Diavolo já não podia compreender sua própria existencia, havia enfrentado tantas sensações horrendas diferentes, até mesmo doenças das quais nunca ouviu falar foram motivos de sua morte eterna. O que era sua essência afinal? Esteve preso nesse lopping por longos anos agora e nada mudava... Andava por entre uma multidão de pessoas, perdido em pensamentos vazios sobre sua própria existência. Seus olhos já não pareciam mais o mesmo, o verde característico parecia apagado, como se sua alma tivesse morrido a muito tempo, mas não quisesse abandonar o corpo, nem mesmo as pessoas em passos apressados esbarrando pelo corpo do homem o faziam acordar. Estava perdido, apenas esperando sua próxima morte pacientemente.
Foi então que algo chamou sua atenção, algo que o fez acordar para o pouco de sanidade que ainda lhe restava.
"Chefe... me ligue como você costumava fazer. Eu me sinto perdido, eu preciso das suas ordens."
A voz parecia prencher a mente de Diavolo, era tão familiar quase como ouvir a si mesmo. Não se lembrava muito bem de sua "primeira vida", quando tudo ainda era normal e seguia de acordo com seus planos, se lembrava vagamente de um homem de cabelos brancos da qual matou, e o loiro que o amaldiçoou no final de tudo. Mas algo atingiu sua mente como uma flecha perfurando seus pensamentos presos, os deixando sair.
Fora Diavolo que matou o homem naquela praia?
Seus olhos se arregalaram, já estava a algum tempo paralisado pela sensação estranha de uma mistura de ansiedade e medo que invadia seu corpo, e só agora havia percebido seu estado. Levou uma das mãos ao rosto, sentindo um pouco do suor da ansiedade escorrer pelo seu rosto, o fazendo recobrar um pouco de sua consciência. E então, Diavolo se virou, ignorando todos ao seu redor, levando seu olhar ao garoto de cabelos rosados a sua frente, tão familiar quanto olhar para o espelho e ver seu próprio reflexo.
Os pensamentos pareciam transbordar pelo seu olhar assustado, como se tudo oque havia guardado por todos esses anos agora voltassem a realidade. Ele conhecia muito bem aquele garoto, tanto quanto conhecer a si mesmo. Claro, afinal compartilhavam o mesmo corpo.
"...Doppio?"
Murmurou ainda incerto, acreditando que aquilo não se passava de uma ilusão de sua consciência perdida sobre as trevas da insanidade. Mas era real, era como se tudo ao seu redor tivesse congelado, e até mesmo o garoto a sua frente parecia assustado com oque via. Doppio nunca viu seu chefe naquele estado, ele parecia extremamente debilitado e isso quebrada seu pequeno coraçãozinho sensível.
"Chefe... Oque aconteceu com você? Oque aconteceu... Com a gente?"
O garoto parecia receoso ao falar, e enquanto dava passos sorrateiros em direção ao homem que tanto se importava, seu corpo esitava no mesmo instante, fazendo-o tremer um pouco pela ansiedade e incerteza de que aquilo era real. No final das contas, nem um dos dois sabia dizer oque era real ou não.
Doppio nunca teve essa experiência antes, dividia o próprio corpo com seu chefe desde que nasceram, era como se olhar pelo espelho, olhar para algo que conhecia tão bem que poderia citar todos os trinta sinais que seu corpo tinha como nascença. O garoto se aproximou o suficiente para tocar o rosto assustado e pálido de seu chefe, o vendo reagir minimamente pelo susto do toque, este que estava estático desde que havia dito algo.
Doppio o observava com atenção, sua expressão claramente preocupada com Diavolo, se perguntando mentalmente por quantos traumas ele havia passado para estar naquele estado. O mais alto fechou os olhos, suspirando fundo e finalmente reagindo a aproximação, segurando a mão pequena de Doppio e o afastando um pouco de seu corpo, mas sem solta-la. Encarou por alguns milésimos a mão que segurava, não acreditando que agora poderia tocar diretamente seu alter ego, aquele da qual sempre considerou algo precioso.
"Doppio, oque você faz aqui? Naquele dia... Eu senti sua presença se esvair, você não deveria estar aqui... Eu fui amaldiçoado a muito tempo, e você... Não deveria passar por isso também, não você."
