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Nasc. 21/02/1995

falec. 20/02/2016

Noites com nevoeiro podem ser perturbadoras em qualquer lugar, mas no Cemitério São Lázaro, no alto do Rio de Janeiro, é especialmente mais horripilante. Isso por causa de seus altos portões barulhentos, seu largo muro encoberto por trepadeiras e seus mausoléus monstruosos.

No entanto, nessa mesma noite que fazem as pessoas evitarem o bairro para chegarem seguras em suas casas, o cemitério recebia alguns visitantes malditos. Eram silhuetas vigilantes encobertas por grossos sobretudos negros que se agrupavam em um círculo, à espera de realizar um sacrifício. O sangue pulsante e ávido que eles estavam prestes a derramar, já se contorcia sobre um túmulo vazio quando o primeiro golpe de facas foi desferido, mas não o bastante para esvanecê-lo. Não ainda. Então a vítima ergueu-se e arrastou-se para fora do sepulcro, aterrorizada e esperançosa de que sua fatigada fuga pudesse libertá-la da morte. Mas após breves minutos o último golpe foi efetuado sobre a mesma, como um trabalho de parto mal feito, a vítima fora executada.

Naquela noite suas mãos frias e sujas de sangue marcaram trinta e três lápides.

No dia seguinte, a mídia noticiou o caso: "jovem é brutalmente assassinada em cemitério da região", "moça foi encontrada degolada e perfurada com 66 marcas de facadas", "havia símbolos esculpidos em seu corpo e velas negras ao redor", "a polícia trabalha com a hipótese de ritual satânico". A cidade ficou horrorizada com a notícia. Mas o que a mídia não poderia noticiar ainda é que naquela noite algo maligno fora despertado e testemunhado primeiramente por uma pessoa que foi deixar flores à sua ente querida.

Maria Eliza Nolasco estava mudando as flores da semana passada que havia colocado no túmulo de sua filha quando sentiu o mal lhe tocando. Horas depois fora encontrada desmaiada e logo no hospital, diagnosticada com AVC do tipo hemorrágico e desde então perdeu temporariamente a coordenação vocal. Suas frases eram confusas. Assim os médicos tiveram que recorrer a Silmara Teles, assistente social do hospital, para obterem informações básicas, pois além de não conseguirem discernir suas palavras, a mulher não tinha parentes. Apenas uma filha com problemas de coordenação motora desde o nascimento, cuja irmã gêmea já havia falecido. Desse modo, Senhora Teles recolheu o endereço dela e uma foto que estava em sua bolsa com o nome 'Sofia' rasurado no verso.

Tudo foi muito rápido e, algumas horas depois, Silmara já estava na frente da casa da Senhora Nolasco, conferindo as anotações. "Rua nove, número 80, casa de arquitetura portuguesa moderna, próximo ao cemitério São Lázaro". Havia um matagal de trepadeiras engolindo o muro e um pequeno portão com o número especificado, não podia ser, será que o endereço estava errado? Parecia um lugar esquecido por Deus e pelos donos. Ela pensou por um momento, então resolveu afastar alguns arbustos e observar melhor a casa. Agora não teve mais dúvidas, pois na primeira janela ao lado da porta, de modo pensativo e tácito, Sofia Nolasco parecia observar o nada.

A verdade enterradaWhere stories live. Discover now