Após algumas rápidas explicações, toda aquela multidão se deu por satisfeita e resolveu se retirar. Como ainda era bem cedo, supus que voltariam a dormir.
Quando o corredor ficou vazio, exceto por mim e minha mãe, adentrei meu quarto, seguida de perto por ela que não parava de tagarelar coisas como "pensei que fosse morrer", "você não pode voltar a fazer isso", "quase enlouqueci", mas minha mente vagava, pouco atenta a tantas palavras.
Segui diretamente à janela e observei o sol que, preguiçosamente, começava a nascer. Uma brisa fresca soprou de forma repentina e beijou meu rosto, fazendo-me sorrir. Parecia um beijo de Jake...
Lancei um olhar para minha escrivaninha e encontrei o papel em que havia desabafado mais cedo, pela madrugada, ainda repousado no mesmo lugar em que o tinha deixado. Tomei-o nas mãos e apertei-o entre os dedos.
Mamãe estava sentada em minha cama ainda a tagarelar, mas agora falava sobre um jantar e nossa futura partida de volta para casa. Encarei-a por um tempo e assenti, fingindo que prestava atenção em tudo o que dizia. Em seguida, virei o corpo para frente e voltei a focalizar o papel escondido em minhas mãos.
_ Não é mesmo, Clara? – incitou-me ela a falar.
_ Sim, é mesmo. – murmurei, rezando para que minha resposta não assentisse algo absurdo, como "aí você se torna líder comigo, não é mesmo, Clara?".
_ Afinal, um jantar para nos despedirmos será bem legal e... – voltou a pensar alto.
Suspirei, aliviada. Ótimo, era apenas sobre um jantar...
Estiquei o braço e abri uma das gavetas da escrivaninha. Agora aquele papel seria esquecid...
Perdi a cor. Por entre as várias folhas acomodadas de forma desordenada dentro da gaveta, uma em tom prateado me chamou a atenção. A profecia...
Senti os dedos serem atraídos a ela. Após tantos acontecimentos, tinha até me esquecido deste segredo... Seria o momento de revela-lo à mamãe?
_ Ok, Clara? – a ouvi falar ao fundo, mas não respondi. Estava paralisada.
_ Mãe... – sussurrei incerta.
_ Lucy? – de repente, papai invadiu o quarto. – Ana está procurando por você feito uma louca!
Entendi aquilo como um sinal. Fechei a gaveta no mesmo instante e virei-me para encarar os dois.
_ O que ela quer? – pediu mamãe ficando de pé.
_ Que você a encontre na cozinha. Ela precisa de ajuda com o café. Parece que alguém invadiu a dispensa ontem e acabou com tudo o que estava preparado. – meu pai envolveu a cintura de minha mãe com um dos braços e sorriu. Desviei os olhos para que não vissem em minha expressão a sentença "culpada por devorar toda a comida durante a madrugada". – Marcel e eu também fomos convocados a ajudar.
_ Ah! E Clara foi liberada deste trabalho? – reclamou ela, fingindo indignação.
_ Aceite que sou especial, mãe. – brinquei, piscando.
_ Especial nada. Você vai ajudar Nani a varrer a grama que circunda o palácio. – avisou papai gargalhando, enquanto ficava de costas e saía de meu quarto.
_ O quê? – exclamei.
Mamãe riu e seguiu seu marido.
_ Viu, filha? Especial.
_ Não! Não quero ser especial! – reclamei, correndo atrás dos dois. – Pai, troque comigo, por favor! Não gosto de varrer folhas.
_ Pare de reclamar, mocinha. – ouvi outra voz soando atrás de mim. Virei, envergonhada. Era Nani.
_ Me deixe cozinhar! – implorei.
Ela riu, apressando o passo para segurar minha mão.
_ Vamos pegar as vassouras, ande.
Suspirei, mas não contive a vontade de sorrir.
_ Tudo bem... – murmurei.
Por fim, me rendi e fui trabalhar.
VOCÊ ESTÁ LENDO
O Ciclo de Sangue - A Escolha da Herdeira (livro 02)
FantasyClara tem 16 anos e já treina com os Luminescentes desde que se entende por gente. Entretanto, não é bem isso que seu coração deseja. Vivendo insatisfeita, Clara se revolta e muda de lado, surpreendendo e desestabilizando a todos, inclusive sua mãe...