Capítulo 4

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E se a outra opção for desistir, vou permanecer vulnerável

Selena Gomez — Vulnerable

  Um quarto para as seis da tarde e o sol parece não querer tréguas com a noite, assim como a vida parece não querer me dar um desconto. Estou destruído, completamente acabado depois de uma reunião de duas horas e meia sobre um atraso de dois dias. É, duas horas e meia por dois dias, a situação é grave. Tão grave que parei o trabalho que comecei a uns minutos para pensar, estou de frente para janela, vendo uns tantos aranha-céus reluzindo ao brilho dos céus enquanto busco por uma solução, uma que devia ter há três dias, segundo Joseph Spurs e Lee Chang, os donos e os prejudicados com o atraso da decoração do Salaski.

A Akira Arte projetou o Salaski há dois anos e foi nossa maior conquista em quase dez anos de mercado. Foram inúmeras noites de desenho, manual e gráfico, inúmeros detalhes, ideias de última hora, várias folhas físicas tanto como gráficas desperdiçadas para dar vida a primeira etapa de algo extraordinário. Sem querer me gabar, mas já aproveitando a oportunidade, o projeto foi liderado por mim e mais quatro arquitetos da empresa, demos o melhor fazendo valer os anos de estudo e vendemos o nome da minha empresa para o país, assim como os nossos claro.

Com a projeção do Salaski, tanto os arquitetos quanto a empresa entraram oficialmente no mercado da Arquitetura. Ganhamos mais trabalhos depois disso e começamos a prestar consultoria para grandes empresas. Também assinamos um memorando com uma universidade local, disponibilizando estágios aos estudantes de arquitetura e artes. E com isso temos uma boa propaganda, mas com a fama vem uma grande responsabilidade. O Salaski nos chamou novamente, desta vez, para decorar o edifício recém-acabado pela multinacional de construção portuguesa EngES. O acordo era bom, o prazo também, então aceitamos.

Entretanto, o acordo maravilhoso tornou-se uma pedra no meu sapato, um fardo que como dono da empresa sou obrigado a carregar e a arcar com a culpa. E sim, a culpa minha, não nego. Há uns meses perdi o único funcionário capaz de maravilhar os donos do Salaski com suas ideias muito bem conjugadas de decoração. O designer de interiores Enzi Baakir. Ele trabalhava para mim e pediu demissão sem justificativa aparente há três meses. Eu, como bom empregador respeitei sua decisão, ele é adulto e me pareceu estar bem seguro da sua escolha.

Porém, quem não está seguro da escolha que fez agora sou eu. Eu deveria ter insistido que ficasse e não fiz. Simplesmente esqueci que tinha um trabalho engavetado e que ele era a minha galinha de ovos de ouro para o mesmo. O deixei ir e para piorar dei uma responsabilidade de tubarão a um peixe de aquário, Maise.

Maise é designer de interiores, recém-formada e estagiária. Eu sei, errei feio nessa. Mas pensei que poderia dar-lhe a oportunidade da carreira dela. Muito cedo. Ela deveria ter aprendido mais antes de ter tamanha responsabilidade. Nem todos os designers são Enzi que desde o segundo ano já tinha ideias brilhantes e deslumbrava todos.

Olho para o projeto dela novamente, céus, eu pensei mesmo que ela tinha potencial. Estava farto de vê-la servindo café para os outros quando podia estar fazendo algo útil.

E por algo útil agora entendo que pode ser servindo café enquanto se adapta a dinâmica do trabalho.

O projeto não era péssimo, era mau. Algo mau dá para se trabalhar em poucos dias enquanto algo péssimo leva muito tempo. E por ser mau, antes da reunião deu tempo de retificar uma coisa e outra juntos dos meus colegas. Não foi um total desastre. Nossos contratantes tinham gostado da proposta dos banheiros. E eu tinha conseguido mais tempo para o trabalho. Agora tenho até terça-feira para encontrar alguém competente e até sexta-feira que vem para apresentar uma proposta extraordinária.

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