Capítulo IV - O segundo tripulante

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Acordei indisposto. Pensei tanto sobre o meu passado na noite passada que minha mente teve dificuldade para descansar. Levantei. Reparei nas cortinas sujas do meu quarto, como me irritava ver aquilo! Me arrumei e saí. Já haviam várias pessoas no corredor, prontas para seus treinamentos. cada um era treinado para uma experiência diferente.

Eu não tive dificuldades para passar pelo treinamento, tratei tudo como se fosse o condicionamento físico que aprendi com Marmatol anos atrás. O rapaz de boina e cabelo azul veio até a minha direção, meu quarto fica no fim do corredor.

— Olá Kairós! como foi o papo com o capitão Moore ontem? Imagino que tenha sido bom, o Capitão comentou que se impressionou ao ver você subir de posto tão rápido.

— De fato, foi um bom papo. Ele me contou sobre a vida dele, hoje é a minha vez.

— Então, novamente eu lhe desejo boa sorte!

Agradeci ao rapaz, que me deixou na sala do Capitão. Sentei e contei toda a minha história para Edward Moore. Ele me ouviu atentamente.

— Meu jovem, a sua história é emocionante. Vejo aqui na sua ficha que seu crime foi matar um homem e esconder o corpo. Você não me contou o porquê.

— Eu não posso contar. Mas eu não tive escolha, e não foi minha culpa.

— Tudo bem, não estamos em um interrogatório. Vou te apresentar ao seu colega de viagem. Vamos até a sala de reuniões, ele já está lá.

Caminhamos até a sala de reuniões, e no caminho eu e o Capitão fizemos total silêncio, não trocamos uma palavra sequer. Minhas expectativas estavam elevadas, Quem iria atravessar o buraco negro comigo?

Moore abriu a porta e dentro da sala estava um rapaz, aparentava ser muito inteligente.

Melhor não julgar pela aparência. - Pensei.

—Prazer, meu nome é Mikhail.

Não fazia sentido ele estar na prisão. Para os leitores de antes da terceira guerra mundial, aquela que destruiu a Terra, pode ser difícil compreender, mas Mikhail é um nome russo. A Rússia era uma das maiores potências mundiais depois do Brasil, graças à quantidade de água que esses países possuíam. Os descendentes de russos e brasileiros são os mais ricos que restaram graças à esse fato. O que um homem rico estaria fazendo numa prisão de baixo nível?

— Meu nome é Robert Kairós. O prazer é todo meu.

— Eu já sei o que você está pensando só pelo jeito como me olhou.

— O-o q-quê?! C-como assim?!

—Relaxa, cara. É normal as pessoas dessa prisão me estranharem pelo nome russo. A gente vai se conhecendo melhor e eu explico tudo certinho.

Vamos ali na cozinha comer alguma coisa.

Ele se virou, e meus pensamentos começaram a trabalhar.

Que cara mais convencido! Tomara que a gente se dê bem. Acho que eu me acostumo.

Foi então que o Capitão Moore sussurrou no meu ouvido:

— Ele é meio convencido, mas vocês vão se dar bem. Você se acostuma.

— Capitão, você leu meus pensamentos! Literalmente! — Falei de olhos arregalados e me segurando para não gritar pela coincidência.

O Capitão riu.

— Acho que isso faz de mim um leitor de mentes...— Disse rindo.

Então entramos na cozinha, cada um de nós sentou em uma cadeira. O Capitão nos trouxe carne bovina, um alimento caro demais para prisioneiros, mas como hoje era nosso dia de honra, merecíamos comida da melhor qualidade. Vinho refinado, foi posto em nossos copos, para fazermos um brinde.

— Um brinde ao nosso projeto!— bradou o Capitão.

— Um brinde!

— Um brinde!

Tomamos um belo gole de vinho, pois não era comum termos esse tipo de coisa para beber.

— Então, Capitão, quando será a nossa viagem?— Perguntou Mikhail

— Em breve. Daqui a duas semanas. Preparem-se...

— Me preparar para quê? Para a morte certeira? Você, capitão, está nos mandando para dentro de um buraco negro, e ainda quer que fiquemos, felizes?— falou grossamente, Mikhail

— Ora, Eu fiz todos os cálculos, tem tudo para dar certo. Pare de reclamar!

— Tudo bem. Mas não exija que eu fique feliz com isso.

Ao dizer isso, Mikhail fechou a cara. O banquete ficou com um ar pesado. Terminamos de comer e de beber, nos despedimos, e fomos para nossos quartos.

No dia seguinte, encontrei Mikhail no corredor. Ele me chamou para conversar.

— Kairós, você não pode ir nessa viagem.

— Mas, por que você diz isso? mesmo que eu não quisesse ir, não teria como fugir, estou dentro de uma prisão!

— Me escute. Precisamos dar um jeito de fugir daqui.

— Esse lugar não tem saída! Você está fazendo papel de idiota!

— Nós vamos sofrer muito se entrarmos naquele buraco negro.

— Como você sabe? Nós nem entramos ainda...

— Eu apenas sei. Nunca ninguém voltou vivo de um buraco negro, por que nós seríamos os primeiros?

— A ciência possibilita muitas coisas. Muitas primeiras vezes. Essa pode ser uma delas. Além disso, nós vamos morrer de qualquer jeito. Não há como evitar, então é melhor morrer aceitando.

— Esse é seu problema Kairós. Você é um homem que apenas se deixa levar, nunca faz nada.

— Eu acredito no poder da resistência...

— Não adianta nada acreditar na resistência e quando precisar, não ser uma.

Ao dizer isso, Mikhail me deu as costas, me confirmando que ele era um verdadeiro convencido. Ah! como odeio gente esse tipo! A minha certeza de que iríamos nos dar bem foi por água abaixo. Passamos o resto da semana trocando insultos.

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