O Centauro

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Quando o viu chegar, sentiu o coração disparar quase que dolorosamente.

Percebeu-se tão frágil, tão vulnerável e transparente, mas em vez de envergonhar-se daquele tipo de nudez, teve orgulho. Como se a paixão que o deixava tão a mercê do outro fosse o que de mais admirável vibrava em seu interior.

Depois da troca insípida de “ois”, jogou-se nos braços do homem que mais amou na vida. Recostou a cabeça no peito dele, sentiu o cheiro tão seu conhecido, e constatou que estava muito mais intenso do que o normal. Perfumou-se mais, quase exagerou. Sentiu-se envaidecido e esperançoso. “Perfumou-se para me ver. Há de me perdoar! Nunca mais, amor da minha vida, nunca mais. Deixa eu te provar o quanto sou teu.”

Sentiu o abraço afrouxar. Não, não, ainda não. Mas o outro queria somente lhe tirar os óculos gentilmente como sempre fazia antes de beijá-lo.

O beijo. Era um universo que se abria e o fagocitava, uma zona misteriosa, macia, úmida, de línguas tão sincronizadas como se fossem da mesma pessoa.

“Estava com saudade do teu beijo.” Não se conteve.

O outro apenas riu e tornou a beijá-lo.
As camisas ficaram pelo caminho até o quarto e as bermudas e cuecas, ao pé da cama. Como era diabolicamente bom estar com ele.

“Tem usado camisinha?”

Silêncio. Não conseguia raciocinar direito.

“Não acredito que não esteja usando camisinha. Amor, essa cidade... Amor, não, não quero que pense que quero voltar. Essa cidade tá cheia de carimbadores e...”

“Eu não tenho usado camisinha porque não tenho ficado com ninguém.”

“Por que não? Agora você pode.”

“Não quero.”

O que eu quero é você. Sempre! Gritou em pensamento com todas as forças.

“Tá bom. Quer fazer sem?”

“Só com você.”

“Confia?”

"Não importa!”

Como era incrível a sensação de estar fisicamente dentro do homem que se ama. Como era imensa a emoção de saber o prazer do outro proporcional ao seu. “O homem que mais amei na vida... Amei não. Amo!”

Enquanto o penetrava, curvou-se e sugou-lhe o mamilo ilhado por pelos finos. Como era bom ouvir os gemidos de prazer do seu homem.

Unidos mais uma vez depois da separação abrupta, os dois seguiram juntos, entranhados, confundidos, entre suspiros, grunhidos, palavras desconexas, até a explosão final de prazer, que os separou por segundos dentro da própria individualidade.

Depois, a inevitável sensação de orfandade ao retirar-se do ser amado. Que foi logo apagada, quando o outro o puxou para si, convidando-o a descansar a cabeça em seu largo peito peludo.

“Precisamos conversar!”

Silêncio.

"Eu não quero mais voltar.”

"Eu te amo!”

“Não, não ama! Quem ama não faz o que você fez.”

"Amo. E sei que você me ama também.”

"Ninguém precisa de alguém para ser feliz!”

E veio uma sequência de frases, cujo sentido real, o infeliz apaixonado só alcançaria algum tempo depois.

“Você quer que eu fique com você por pena? Sou muito jovem, tenho muito o que aproveitar da vida. Agora eu sei o que meu ex passou, eu ia para casa dele e ficava chorando, implorando para voltar. Daquele eu realmente gostei. Nossa, é muito chato quando alguém fica implorando sentimento do outro. Você vai ver, é muito melhor ficar só... Tem um filme que eu vi...”

Mas o desgraçado se recusava a ouvir, se recusava a ver o sorriso cruel do outro. Fechava-se numa ideia fixa: “Ele ainda me ama”.

“O que você disse?”

"Que você me ama!”

"Se falar isso de novo, nunca mais vai me ver. A gente pode se encontrar muito de vez em quando para transar, mas sem compromisso.”

“Amanhã?”

“Amanhã o quê?”

"Nos vemos?”

Suspiro aborrecido.

“Pode ser.” E já foi se levantando e catando as roupas no chão.

"Já vai?”

“Preciso.”

"Fica mais um pouco.”

"Se eu ficar, amanhã não nos vemos.”

“Tudo bem então."

“E nada de me mandar mensagem de áudio chorando! Até mostrei para a Dinah no trabalho. Falei para ela que se ela sentir um fedor é para vir aqui para ver se você se matou.” A risada desproporcional foi uma perversidade desnecessária.

Mais tarde aquela frase soaria na cabeça do outro como um sino de Basílica.

Viu o ex-namorado lhe virar as costas e partir, mas se consolou, tentando se convencer de que amanhã estariam juntos de novo.

"Ele me ama. Está magoado. Mas com o tempo reconquisto.”

No outro dia, ainda no trabalho, mandou mensagem.

“Que horas nos vemos?”

“Não vou poder!” A resposta não tardou.

"Mas é que vou viajar depois de amanhã...”

“Que parte você não entendeu da frase ‘não vou poder’”?

Sentiu os olhos arderem, o sangue afluir-lhe para o rosto e lhe esquentar as orelhas. Pediu licença aos colegas.
Nunca o banheiro lhe pareceu tão longe.

No reservado, primeiro vomitou; depois, cessadas as ânsias, chorou, tomando o cuidado para não fazer barulho.

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⏰ Última atualização: Feb 20, 2020 ⏰

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