Imobilidade

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Todas as tardes, o alvorecer consigo

traz a bela Lua e o cintilante Vênus,

conduzido o Sol para o seu abrigo

e um mesmo casal esperando um ônibus,

que ao longe, como que por castigo,

já irradiava seu facho pálido de luz. 

MOÇA:

Vá que o ônibus já desce o morro,

é dia claro ainda, pode ir embora –

não há perigo que peça seu socorro.

Se vamos nos despedir, é essa a hora. 

RAPAZ:

É dia claro? Uma estrela apenas fulgura:

um anjo que prenuncia a noite escura,

seguindo a dama mais casta e pura,

capaz de punir quem, por acidente,

a contemplasse em sua oculta face?

Aguardarei  então, logro ser mais paciente. 

MOÇA:

Mas já é tarde, está frio e você cansado,

amanhã, aqui estaremos novamente:

eu indo embora e você ao meu lado

esperando que o ônibus se ausente. 

RAPAZ:

É tarde? Enganou-me mais uma vez

com seu brilho de orgulho e altivez –

a luz que me cega, é o dia que se refez? 

(Tudo que pressinto é um funesto perigo

de um dia ser chamado de “bom amigo”).

É ruim que continue mais tempo contigo? 

MOÇA:

Não, foi isso que falei? Mas se for verdade

Porque caminhar sozinho e cabisbaixo?

Acompanhe-me no ônibus até a cidade

ao invés de seguir um calvário abaixo.

Qual ensejo de tão afoita despedida,

Abandonando-me, outra noite perdida... 

RAPAZ: 

É tão árduo vê-la partir, que uma prece,

feita por quem a deus nenhum obedece,

pelos ânimos das musas acontece:

rezo para que nunca me veja partir

e que desgosto igual jamais possa sentir,

pois o que lhe entristece, não irei permitir. 

Se finda o drama com as sombras da noite,

ENQUANTO multiplicam-se as estrelas,

desce pensativo o jovem caminhante:

as mulheres que amamos, tememos perdê-las;

já a moça no ônibus pondera confiante:

miseráveis os homens que temem tê-las.

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⏰ Última atualização: Sep 02, 2019 ⏰

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