Capítulo 17

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Delegado Hermes será retirado dia 01.05. espero que tenham gostado...


Mérida- Primavera, Maio de 833 d.C.

Jamila caminhou com passos lentos sentindo a presença de Juan ao seu lado, por estranho que parecesse ele não exalava mau odor, como muitos dos comerciantes cristãos que vinham do norte e que alegavam que se banhar todos os dias era perigoso para a saúde.

Vários passos atrás duas servas os acompanhavam, ainda que Jamila tivesse mais liberdade que muitas de suas conterrâneas, ainda era uma mulher e filha de um Sheik, não podia encontrar-se com um homem sozinha, mesmo entre os soldados da tropa de cavalaria que comandava, quando acampavam ou se moviam, sempre havia algumas servas ao seu lado. Elas eram discretas e mantinham-se afastadas o suficiente para não ouvir a conversa, mas perto o suficiente para mantê-la sob suas vistas.

A jovem ficara surpresa ao ver Juan nas ruínas do templo romano, ela escapara da tenda de seu pai sem que ninguém percebesse, adorava aquele lugar, mesmo em ruínas mostrava o esplendor de outra era e a fazia meditar sobre brevidade da vida.

O reconhecera imediatamente, mas não quisera contar-lhe, isso poderia levá-lo a pensar que a impressionara.

Saíram do interior palácio adentrando em um grande jardim murado, havia uma profusão de flores coloridas perfumadas. Archotes presos às colunas e paredes em volta ajudavam a lua cheia a iluminar o local, que refletia sua forma nas águas mansas de uma enorme piscina retangular no centro do jardim.

— Meu pai mandou construir esse lugar para minha mãe, ela adorava flores – explicou Jamila se apoiando em uma coluna coberta de trepadeiras floridas.

— É um belo lugar – respondeu se aproximando da jovem.

— Ele a amava muito – disse e se afastou colocando-se atrás de uma tela de madeira quadriculada, usada para guiar as trepadeiras.

— Imagino que tenha amado – concordou Juan olhando em volta o belo local, bem diferente dos jardins sem graça do castelo de seu pai, ou mesmo da corte em Oviedo.

Juan observou-a pelas aberturas da tela, os olhos dela pareciam brilhar sob a luz dos archotes que iluminavam o jardim. A pintura que os realçava dava-lhe um ar misterioso e extremamente sensual.

— Sim, amava, talvez por isso ele permita que eu faça quase tudo que desejo – disse com um ar triste.

— E o que você mais deseja? – perguntou curioso em saber as vontades da jovem.

— Ser dona do meu próprio destino – respondeu prontamente.

Ele ficou um momento pensativo, a vida das mulheres nos reinos cristãos era dura, muitas eram privadas de liberdade, deviam obediência ao marido, à Igreja, aos filhos. Raramente eram proprietárias de algum negócio e dependiam dos homens para quase tudo. A educação era vedada e aprendiam apenas os trabalhos domésticos, que incluíam cuidar da criação de animais ou de plantações, costurar, cozinhar, e uma infinidade de tarefas, um trabalho pesado para quem ainda tinha que cuidar do esposo e filhos.

Provavelmente a situação entre os árabes fosse igual.

— E onde sua mãe se encontra? – perguntou após um momento de silêncio, ao perceber que ela falara da mãe no passado.

— Com Alá – respondeu saindo detrás da tela — faleceu após me dar à luz.

— Sinto muito, minha mãe também morreu durante meu parto, e meu pai também a amava muito – disse se sentando em um pequeno banco de pedra.

— Temos algo em comum, somos dois órfãos – disse a jovem se sentando ao lado dele, o que o fez aspirar com mais força o ar, para sentir o perfume de jasmim da jovem.

— Mas ao contrário de você, que é amada por seu pai, o meu me odeia – suspirou — ele me culpa pela morte dela.

— Deve ser difícil...

— Já me acostumei – afirmou encarando-a fixamente.

Jamila sentiu um estremecimento no corpo ao sustentar o olhar do jovem. Ele possuía olhos castanho-claros, e havia determinação naquele olhar, além de algo mais.

— Você acredita que irão convencer seu pai a se rebelar? – perguntou Juan para quebrar o silêncio que caíra sobre os dois e desfazer o encantamento que parecia subjugá-lo, pois sua vontade insana era tomar o rosto da jovem entre suas mãos e beijá-la nos lábios.

— Não sei, meu pai já se rebelou outras vezes, ele está insatisfeito com o Emir e meu irmão e Jamal são a favor de uma guerra – respondeu desviando o olhar para a lua cheia que brilhava no céu sem nuvens.

— Se isso acontecer, o que será de você?

— Lutarei ao lado de meu pai e irmãos, é óbvio – respondeu com uma risada cristalina.

— Espero que isso não ocorra, mas se ocorrer eu gostaria de ficar e lutar ao seu lado – afirmou sem saber bem o motivo, mas com sinceridade.

Jamila encarou-o novamente, sentiu um formigamento no corpo que partiu de sua intimidade. O que estaria acontecendo? Perguntou-se, pois nunca experimentara nada daquilo com os jovens e homens que vieram desafiá-la com o objetivo de conseguirem sua mão em casamento.

— Você é um bom guerreiro? – perguntou se erguendo, constrangida com as sensações que experimentava.

— Tenho treinado desde minha infância – respondeu levantando e se aproximando novamente da jovem que virara as costas para ele.

Os cabelos de Jamila caíam sobre suas costas em ondas negras que reluziam ao luar. A vontade que ele teve foi de tocá-los, e quase o fez, chegando a estender a mão, mas rapidamente a baixou. Ela era a filha adorada do líder tribal, se sequer passasse pela cabeça dele que Jamila fora desrespeitada, sua vida não valeria nada.

— Talvez possamos treinar juntos – disse a jovem se virando e surpreendendo-o.

— Eu adoraria, señorita – respondeu fazendo uma mesura.

— Venha amanhã, após a primeira oração do dia, vou avisar para o levarem ao pátio de exercícios – disse com um sorriso que aqueceu o coração do jovem.

— Estarei aqui – afirmou na mesma hora.

— É raro encontrar alguém que não se importe com minha condição de guerreira.

— É ainda mais raro encontrar alguém como você, guerreira, dançarina e poetisa, além de ser mais bela que a própria Afrodite.

— A deusa grega do amor e da beleza, conhecida como Vênus para os antigos romanos – completou com um sorriso.

— Sim, minha señorita, vejo que esqueci de mencionar ainda como é culta.

— Você é um lisonjeador, me pergunto se é assim com todas – disse e antes que Juan respondesse completou — mas já o aviso que palavras doces não me afetam nem me seduzem, se esse é porventura seu objetivo.

— Meu único interesse é conhecê-la e colocar minha espada e honra à sua disposição.

— Veremos – murmurou.

Nesse momento três mulheres entraram no jardim e rapidamente conversaram com Jamila.

— Meu pai requisita nossa presença.

A GUERREIRA INDOMÁVELOnde histórias criam vida. Descubra agora