77º Capítulo - Clara

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Após algumas rápidas explicações, toda aquela multidão se deu por satisfeita e resolveu se retirar. Como ainda era bem cedo, supus que voltariam a dormir.

Quando o corredor ficou vazio, exceto por mim e minha mãe, adentrei meu quarto, seguida de perto por ela que não parava de tagarelar coisas como "pensei que fosse morrer", "você não pode voltar a fazer isso", "quase enlouqueci", mas minha mente vagava, pouco atenta a tantas palavras.

Segui diretamente à janela e observei o sol que, preguiçosamente, começava a nascer. Uma brisa fresca soprou de forma repentina e beijou meu rosto, fazendo-me sorrir. Parecia um beijo de Jake...

Lancei um olhar para minha escrivaninha e encontrei o papel em que havia desabafado mais cedo, pela madrugada, ainda repousado no mesmo lugar em que o tinha deixado. Tomei-o nas mãos e apertei-o entre os dedos.

Mamãe estava sentada em minha cama ainda a tagarelar, mas agora falava sobre um jantar e nossa futura partida de volta para casa. Encarei-a por um tempo e assenti, fingindo que prestava atenção em tudo o que dizia. Em seguida, virei o corpo para frente e voltei a focalizar o papel escondido em minhas mãos.

_ Não é mesmo, Clara? – incitou-me ela a falar.

_ Sim, é mesmo. – murmurei, rezando para que minha resposta não assentisse algo absurdo, como "aí você se torna líder comigo, não é mesmo, Clara?".

_ Afinal, um jantar para nos despedirmos será bem legal e... – voltou a pensar alto.

Suspirei, aliviada. Ótimo, era apenas sobre um jantar...

Estiquei o braço e abri uma das gavetas da escrivaninha. Agora aquele papel seria esquecid...

Perdi a cor. Por entre as várias folhas acomodadas de forma desordenada dentro da gaveta, uma em tom prateado me chamou a atenção. A profecia...

Senti os dedos serem atraídos a ela. Após tantos acontecimentos, tinha até me esquecido deste segredo... Seria o momento de revela-lo à mamãe?

_ Ok, Clara? – a ouvi falar ao fundo, mas não respondi. Estava paralisada.

_ Mãe... – sussurrei incerta.

_ Lucy? – de repente, papai invadiu o quarto. – Ana está procurando por você feito uma louca!

Entendi aquilo como um sinal. Fechei a gaveta no mesmo instante e virei-me para encarar os dois.

_ O que ela quer? – pediu mamãe ficando de pé.

_ Que você a encontre na cozinha. Ela precisa de ajuda com o café. Parece que alguém invadiu a dispensa ontem e acabou com tudo o que estava preparado. – meu pai envolveu a cintura de minha mãe com um dos braços e sorriu. Desviei os olhos para que não vissem em minha expressão a sentença "culpada por devorar toda a comida durante a madrugada". – Marcel e eu também fomos convocados a ajudar.

_ Ah! E Clara foi liberada deste trabalho? – reclamou ela, fingindo indignação.

_ Aceite que sou especial, mãe. – brinquei, piscando.

_ Especial nada. Você vai ajudar Nani a varrer a grama que circunda o palácio. – avisou papai gargalhando, enquanto ficava de costas e saía de meu quarto.

_ O quê? – exclamei.

Mamãe riu e seguiu seu marido.

_ Viu, filha? Especial.

_ Não! Não quero ser especial! – reclamei, correndo atrás dos dois. – Pai, troque comigo, por favor! Não gosto de varrer folhas.

_ Pare de reclamar, mocinha. – ouvi outra voz soando atrás de mim. Virei, envergonhada. Era Nani.

_ Me deixe cozinhar! – implorei.

Ela riu, apressando o passo para segurar minha mão.

_ Vamos pegar as vassouras, ande.

Suspirei, mas não contive a vontade de sorrir.

_ Tudo bem... – murmurei.

Por fim, me rendi e fui trabalhar.

O Ciclo de Sangue - A Escolha da Herdeira (livro 02)Onde histórias criam vida. Descubra agora