CAPÍTULO 10 HORTÊNCIA

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CAPÍTULO 10.

HORTÊNCIA.

Choveu toda a noite, tranquei bem minha janela e deitei me acomodando de baixo do edredom quentinho e macio, bloqueando qualquer tipo de pensamento do vulto que vi nas árvores. Acordei no dia seguinte ouvindo o canto dos pássaros e nem um sinal de chuva.

Abri a porta e a brisa da manhã me beijou a face, reverenciei o sol brilhante a minha frente. Eu tinha tudo programado em minha mente do que eu iria fazer. Iria explorar minhas terras e, procurar pela mina era prioridade.

Eu tinha um trato com Artur, mas ele ainda estava muito debilitado e não poderia me ajudar, coloquei calça jeans calcei minha galocha azul para proteger meus pés, não quero ariscar levar uma picada de cobra ou qualquer outra coisa. Camisa de manga longa para me proteger do sol, chapel e estava pronta, passei a mão no mapa decidida a desbravar cada pedacinho daquele lugar.

ALGUNS DIAS DEPOIS. 

Eu estava exausta, mas feliz, tinha encontrado a mina e me deliciei com a água pura e fresca estava bem escondida no meio da propriedade o antigo dono foi muito cuidadoso com esse pedaço de terra.

Ele construiu uma base de concreto em volta da saída da água em forma de círculo bem parecido com uma moringa de barro, colocou um cano para direcionar a água, deixando mais fácil o acesso.

A água cai do cano em uma pequena lagoa que deve ter se formado com o tempo formando um córrego que tenho quase certeza que vai para o rio. Em volta de toda aquela umidade existe uma vegetação delicada, poejo e hortelã dividem seu espaço com o agrião.

 O poejo e o hortelã tem um cheiro mentolado, os dois são da mesma família a diferença entre eles é as folhas: o poejo tem a folha miúda e a hortelã tem as folhas largas e redondinha, em ebulição com água quente tornam chás deliciosos. 

 Também tem quem goste da hortelã na comida, por exemplo: no quibe ou sucos de abacaxi, o agrião é uma folha gostosa que bem lavadas dá pra fazer uma salada deliciosa, suas folhas em conjunto com mel e limão forma um xarope caseiro ótimo para curar tosse. Eu sei o que estão pensando uma médica que acredita em plantinhas? Sim eu acredito! Por exemplo eu trocaria uma aspirina por uma xícara de chá de camomila, mas não vamos exagerar cada caso é um caso.  

Antes de escolher qual área da medicina eu iria cursar eu fiz uma pesquisa na internet e descobri que antigamente os clínicos gerais atendia seus pacientes nas casas e não no hospital.  O consultório era na própria casa e eu fiquei encantada, eles se dedicavam a cuidar das famílias, as pessoas se adoentavam e chamavam o doutor que vinha prontamente.

Nos dias de hoje mesmo se você pagar, ele não vai na sua casa, aquele contato íntimo com o paciente não existe mais, ficou no passado.

A dois dias atrás descobri a causa de os telefones não funcionar nessa região, o lugar é muito baixo e pra piorar tem um aparelho na Santa Ana que bloqueia o sinal, quem me deu essa informação foi o rapaz do posto de gasolina.

Mas na cidade eu iria conseguir principalmente perto do banco, ele resolveu me ajudar porque ficou sabendo que eu tinha tirado um menino das garras de um peão da Santa Ana.

E foi o que eu fiz voltei a cidade e debaixo da marquise do banco consegui falar com meu pai. Quando ouvi a voz do meu pai no telefone me emocionei, ele queria saber como eu estava, se estava feliz, se já tinha começado a plantar minhas flores, eram tantas perguntas ao mesmo tempo que fiquei tonta.

Jamais iria dizer a ele que estava triste, que fui parar em um lugar da idade da pedra, ele iria vir no mesmo dia me buscar, resolvi esconder todas as informações doloridas e contar só as boas: que o lugar é lindo o povo hospitaleiro, não deixava de ser verdade?

Perguntei da minha mãe ele disse que ela se faz de durona, mas que está morrendo de saudade, não sei se devo acreditar nisso. Quando eu estava com eles ela mal falava comigo, nunca tinha tempo. Com certeza meu pai estava mentindo.

-Sua mãe perguntou se me ligou para pedir ajuda ou se estava voltando, respondi a ela que isso não aconteceu.

Não é orgulho, mas não vou dar esse gosto a ela de me ver derrotada com o rabo entre as pernas, não importa o que vou passar nesse lugar, nunca voltarei atrás. 

-Cezar não se conforma que deixou o hospital e não se despediu dele?

Revirei os olhos na mesma hora que meu pai falou. -Fui até a sala dele aquele dia, mas ele estava atendendo um paciente não quis incomodar, e quanto menos Cezar souber da minha vida melhor. Ele tem que entender que nosso namoro acabou a muito tempo que não pretendo reatar.

-Não quis irritá-la apenas estou comentando. -Não parece. Apesar da insistência dos meus pais em querer me casar com ele, eu não vou. Eu irei escolher meu marido, eu fui apaixonada por Cezar, era encantada por ele o achava: lindo, inteligente, mas com o tempo a convivência percebi que não tínhamos nada em comum. Nossos espíritos são diferentes, e por uma obra do destino descobri cedo, se não hoje estaria casada com ele e completamente infeliz.



Pedi para o meu pai esquecer o assunto Cezar da conversa que o foco era outra, expliquei a ele que eu precisaria ter uma conta no banco da cidade.  Passei o nome do banco as informações corretamente e dela mesmo ele abriu uma conta em meu nome e transferiu o dinheiro me garantiu que depositária uma quantia todo mês que não precisaria me preocupar.

Aluguei um caminhão pipa para retirar a água da mina e distribuir na vila para os moradores, comprei mais medicamentos, Artur estava se recuperado, a mãe estava bem, e eu feliz muito, feliz.

Convoquei os moradores da vila no meu sítio para uma pequena reunião, propus um negócio a eles, eu precisava de trabalhadores para me ajudar a lidar com a terra, eles receberiam por semana.  Eles ganhavam dez reais por dia, mas eu pagaria cinquenta, trabalhariam de segunda a sexta e ainda teriam um lugar para construir uma horta comunitária, eles concordaram com tudo que eu ofereci.

A vila levava o nome de vila dos esquecidos e sabem porque, só havia homens idosos, mulheres pessoas com alguma deficiência, crianças menores de seis anos, grávidas, os filhos adolescentes e os maridos trabalhavam na Santa Ana.

Seu José me contou algumas coisas interessantes sobre o trabalho na Santa Ana. Funciona mais ou menos assim, o trabalhador ganha dez reais ao dia, um pacote de arroz dentro da Santa Ana custa vinte cinco reais, resumindo eles sempre irão dever para o fazendeiro. Ficarão neste ciclo vicioso até ficarem velhos e serem jogados na vila sem benefícios e aposentadoria a palavra correta era trabalho escravo.

Tudo que eles compram é marcado numa espécie de caderneta, cada funcionário tem a sua, muitos se deixam levar pelo vício da cachaça dificultando ainda mais a vida da família, preferem a cachaça em vez de comprar alimento.

Outra coisa preocupante é o desaparecimento das pessoas, seu José disse que ocorrem com frequência, os filhos e os maridos saem para o trabalho, mas não retorna. Isso é comum nas grandes metrópoles, sequestros, mortes, mas aqui nesse fim de mundo, será que eles fogem da fazenda por causa das dívidas e vão embora em busca de um futuro melhor?



O Cheiro do pecado completa.Onde histórias criam vida. Descubra agora