Regina arrastava Bernardo pelas cabanas e tendas montadas pela praça. Ela caminhava empolgada pela feira, estava em busca de uma atração em específico: uma cartomante!
- Rê... – Implorou, cansado. – Que tal deixarmos toda essa besteira de lado e irmos comer alguma coisa?
- Olha! – Ignorou o garoto e o conduziu até uma tenda no fundo da praça. – Eu disse que tinha uma cartomante por aqui.
- Regina... – Suspirou. – Não quero gastar com essas baboseiras.
- Não é baboseira! – Ofendeu-se. – Só porque você não acredita, não quer dizer que não seja legitimo. – Cruzou os braços. – Há muito mais entre o céu e a terra do que sonha a nossa vã filosofia, meu caro!
- Citar Hamlet não autentica nada. – Riu.
- Ora essa... – Encarou-o. – Ria, ria. – Revirou os olhos enquanto falava. – Os homens são assim; não acreditam em nada.
- Por acaso está tentando usar Machado de Assis contra a minha pessoa? – Sorriu para a garota, ele sabia que ao reconhecer de quem era a citação, ganharia alguns pontos extras com ela.
E Bernardo tinha razão! Pois, assim que mencionou o aclamado e clássico escritor brasileiro, viu a fisionomia dela mudar. E sem conseguir se conter, Regina riu e o abraçou.
- Eu simplesmente amo o conto "A Cartomante"!
- E é daí essa cisma com cartomantes, mulher? – Gemeu.
- Na verdade, fui a uma mulher na semana passada e ela simplesmente adivinhou o motivo da consulta antes mesmo que eu lhe dissesse o que era! – Suspirou arrepiada com a lembrança. – E já adianto que não era pelo motivo pelo qual costumo ir, portanto, não pode me dizer que ela adivinhou porque sou previsível!
- Tá... – Observou-a de soslaio. – E qual era o motivo?
- Bom... – Respirou fundo. – Quando eu fui até ela, a mulher apenas começou a botar as cartas e disse: "A senhora está com problemas amorosos...". Na hora, confessei que sim. – Remexia nas madeixas soltas, nervosa. – Ela combinou as cartas e no fim declarou que eu tinha medo de que o meu amor me abandonasse.
- Bobagem! – Bufou.
- Não diga isso! – Nervosa, agarrou os braços do garoto. – Se soubesse como eu tenho andado angustiada... – Murmurou chateada.
- Rê... – Envolveu-a nos braços. – Quantas vezes eu preciso lhe jurar o meu amor? – Sorriu e beijou-lhe o topo da cabeça.
Logo depois, pegou-lhe nas mãos e prometeu que os seus sustos pareciam de criança. Mas que, em todo o caso, quando tivesse algum receio, a melhor cartomante era ele mesmo! Não era preciso gastar dinheiro com uma charlatã por aí.
E assim que a sentiu acalmar, acabou por repreendê-la. Disse-lhe que parasse de procurar por tal tipo de aconselhamento. Afinal, o que Rui pensaria dela se soubesse que estava fazendo algo assim?
- Ele sabe... – Segredou e o viu arregalar os olhos antes que continuasse a falar. – E não se importa. Rui sabe dos meus receios e não liga...
- Como assim? – Soltou-a de imediato e deu um passo para trás, surpreso.
- Vamos nos divorciar... – Sussurrou triste.
- Como é que é? – O coração disparado mostrava a gravidade do susto.
- Desde que me apaixonei por você, eu não pude mais ser a mesma com ele. – Choramingou. – Tentei, juro que tentei! – Disse agoniada. – Mas sentia tanta culpa por traí-lo que simplesmente não pude continuar. – Engoliu em seco. – Eu contei que estava apaixonada por outro. Revelei que o medo de perder esse novo amor era tanto que estava enlouquecendo!
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O Coringa Cigano
Short StoryEste é o conto que entrou para a antologia "Copas - Um Rei, um Valete, uma Rainha" da editora Iluminare. O texto é 100% de autoria minha, no entanto, a antologia foi organizada pela escritora Thais Caldeira e pela antologista Ceiça Carvalho.