"Mãe, eu juro que se você me deixar ficar, quando você chegar, essa casa vai estar brilhando" implorei fazendo um sinal com a mão.
"Manuela, eu sei que é difícil pra você, pro seu pai também está sendo, faça isso por ele, é a primeira vez em dez anos que ele resolveu voltar pra praia".
Papai sofreu demais com a morte da vovó, foram anos difíceis, mas agora ele quer voltar. Não vamos ficar na casa dela, acho que seria mais difícil ainda, vamos ficar em um resort beira praia, eu só estou indo por ele.
"Vamos Manu!" Meu pai gritou, aparentemente ele estava feliz.
(Coloque a música do capítulo)
Sempre escutávamos Elvis nas viagens para a praia, era quase uma tradição, mas o carro estava em total silêncio, só escutava o vento que passava pelo vão da janela aberta pela mamãe, mas de repente um som familiar começou a tocar, era "Jailhouse Rock" do Elvis. Meu coração se encheu de alegria quando escutei aquele começo, o Rei do Rock estava presente nas viagens novamente, meus pais começaram a cantar e eu só fiquei olhando pela janela.
"Vai Manu, essa parte você conhece" mamãe gritou em cima da música.
"Eu não lembro como era" menti.
"Deixa de ser adolescente Manuela" papai falou enquanto batia os dedos no volante no ritmo da música.
"Let's rock everybody, let's rock" comecei a cantar.
"Everybody in the whole cell block" mamãe continuou.
"Was dancin' to the Jailhouse Rock" e papai terminou.
"Number forty-seven said to number three
"You're the cutest jailbird I ever did see
I sure would be delighted with your company
Come on and do the Jailhouse Rock with me"" cantamos juntos.
E foi assim que chegamos na praia. Ver aquela vista de novo era tão bom, parece que era aquilo que eu precisava para me sentir completa outra vez. Tantas recordações. Minha vó fazia parte de um grupo para ajudar animais marinhos e eu sempre ajudava quando podia, acho que vou procurar esse grupo novamente, quem sabe eu dou orgulho a minha avó com isso.
Chegamos no resort e ele era lindo, não era tão grande, mas era cheio de natureza, tão aconchegante. Subimos para o quarto, deixei minhas malas na cama e fui ver a varanda. Quando abri a porta me deparei com a melhor vista, era tão lindo, o mar era tão azul, quase não dava para saber o que era céu e o que era água. Sorri lembrando da minha vó, agora eu entendo o motivo dela ter ficado nessa praia, era tão ela. Notei algumas pessoas nadando na piscina do resort, outras indo para a praia -o que eu estou fazendo aqui ainda?-, passei protetor e sai correndo em direção a porta, minha vontade era de sair por aí e não voltar -mas não foi bem isso que aconteceu-
"Onde a mocinha pensa que vai?" minha mãe parou na frente da porta
"A mãe eu quero ir pro mar" falei batendo o pé no chão e cruzando os braços como uma criança
"E você acha que vai sozinha? É isso?"
"Mãe, eu conheço essa praia de olhos fechados"
"Quando você tinha seis anos. As coisas mudam" disse arrumando meu cabelo
"Confia em mim, eu vou ficar na frente do resort, eu juro" entrelacei os dedos
"O que você acha Marcos?" Perguntou ao meu pai
"Acho que ela já pode se virar sozinha, mas quero que fique na frente do resort"
"Tá bom pai, amo vocês" coloquei a mão na maçaneta
"E mais uma coisa" continuou minha mãe "nós vamos tomar café aqui e encontramos você lá"
"Tá bom mãe, tchau" sai do apartamento e fui para o elevador.
Chegando na praia vi que não tinha tanta gente, então fui direto pro mar. Dez anos que não sentia aquela água. As ondas batiam em mim, antes elas eram mais fortes, acho que era porque eu tinha apenas seis anos.
Olhando para o mar lembrei que minha vó falava que Iemanjá morava no fundo do mar, eu achava que ela era uma sereia, só agora eu entendo que ela é uma orixá das religiões Candomblé e Umbanda, uma deusa.
"Como suas águas são bonitas Iemanjá" falei baixinho "Sabia que minha vó e meu vô se apaixonaram nessa praia? Você deve saber, já que você decide o destino de quem entra no mar... ela sempre falava isso" sorri
Fiquei um tempo sentindo a água vir em minha direção enquanto ia cada vez mais para o fundo, parei quando a água bateu em minha cintura. A água era tão transparente, dava para ver algumas conchinhas.
"Que concha bonita" alguém falou do meu lado.
Olhei e era um garoto, ele se abaixou para pegar a concha, não consegui ver seu rosto, apenas o cabelo, era castanho, um pouco comprido, não chegava a bater no ombro.
"Acho que é a coisa mais bonita que eu já vi" ele levantou sorrindo e olhando pra concha, arrumou seu cabelo molhado "Você não acha?" Me olhou e mostrou a concha, sua expressão mudou, ele olhou para os meus olhos "acho que eu mudei de ideia" sorriu e eu corei. Que sorriso lindo, não só o sorriso.
"Ela é bem bonita mesmo" sorri.
"Toma, pode ficar, ela combina com você" disse ainda olhando para os meus olhos "Ela tem a cor do seu cabelo" sorriu "são lindos".
"Obrigada" corei novamente, coloquei uma mecha do cabelo para trás da orelha, sorri e peguei a concha. Ela realmente era muito bonita "nunca tinha visto uma concha ruiva" ele deu risada com o meu comentário.
"Você é daqui?"
"Gostaria de ser, mas sou de São Paulo, você é daqui?"
"Sim, eu sou" sorriu
"Que sorte" sorri
"Aliás, qual é seu nome?"
"Me chamo Manuela e você?"
"Nathan, prazer" sorriu e estendeu a mão
"O prazer é todo meu" apertei a mão dele
Ficamos nos olhando por alguns segundos sem perceber que ainda estávamos de mãos dadas -sabe quando alguém da um aperto de mão demorado, foi igual, porém, não percebemos isso na hora-, depois de uns dez segundos soltamos as mãos, percebi que ele ficou envergonhado, eu estava exatamente igual a ele.
"É... eu... eu acho que já vou indo... a gente se vê Manuela" sorriu e colocou a mão na nuca.
"A gente se vê" sorri envergonhada e ele se virou para ir embora.
Voltei a olhar pro mar -o que acabou de acontecer?- comecei a rir. Virei em direção a areia e vi meus pais, sorri e fui até eles
VOCÊ ESTÁ LENDO
É sério isso Iemanjá?
RomanceO verão nunca foi o mesmo depois que a vovó se foi. Quando eu era criança, ir pra praia, na casa dela, era a melhor parte das férias... mas já fazem 10 anos que eu não vou pra lá depois do que aconteceu... Esse ano meus pais resolveram ir, fiz d...