🩸: os vampiros e os ieros

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1994

Frank odiava se sentir observado. E ainda assim, não conseguia parar de fitar aquilo que lhe trazia tal sensação: a maldita floresta em frente a sua casa, em toda a sua obscura e estranha áurea mórbida; sentia cada parte de seu corpo estremecer com a visão, como se algo nas profundezas daquela imensidão aguardasse por ele, por seu pai, e qualquer outro ser humano tolo que estivesse disposto a invadi-la.

As árvores balançavam violentamente de um lado para o outro, devido a uma forte ventania; a lua e as estrelas mal apareciam por detrás das nuvens acinzentadas, deixando claro que um temporal estava por vir e que o ar lúgubre pairando sobre o céu persistiria; Frank estranhou aquilo, afinal, havia sido relatado que aquela seria uma madrugada calma, comumente fria e que os moradores não precisariam se preocupar com terras lamacentas e poças de água nas rodovias ao amanhecer.

O tempo estava agindo ao contrário, era o que parecia, ou a âncora havia lido os papéis errados. Seja lá qual fosse a alternativa, Iero estava pálido de apreensão e medo, aquela floresta tinha lá seus dotes assustadores. Diziam todo tipo de coisas sobre aquele lugar. Não era exatamente o ambiente mais cômodo da cidade. "Frank." Cave chamou, arrancando o filho de seus ininterruptos pensamentos acerca do clima esquisito da cidade.

O garoto entortou os lábios e se afastou das grandes janelas, quebrando a hipnose que a floresta lançava sobre ele. "O que?" Sua postura era desinteressada, queria fazer parecer que estava entediado, embora estivesse roendo as unhas por dentro.

"Vem aqui." O homem disse, dirigindo-se á um baú de aparência velha sobre a mesa de jantar. Aquele baú estava sempre coberto de teias e poeira no sótão, talvez fosse a primeira vez que ele sentisse uma brisa em anos. "Hoje é um dia muito importante, Frank, quero que esteja-"

Frank tossiu, interrompendo o discurso do homem. "Preparado?"

Cave o olhou. "É, preparado. Quero que esteja em vantagem, que se disponha do melhor equipamento." Ele balançou as mãos de um lado para o outro. "Algumas coisas serão necessárias se quisermos sobreviver á isso, água benta, para queimar a pele deles. O crucifixo, para perturbar-los, a estaca, para empunhar em seus corações..." Ele murmurou, enfiando a mão no baú; o garoto engoliu em seco ao visualizar cada objeto sendo retirado. Alargou os olhos no entanto quando a arma de mais prestígio fora estendida nas mãos de seu pai, o arco-flecha; o objeto em si era arcaico e estúpido, mas as pontas das flechas eram tão afiadas quanto uma agulha, e continham um veneno especial; sua prata brilhante e mortal. "Tenha em mente todas essas coisas, não quero que esqueça de nada." Frank caminhou lentamente até o baú, pegou um dos crucifixos lá dentro e o sentiu na palma da mão. Quase que como uma resposta direta ao toque, um relâmpago barulhento eclodiu do céu em direção á terra, causando um estrondo nos tímpanos do garoto, que deu um solavanco para frente e mordiscou os lábios. "Maldição." Cave xingou, caminhando até a janela, no corredor, para ter uma melhor visão do céu no prelúdio de sua tempestade.

"Pai..." Suspirou, trocando o peso de uma perna pela outra. "Eu não tenho certeza de que..."

O homem se virou. "De que...?"

"Ninguém entra naquela floresta por motivos muito óbvios, não tem medo de acabar me perdendo por lá?" Largou o crucifixo para segurar o arco no lugar, senti-lo em seus dedos; não queria iniciar a ultrapassada discussão acerca dos perigos daquela jornada, os pontos negativos e os (poucos) positivos; nos últimos dois anos aquele havia sido o tópico predominante naquela casa, e ele estava, verdadeiramente, cansado.

Cave demorou algum tempo para responder, estava claramente ponderando a respeito. Aquilo fez com que Frank se sentisse imensamente desconfortável. Era estranho chegar lentamente á conclusão de que talvez não fosse tão querido assim por seu próprio pai. As decepções haviam atingido e superado um limite, era o que parecia. O homem já não devia ter o mesmo respeito que uma vez nutriu pelo filho, quando o mesmo completou quatorze anos, seis anos antes, e ele pensou que finalmente teria um colega em casa, ao invés de uma criança estúpida.

my sweet vampire † frerardOnde histórias criam vida. Descubra agora