ajudou logo depois. Andamos até o carro, mas eu me sentia flutuar, me sentia pesado como uma rocha que flutuava sobre a terra.
-Jimin? Jimin!!! -Escutei-a gritar, logo depois a voz de JungKook e a de meu pai a acompanharam. Eu sentia tudo pesar, minha visão escurecia e o som de tudo se tornava nada.
Tudo isso até eu apagar.
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A Flor de Dália
Fanfiction|JiKook| O falecido irmão gêmeo de Park Jimin deixou para trás muitos assuntos inacabados, e um deles era Jeon JungKook.