Foi então que o garoto havia finalmente compreendido a situação. Diavolo havia sido amaldiçoado para uma morte eterna, e Doppio foi mandado para acabar com tudo aquilo. Aquela seria sua primeira morte reencontrando aquele que tanto amava, e talvez tivesse forças para continuar depois disso. Encarava os olhos mortos de seu chefe, mas que pareciam ganhar um pouco de vida a cada segundo que passava ao seu lado naquele momento. Por alguns segundos também havia se perdido em pensamentos, e tudo oque conseguiu fazer foi encarar profundamente os olhos de Diavolo, como se pudesse enxergar sua alma quebrada em seu reflexo.
"Chefe, eu senti sua falta... Eu não sou a pessoa capaz acabar com tudo isso... Eu te procurei por tanto tempo, e aqui está você... Aguentou por tanto tempo... A julgar pela sua reação ao me ver, você ainda tem forças para continuar, mas é doloroso, eu sei... Me perdoe por demorar, eu nunca fui de fazer isso..."
Um pequeno riso foi solto, e Diavolo reagiu positivamente ao abrir um pequeno sorriso com seu adorável Doppio que sempre se preocupava com seu mestre. Ah, como havia sentido falta dessa sensação de estar completo novamente, era como se tudo oque tivesse passado tivesse valido a pena naquele momento. Nunca pensou que conseguiria ver e tocar um Doppio em um corpo separado, e essa sensação o trazia esperança de poder descansar, finalmente. Agora sim ele poderia dizer que aquilo era realmente obra do destino.
"Então você realmente morreu?"
Diavolo perguntou após alguns segundos calado, pensando se deveria realmente dizer aquilo, apesar de ser um fato. Se Doppio estava ali, então não era ele de verdade, e sim seu espírito.
"Isso não importa mais... Eu pedi para que me deixassem te ver uma última vez, apenas para fazer oque deveria ter sido feito a muito tempo, mas o fato de estarmos no mesmo corpo atrapalhou..."
Dito disso, o garoto se aproximou um pouco mais, levando ambas as mãos ao rosto do mais alto, onde o acariciou discretamente antes de puxa-lo um pouco para baixo, fazendo com que a distância entre ambos fosse mínima. Diavolo não esperava por aquilo, e não soube muito bem como reagir. Para quem olhasse de longe, sabendo sobre sua história, talvez fosse um pouco estranho esse afeto que ambos tinham, mas na cabeça de Diavolo era algo totalmente puro.
Era oque lhe restava de bondade, uma vez que nunca faria mal algum a Doppio.
Ambos sorriram ao tocar os narizes, finalmente selando um beijo simples e carinhoso, totalmente carregado de sentimentos que os dois compartilhavam a muito tempo, indiretamente. As mãos do chefe foram de encontro a cintura de Doppio, o puxando um pouco mais para perto, e pela primeira vez em anos ele se sentia feliz e completo, sentimento que fora quase extinto quando Giorno o amaldiçoou para sempre.
"Eu prometo vir te ver sempre que possível, mas você sabe que é difícil te encontrar..."
O mais baixo sussurrou contra os lábios do outro, sentindo o aperto na cintura se estender para um carinho discreto. Diavolo sabia muito bem oque aquilo significava, e ele com certeza iria aguentar por mais algum tempo até vê-lo de novo, e talvez o ciclo se repetiria assim.
Pensando por esse lado, toda a tortura que Diavolo viveu nesse looping já não importava mais, se no final pudesse ver seu precioso Doppio.
Ambos voltaram a se afastar, e quando o mais alto percebeu, a expressão de Doppio já não era mais tão feliz. Ele estava triste e angustiado, e tudo só piorou quando sentiu sua garganta rasgar em uma dor insuportável. Diavolo havia cuspido uma flor, pela primeira vez em tanto tempo iria morrer desse jeito?
Levou uma de suas mãos ao pescoço, sentindo mais uma daquelas flores rasgar sua garganta até conseguir sair pela boca, cuspindo sangue junto a dor estridente. Voltou a encarar Doppio, que já tinha lágrimas nos olhos, mas Diavolo não estava triste.
"Se for para te ver, eu consigo aguentar essa eternidade desse jeito"
Um sorriso estampou seu rosto antes de uma grande quantidade de flores sair, avisando sobre sua morte naquela realidade. Seu corpo foi ao chão, mas agora ele se sentia forte para continuar.
Afinal, a vantagem de ver seu querido Doppio daqui em diante era apenas um bônus. Algo que o fazia extremamente feliz depois de tanto tempo.
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Dissoluto na insanidade
FanfictionDiavolo estava a tanto tempo naquele looping que sequer conseguia pensar Não se lembrava de muita coisa, apenas esperava pela sua próxima morte pacientemente, porém algo o fez recobrar sua consciência, depois de tanto tempo.