Capítulo II - Mente vazia, oficina do Diabo

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Blake Haas

Antes de começarmos, gostaria de deixar claro que sou um trintão sem filhos e sem nenhuma pretensão de arranjar algo sério no momento – também conhecido popularmente como arranjar sarna para se coçar.

Ainda tenho muito pela frente. Começar meu próprio negócio, visitar cada um dos sete continentes, escalar o Evereste. Praticar rafting no Ganges? Aprender a pilotar um avião? Quem sabe.

Começar minha própria família, em algum ponto, também me parece oportuno. Por enquanto, estou mais entusiasmado em apenas curtir os prazeres carnais sem realizar nenhuma estripulia de que possa me arrepender.

Toda vez que passo dos limites do admissível, me lembro do meu melhor amigo. O soldado desertor. Depois que se apaixonou, passou a viver um lindo romance entrevado na bunda da namorada, sem deixar espaço para mais nada. Me pergunto se ele ainda sai para tomar um ar.

Nem sempre fui descrente quanto a arte de amar, apesar de ter crescido a sombra de meu pai. Ambos fomos muito bem-educados por rainhas. Mas apenas um de nós trata as mulheres à sua volta tão bem quanto a um saco de cimento. E não sou eu.

Posso até não ser o homem perfeito – apesar de estar muito mais próximo dessa condição do que o que você vai encontrar por aí – mas sei como tratar uma mulher. Interesse amoroso ou não, eu sou um cara respeitoso.

Pode-se dizer que já experimentei de tudo nos meus relacionamentos: romântico a luz de velas, com pétalas de rosa por todo o quarto, casual-rápido-e-rasteiro, contra a parede, coisa-de-uma-vez-só e até quatro pneus arriados, - se furar, a gente conserta junto.

Que me chamem de cachorro sem dono. Lobo solitário, insensível, egocêntrico, debochado. Tudo isso é verdade. Mas o que ninguém pode dizer é que faço propaganda enganosa. A base de todas as minhas interações é o respeito. Deixo as minhas intenções de descompromisso em pratos limpos em cada chance que tenho, assim evito possíveis incomodações futuras.

Ao longo dos últimos anos, tive algumas namoradas. Não fizemos promessas que não podíamos cumprir, nem encomendamos convites de casamento pomposos em letras ornamentadas. Não terminamos querendo matar um ao outro. Eu chamo isso de uma vitória 10/10.

Meu primeiro modelo de 'felizes para sempre' não foi exatamente o melhor. Cresci com uma mãe super-protetora, Victoria, e um pai que não dá a mínima, Jack. Os dois são como forças opostas que tentam se anular a todo instante. Mas eu estou aqui. Eu sobrevivi ao fogo cruzado.

Acabo de sair de uma reunião com meu mais novo chefe. Ao longo dela, ele soltou algumas citações motivacionais e piadas sem graça das quais me vi inclinado a rir.

Um cifrão é uma ferramenta muito eficaz no que tange a despertar sorrisos honestos.

Contanto que te coloque comida na mesa - e te conserve o mínimo de dignidade - trabalhar por um propósito é muito nobre. Mas o meu propósito é ganhar dinheiro. Tenho me saído muito bem nisso.

O som de saltos se chocando contra o chão e a visão de longas e belas pernas trazendo uma figura estonteante para perto de mim me tiram de meus devaneios.

O rosto que me encara no momento não me é estranho. E também não é um daqueles rostos que se consegue esquecer. Não há nada de comum sobre ele.

Não há nada de comum sobre ela. Sim, me refiro a mulher que trombou em mim no aeroporto. A mesma do voo turbulento.

Certo. Eu não te contei sobre isso. Houve uma turbulência num voo que fiz com conexão em Milão. Não estou falando dos carrinhos de comida voando, nem da comissária de bordo caída no chão, ou dos gritos assustados que povoaram a aeronave enquanto ela subia e descia violentamente.

Crossed Lines: sem limitesOnde histórias criam vida. Descubra agora